sábado, 31 de agosto de 2013

A história que eu sei contar

ARTHUR BERNARDES DE OLIVEIRA
tucabernardes@gmail.com
De Guarani, MG 


XI – Vem ver a família

Já estávamos chegando ao Asilo. Meu cunhado Wálter veio ao nosso encontro.  Esse cunhado, pela identidade que nos aproxima, é mais do que um irmão. Casado com a Edna, às vezes eu me surpreendo na dúvida: quem é o irmão, quem é o cunhado?  Penso que a natureza enganou-se. Na hora de nascer, trocou as crianças.
Não é que eu não goste de minha irmã. Absolutamente. É das irmãs a de quem gosto mais enternecidamente.
E aqui, por justiça, abro um parêntese. Talvez desnecessário. Mas já que estamos conversando, e a noite ainda é nova, não custa dizer.
Somos, ao todo, onze irmãos: cinco homens e seis mulheres. As irmãs-mulheres já estão casadas. Todas. A mais velha, a Lila, casou-se com o vereador mais novo do País: Waldemiro Correa de Faria
O Waldemiro é um tipo caladão, mas bom sujeito. Talvez um pouco posudo demais.  Por princípio. Metido na política desde cedo, apurou seu senso de apresentação e dele não se afastou jamais.
Não tem nenhum curso. Interrompeu o ginasial, na segunda série, mas continuou estudando sozinho. Leitor paciente, muito observador, conseguiu acumular cultura e representa bem na vida o seu papel. Lecionou francês e taquigrafia na Escola Comercial de Astolfo Dutra e é uma bela pena. Talvez morosa demais. Muito presa à perfeição da forma, o que o impede de produzir muito. Nascido para a literatura ou para a burocracia, que no fundo se assemelham, não tem tido muito sucesso no comércio. O que o leva a dizer, de vez em quando, brincando, é certo: “Cunhado, todo bom artista é péssimo comerciante”.
A segunda irmã é a Edna, casada com o Wálter. Wálter de Oliveira: o mais simpático dos oito filhos do velho Pedro Relojoeiro. O mais simpático e o melhor. Coração intensamente amoroso. Eu diria que o Wálter é um imenso coração em forma de homem.
Alegre, brincalhão, jovial, amigo, o que ele tem é dos outros. E é justamente esse desprendimento que não lhe permitiu fazer fortuna para dispor de melhor conforto. Sempre preocupado com os outros, o que ganha como viajante vai se dissolvendo  em favor dos outros. Não reclama, não recrimina, não discute, não acusa ninguém. Continua imperturbável sua marcha em torno de bem.
A terceira irmã é a Marly, casada com um moço de Guiricema, que lá apareceu com um botequim nas costas: o Braz Parreira. Também bom, mas um pouco viciado no jogo de cartas. Têm os dois passado momentos de muita dificuldade. Seja pelas dificuldades financeiras, seja pelos sucessivos casos de doença nos filhos e nos dois.
A quarta irmã, a morena da família, a mais compenetrada de todas, no dizer do pai Astolfo, é a Anita, que herdou o nome e, alguns dizem, as virtudes da mãe.
Casou-se com um moço de Astolfo Dutra, José Jésus Cazetta, e, ambos muito novinhos, foram assentar praça na longínqua cidade de São José do Rio Preto. Não sei bem o que andam fazendo por lá. Mas a julgar-se pelo que se ouve e pelas virtudes de ambos, conquistaram a grande cidade, e seguem uma vida de felicidade capitalizada. São ambos excelentes. Particularmente, acho o marido um pouco melhor que a esposa. E se disse que a esposa é excelente, estarei fazendo justiça ao grande cunhado que é o Jésus. Filho amoroso e pai exemplar. Viajante excelente e cidadão ainda melhor. Vai vivendo uma bela vida.
As duas últimas irmãs, Eunice e Icléa, que considero as mais bonitas da família, casaram-se há pouco, quase no mesmo dia, respectivamente, com Adilson Antônio Cazetta, irmão de outro cunhado, o Jésus, e Francisco Schettini – mais conhecido pelo apelido de Pantera.
O primeiro casal está em Astolfo Dutra, no gozo de sua lua-de-mel e o segundo localizou-se em Leopoldina, onde os ventos de Cupido, parece, lhe fizeram bem. Levam vida modesta, apertada, mas feliz, que é o que interessa.
Ah, meus irmãos! Você nem queira saber o que são eles! Para resumir: não conheço nem dentro, nem fora da família, gente melhor. Eu quero que você também os conheça. Não faltará oportunidade. Verá, por você mesmo, que tudo o que digo é  pouco, embora absolutamente correto.
Tenho, até hoje, dificuldades em dizer, dos quatro, quem é o melhor; qual deles, o mais inteligente.
Creio que os que não pertencem à família não têm dificuldades nessa indicação. Sobretudo, quanto à inteligência, porque confundem maior soma de conhecimentos ou de cultura com inteligência pura, inteligência isolada.
Nem sempre a cultura maior ou menor representa maior ou menor inteligência. A cultura depende mais de oportunidade e esforço do que de inteligência em si.
Acho que os de fora, por isso mesmo, me apontariam como o mais inteligente, porque na realidade sou o que leu mais. Nem mesmo a vaidade me permitiria concordar com isso. Nem se trata de falsa modéstia.
Diz o Amaury que o melhor é o Ayres. Amaury é o mais velho. Eu sou o segundo. O Ayres é o terceiro. Seguem depois o Astolfinho e o Ali, que é o caçula. O caçulíssima não chegou a nascer. No oitavo mês acompanhou minha mãe naquela dura segunda-feira de maio (dia 8) de 1950. (1)
Já o Ayres e o Astolfinho votariam no Amaury. E eu também. Não nos preocupamos com esse tipo de comparação. Cito-o, apenas, porque por diversas vezes tenho ouvido opiniões a esse respeito.
Para ver bem como são os meus irmãos, eu que me julgo bom, por nenhum deles sou considerado nem mesmo o terceiro. Porque há um, o Astolfinho, que vem logo depois dos dois primeiros, ou vem na cabeceira com eles.
E é aqui que eu lamento demais a minha incapacidade. Gostaria de escrever detalhadamente sobre cada um deles. Capacidade não me faltasse e surgiriam dessa pobre máquina quatro grossos volumes aos quais se poderia dar o mesmo título: “De como ser bom vivendo-se apenas para o bem”.
O ideal seria que você nos visse conversando. Para nós não há nem hora, nem lugar. Nem assunto preestabelecido.
Quase sempre o assunto é um só: os problemas da família, do Asilo, dos amigos, com leves infiltrações no terreno da política.
Na política nós nos dividimos: eu e Astolfinho, mocinho de inteligência fulgurante, segundo quase todos nós, o mais inteligente da família, com decidida posição nacionalista. Nacionalismo que alguns costumam confundir com extremismo. O Amaury, acompanhando meu pai, do lado oposto. Não creio na sinceridade da sua posição. Acho-o mais preocupado com o debate do que com a política em si. O Ayres não tem lá uma posição bem definida. Começa agora a se orientar melhor e luta entre dois caminhos: seguir, como bom filho, a orientação do pai ou acompanhar os dois irmãos que não veem nos partidos dominantes a solução para os nossos problemas. O Ali, novinho ainda, não se mete nessa cumbuca. Está se formando ainda. Terminando este ano o curso de contabilidade, já com  excelente bagagem literária, porque lê muito.
Quando os irmãos se juntam a vida se renova.
Quantas noites passamos juntos sem perceber, em recordações e debates memoráveis.
Os planos do Amaury... Qual! Só encostando estas teclas. Falaria a vida inteira sobre os planos do Amaury. Planos fabulosos e irrealizáveis, quase todos, mas sempre belos, puros, fulgurantes.
A pureza de seus ideais! A preocupação obsessiva com todos, indagando, perquirindo, analisando, bisbilhotando, para descobrir necessidades, e supri-las com a sua bondade.
A ingenuidade do Ayres. Ingenuidade que lhe deu o título de “o exagerado”. Uma carta do Ayres é um monte de exageros. Uma notícia simples assume caráter de catástrofe. A sala treme, as cadeiras se assustam quando ele traz uma notícia nova. Ele todo é circunspeção. Os olhos se esbugalham. O coração para. O rosto se comprime. E lá vem o tufão.
Não me esqueço nunca de nosso reencontro em Caldas. O Ayres quase me matou na hora. Ao vir para o Sul, tinha deixado no hospital minha irmã Lila, com a segunda ou terceira operação de cesariana. Lá passei na manhã do dia 5, vindo para cá, e com os olhos molhados, fazendo força para sorrir, ela me deu um abraço e não disse mais nada. Se a emoção lhe deixasse, ela me teria dito: “Boa viagem, e seja feliz!”
O nó-na-garganta que a despedida me pôs só se foi dissipar duas horas depois, quando o cafezinho de Areal empurrou-o para baixo.
Pois bem, lá tinha ficado a Lila, curtindo as amarguras de um restabelecimento já difícil.
De modo que, ao ver o Ayres entrar pela porta do Hotel Magalhães, minha primeira pergunta foi sobre ela.
E ele: – Aconteceu uma coisa horrível!
Quase caí. A garfada que tinha posto na boca (eu estava almoçando) cresceu estupidamente e formou o maior bolo que até hoje comi. – Uma coisa horrível!
Aquele horrível estourou como uma bomba na minha cabeça. O coração disparou. Todos pararam. Luizinho e Dr. Paulo, Juiz de Direito, que conosco comia, ficaram estupefatos. Aguardando a notícia terrível.
E o Ayres respirou fundo. Mastigou uma golfada de ar. E serenamente, naquela fisionomia de trágico, deu a notícia.
O horrível é que o Waldemiro a tinha levado para casa, antes mesmo de uma melhor recuperação, e alguns pontos se haviam rompido. Mas já estava melhor e fora de perigo.
Graças a Deus! Mas quase morri!
Não, não pense que, por vivermos juntos, já nos devíamos ter acostumado com o Ayres. O Ayres é como o frio desta região. A gente não se acostuma com ele nunca. Por mais prevenidos que estejamos, por mais força que façamos, por maior que seja o desinteresse com que o ouvimos, tudo se desboroa ante as suas notícias. O homem é o próprio trágico ao nos contar uma coisa.
Já incluí nas minhas preces noturnas um pedido pessoal: “Livra-me, Senhor, das notícias do Ayres!”
O Astolfinho é a responsabilidade em pessoa. Desde cedo, desde novinho, notamos isso. Nunca tivemos com ele o menor problema. Do grupo escolar à faculdade foi sempre o primeiro da classe. Responsabilidade e personalidade. De pontos de vista muito firmes. Por isso pensa bem. Pensa bem para não precisar mudar. Nada o segura quando o coração lhe ordena alguma coisa. De empregos ótimos tem saído, sem se esquecer nunca do inevitável aviso-prévio, a fim de seguir o seu destino.
Dono de inteligência fantástica, no início desde ano enfrentou o concurso do Banco do Brasil e foi aprovado com facilidade.
Certa vez, estudante em Astolfo Dutra, fundou, a expensas dele mesmo, um jornalzinho de crítica social - “O Veneno”. Astolfo Dutra quase lhe caiu sobre a cabeça.
Não me esqueço de seu entrevero com D. Zica e D. Isinha. O Veneno tinha publicado algumas coisas sobre Sueli e Ana, filhas das duas cidadãs acima nomeadas.
Foi um “Deus nos acuda!” E as mães se dirigiram até o Colégio para acertar as contas com ele. E ao clamor de tantas vozes e de tantas ameaças, uma coisa ele disse que eu jamais esquecerei:
– O problema é de suas filhas. Elas dão o assunto. Eu relato. Façam com que elas não deem motivo. Porque, senão continuarei escrevendo.
Do Ali, pouco ainda se pode dizer.
É inteligente, mas meio malandrão. É verdade que o emprego o sacrifica muito. Quase não lhe sobram horas para o estudo. E a par disso a sua inevitável queda pelo twist e outras barbaridades que a mocidade deste país passou a copiar dos jovens americanos, a título de juventude transviada.
É leitor assíduo e bom frequentador de cinema. Gosta de música clássica e não se dá bem com os esportes. Escreve corretamente e tem bastante inspiração. Do que poderão surgir bons trabalhos quando sua vida estiver estabilizada.
Já sei. Você quer saber um pouco do meu pai. Então vamos até a figura curiosa de meu pai.

XII – Entenda-se o termo
           
Não vou falar de meu pai sem antes lhe dizer um pouco sobre a minha mãe.
Mas antes disso, é preciso que justifique uma expressão, corrigindo o que poderia parecer uma injustiça.
Referindo-me à Lila, minha irmã mais velha, parece-me que eu disse “irmã-jararaca”. E é aí que eu preciso explicar.
Particularmente, acho que a Lila gosta muito de mim. E que por muito gostar ela se deixou dominar um pouco pelo ciúme. Não sei se minha observação estará certa. Ninguém conhece ninguém. Sobretudo ninguém tem o poder de sondar os refolhos das almas alheias. Mas, de qualquer modo, é uma observação.
Por gostar muito de mim, quase nunca gostava de minhas namoradas. Às vezes, ela tinha uma grande amiga. Eu passava a namorar a sua amiga, Então a amiga deixava de ser. E uma infinidade de defeitos eram apontados. Brigávamos. A amizade antiga voltava a florescer, para não se desfazer jamais.
Já fui noivo de outra moça. Quando noivos, não eram bons os olhos da mana a observar minha noiva. Rompemos. Hoje a minha ex-noiva é a mais virtuosa e boa das mulheres, para ela, é claro.
Com a minha própria esposa o caso se repetiu. Você sabe que foi em sua casa que começamos a namorar. Pois bem: como com ela me casei, até hoje as duas não se dão lá muito bem.
A Lila foi assim uma segunda mãe que eu tive. Era quem cuidava de minhas roupas, de minhas amizades, de minha comida. Até dinheiro por diversas vezes chegou a colocar em meu bolso. Lembro-me de que em Garça recebi pelo correio num envelope lacrado uma nota de mil cruzeiros. Ela soubera que as coisas não iam muito bem para o meu lado e me mandou o dinheiro da passagem.
Foi sempre assim. Mas por muito nos amarmos, muito nos encrencamos. De modo que dos trinta e tantos anos de convivência, creio que por uns quinze ficamos sem conversar. Não assim continuamente. Intercaladamente. Dois meses de bem, dois meses de mal. E assim sucessivamente.
Mas é dona de um coração admirável. Boa como uma pomba, embora brava como uma onça. E um pouco mal-educada. Embora digam alguns tratar-se de franqueza.
Como eu não distingo a franqueza da falta de educação, fico com o meu ponto de vista.
É voluntariosa. E tremendamente impulsiva. É desses tipos que não pode deixar para o minuto seguinte o que entendeu de fazer agora. E doa a quem doer.
Não pode ser contrariada. Seus pontos de vista não admitem contestação. É ela quem está sempre certa. E pronto!
Como eu sou um mal psicólogo e, mais que isso, um distraído, quase sempre fugia de suas graças. Uma palavra mal dita, um gesto suspeito, uma opinião escapulida, e pronto. Estava consumada a tragédia. E lá ficava eu dois ou três meses sem o sorriso da irmã.
Quando cruzávamos um pelo outro era o Everest em face do Bandeira. Uma atmosfera pesada a se tornar mais compacta. Sobre o chão que pisávamos nos nossos encontros ocasionais, diziam os observadores mais jocosos, não nasceria capim.
Claro que eram só aparências de ira. No fundo os dois corações, moles como manteiga, se trocavam ternuras.
E a vida continuava. De modo que a expressão usada não define a mulher. Trata-se apenas de uma brincadeira em família, sem maiores preocupações no definir.
Feito o remendo, veja quem foi minha mãe. (Continua.)


(1) Arthur contava 33 anos quando escreveu este livro. Os irmãos a que ele se refere contavam nessa época com as seguintes idades: Amaury, 35 anos; Ayres, 26; Astolfinho, 20; Ali, 18.

Nota:


O texto acima faz parte do livro intitulado “A história que eu sei contar”, escrito por Arthur Bernardes de Oliveira e concluído no dia 28 de julho de 1964. O livro compõe-se de 20 capítulos e está sendo publicado aqui ao longo de dez semanas, sempre aos sábados. A primeira parte foi publicada neste blog no dia 28 de julho de 2013.


Pérolas literárias (51)


A sublime sentença

Francisco Antônio de Carvalho Júnior


Ao pé de templo enorme, a praça tumultua.
Ansiosa expectação na calçada poeirenta...
A massa encontra o Cristo e, trágica, apresenta
Consternada mulher a chorar seminua...

– “Adúltera, Senhor!” – velho escriba insinua.
– “Que dizes, Mestre?” – insiste a multidão violenta
– “Somos o tribunal que a tradição sustenta,
A lei é apedrejar nos libelos da rua!”

Fita o Mestre a infeliz que a miséria alanceia;
Inclina-se, em seguida, e escreve sobre a areia,
Como quem grava o sonho onde a vida não medra.

Depois, contempla em torno a malícia, o veneno,
E exclama para a turba, entre nobre e sereno:
– “Quem for puro entre vós, lance a primeira pedra!”

    
Francisco Antônio de Carvalho Júnior nasceu no Rio de Janeiro em 6 de maio de 1855 e desencarnou na mesma cidade em 3 de maio de 1879. O soneto acima integra o livro Antologia dos Imortais, obra psicografada pelos médiuns Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira.


sexta-feira, 30 de agosto de 2013

O passe deve ser dado em estado de lucidez

Uma leitora do Rio de Janeiro-RJ apresentou-nos as seguintes perguntas:
1) No culto do Evangelho no Lar, leio e peço em voz alta para as pessoas com doenças graves que conheço ou não. Faz mal pedir por eles no culto do lar e manter estes nomes em casa?
2) Frequento reuniões há 3 anos e observei que existem médiuns incorporados que dão passe mas não falam. Por que não falam se incorporam há tanto tempo?
3) Por que existem médiuns de incorporação que prestam caridade vestidos de branco e outros de roupas escuras ou cores fortes? Para mim, a cor da roupa não tem influência sobre o médium e sim sua conduta. Estou certa?
Segundo o que aprendemos na doutrina espírita, eis o que pensamos a respeito das questões propostas:
1) Orar pelas pessoas enfermas é um ato de caridade e nada há que se possa opor a ele. O que devemos evitar no culto do Evangelho no Lar é sua transformação em sessão de atendimento a desencarnados, porque tal tarefa, como sabemos, é realizada com maior proveito no ambiente de uma instituição espírita.
2) O médium passista – nome com que no Brasil designamos os tarefeiros do passe – pode ministrar o passe sem necessidade de incorporação. Divaldo Franco, no livro Diretrizes de Segurança, questão 69, afirma que o passe deve ser dado em estado de lucidez e absoluta tranquilidade, no qual o passista se encontre com saúde e com perfeito tirocínio, a fim de que possa atuar na condição de agente, não como paciente.
Segundo ele, os passes ministrados sob a ação de uma incorporação propiciam resultados menos valiosos, porque enquanto o médium está em transe ele sofre um desgaste, e aplicando o passe ele sofre outro desgaste, o que significa um duplo dispêndio de forças. Por fim, explica Divaldo: “Os Espíritos, para ajudarem, principalmente no socorro pelo passe, não necessitam, compulsoriamente, de retirar o fluido do médium, nele incorporando. Podem manipular, extrair energia, sem o desgastar, não sendo, pois, necessário o transe”. 
Quanto a falar, a dizer alguma coisa, a dar alguma orientação aos que recebem o passe, eis procedimentos que não se coadunam com a tarefa. O passe deve ser ministrado em silêncio, sem comentário de nenhuma espécie. O atendimento fraterno e as orientações prestadas aos pacientes devem ser dados em outra oportunidade e não no momento do passe.
3) Quanto ao vestuário, a leitora está certa: a cor da roupa não tem influência nenhuma sobre o resultado da atividade mediúnica. O que se recomenda, no tocante ao vestuário, é que ele seja simples e confortável, nada mais. A propósito do assunto, no cap. 25 do livro Desobsessão, André Luiz recomenda aos médiuns o uso do vestuário que lhes seja mais cômodo para a tarefa, alijando, contudo, os objetos que as pessoas costumam trazer jungidos ao corpo, como sejam relógios, canetas, óculos e joias.


quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Pílulas gramaticais (66)

Considere as sentenças abaixo e indique qual a correta:
1. O projeto do Governo, embora dispendioso, visa o bem-estar do povo.
2. O projeto do Governo, embora dispendioso, visa o bem estar do povo.
3. O projeto do Governo, embora dispendioso, visa ao bem estar do povo.
4. O projeto do Governo, embora dispendioso, visa ao bem-estar do povo.
A construção correta é a última: O projeto do Governo, embora dispendioso, visa ao bem-estar do povo.
Eis as explicações:
1. Bem-estar, bem-fazer, bem-acabado, bem-casado, bem-aventurado são escritos assim mesmo, com hífen depois de “bem”.
2. O verbo visar, quando significa ter por fim ou objetivo, ter em vista, dispor-se, propor-se, é transitivo indireto e exige, pois, a preposição “a”. Pelo menos, este é o pensamento que tem norteado as instituições de ensino em seus concursos públicos, embora haja exemplos de regência diferente em alguns autores consagrados.
Exemplos:
As medidas visam ao bem público.
O esforço de João visava apenas ao enriquecimento pessoal.
O projeto do Governo visa ao bem-estar do povo.


quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Gestos que trazem luz aos olhos

CÍNTHIA CORTEGOSO
cinthiacortegoso@hotmail.com
De Londrina-PR

Às vezes, presumimos uma quantidade maior de situações ruins, negativas, tristes no dia a dia. Contudo, fico muito emocionada e feliz pelo outro número bem mais elevado e crescente de ações benéficas e fraternas realizadas por pessoas comuns, em lugares comuns, a todo momento.
Professores que deixam a escola urbana para atenderem crianças e jovens em áreas quase inacessíveis se não fossem a determinação, o amor e a responsabilidade por quem necessita um pouquinho mais em algum quesito, pois quase sempre, em muitos outros, esse simples companheiro esbanja solidariedade.
Outros tantos médicos que abdicam o consultório equipado, todo esterilizado, para auscultarem os corações em meio a casebres sustentados pela fé.
Luz bendita que ilumina o rosto desses irmãos solidários e amorosos, irmãos compreensivos de que o outro é sua própria extensão. Semblante sereno, facilmente um sorriso nasce pelos lábios ou pelos olhos transparecendo sua essência. Normalmente, uma só alma solidária abarca e auxilia contingente de outras mais necessitadas.
Vidas com simplicidade, mas com a consciência de que, de uma forma ou de outra, o universo é interligado. Os seres necessitam de ajuda, e também podem amparar.
O irmão mais humilde repartirá o pão no mesmo segundo em que o recebe. Ele sabe que a necessidade básica dói na carne e procura amadurecer a alma. O coração existe para amar, para realizar o bem, essa é a sua grande característica; sendo assim, um fato tanto me sensibilizou.
“Café pendente”! Ainda não tinha ouvido essa expressão. Sempre nos surpreendemos com as incontáveis maneiras de se fazer caridade. Pois bem, essa expressão “café pendente” é, há muito, usada em cafeterias da Europa. Frequentadores desses lugares tomavam seus cafés, mas sempre deixavam outros pagos, pelo menos mais um.
Esses cafés eram retirados por pessoas que não podiam pagar pela bebida quente, principalmente, no inverno castigante. Então, chegavam à porta desses estabelecimentos e diziam com a voz tímida:
– Você tem um café pendente?
Desde a primeira vez que a expressão foi usada, até hoje, sempre esteve à mão um café quente para acalentar o corpo e abrandar a alma. Sempre haverá.
E assim a humanidade caminha. Se há algo para melhorar?... demais; entretanto, em todos os momentos e em toda parte, os bons atos, as palavras revestidas de ternura e escoradas pelo amor tornam-se reais e transformam vidas.
Toda vez que houver condições de amparo, ampare; o coração sorverá o bálsamo energético... por favor, qual coração?... tanto o que recebe quanto o doador.


Visite o blog Conto, crônica, poesia… minha literatura: http://contoecronica.wordpress.com/


terça-feira, 27 de agosto de 2013

Jamais se levantou em Israel profeta algum como Moisés

Concluímos hoje à noite o estudo do livro Deuteronômio, última obra que compõe o chamado Pentateuco Mosaico. O estudo realizou-se no Centro Espírita Nosso Lar, de Londrina-PR, em dois horários: na terça-feira (18h30) e na quinta-feira (14h30). A ele se seguirá o estudo metódico e sequencial da Revue Spirite de 1858, revista fundada e redigida por Allan Kardec.

Eis as quatro questões propostas nesta noite para debate:

1. Quem foi escolhido para sucessor de Moisés?
2. A quem incumbiria introduzir os israelitas na terra prometida?
3. Quais foram as últimas instruções do Senhor a Moisés?
4. Como se deu a morte de Moisés?

*

Após ligeiro debate sobre as questões acima, realizou-se o estudo da noite, sendo apresentadas no final as respostas dadas às perguntas propostas.

Ei-las:

1. Quem foi escolhido para sucessor de Moisés?

Josué, filho de Nun, a quem Moisés disse, diante de todo o povo israelita: "Tem ânimo e sê robusto, porque tu hás de introduzir este povo na terra que o Senhor jurou a teus pais que lhes havia de dar, e tu lha repartirás por sorte. E o Senhor que é o vosso condutor, Ele mesmo será contigo: Ele te não deixará, nem te desamparará. Não temas, nem te assustes". (Dt., 31:1 a 15.)

2. A quem incumbiria introduzir os israelitas na terra prometida?

Como dito na questão anterior, caberia a Josué essa missão, porque Moisés não viveria para isso, conforme o Senhor lhe anunciou no trecho seguinte: "Eis aí vai tu a dormir com teus pais, e este povo, levantando-se, se prostituirá a deuses estranhos na terra em que está para entrar e para habitar nela: ali me abandonará, e violará o concerto que eu fiz com ele. E o meu furor se acenderá naquele dia contra ele, e eu o deixarei, e esconderei dele o meu rosto, e ele será devorado". (Dt., 31:16 a 30.)

3. Quais foram as últimas instruções do Senhor a Moisés?

Resumidamente, estas foram as instruções, que Moisés então transmitiu ao seu povo: "Aplicai vossos corações a todas as palavras que eu hoje vos testifico, recomendai a vossos filhos que guardem e pratiquem, e cumpram tudo o que está escrito nesta lei, porque não debalde vos foram postos estes preceitos, mas sim para que cada um de vós ache neles a vida, e guardando-os moreis por muito tempo no país que ides a possuir, depois que passardes o Jordão". No mesmo dia o Senhor disse a Moisés que subisse ao monte Nebo, que fica no país de Moab defronte de Jericó, e contemplasse dali a terra de Canaã, cuja posse Ele daria aos filhos de Israel. Moisés morreria no monte. "Tu verás defronte de ti a terra que eu hei de dar aos filhos de Israel, e não entrarás nela", assegurou-lhe o Senhor. (Dt., 32:44 a 52.)

4. Como se deu a morte de Moisés?

A morte de Moisés ocorreu assim: ele subiu ao monte Nebo, defronte de Jericó, e o Senhor lhe mostrou todo o país de Galaad até Dan, todo o Neftali, a terra de Efraim e Manassés, e todo o país de Judá até o mar último, bem como a parte meridional e o espaçoso campo de Jericó, cidade das palmeiras, até Segor. Ali então, na terra de Moab, morreu Moisés, que foi sepultado no vale dos moabitas, defronte de Fogor, embora ninguém saiba exatamente o lugar da sua sepultura. O povo de Israel o chorou na planície de Moab por trinta dias, assumindo em seu lugar Josué, filho de Nun (descendente da tribo de Efraim, filho de José). Cheio de sabedoria, porque Moisés lhe tinha imposto as suas mãos, Josué conquistou desde logo o respeito dos filhos de Israel, que passaram a obedecer-lhe. E não se levantou mais em Israel profeta algum como Moisés, com quem o Senhor tratasse cara a cara, nem semelhante em sinais e portentos, como nas coisas fortes e grandes, que ele obrou à vista de todo o Israel. (Dt., 34:1 a 12.)

*


Na próxima terça-feira publicaremos neste blog o resumo do estudo da Revue Spirite de 1858, de Allan Kardec, para que o leitor, desde que o queira, possa acompanhar o desenvolvimento de nossas reuniões.


segunda-feira, 26 de agosto de 2013

As mais lindas canções que ouvi (50)

Pela luz dos olhos teus

Vinícius de Moraes e Toquinho


Quando a luz dos olhos meus
E a luz dos olhos teus
Resolvem se encontrar,
Ai, que bom que isso é, meu Deus,
Que frio que me dá o encontro desse olhar.
Mas se a luz dos olhos teus
Resiste aos olhos meus
Só pra me provocar,
Meu amor, juro por Deus,
Me sinto incendiar.

Meu amor, juro por Deus
Que a luz dos olhos meus
Já não pode esperar.
Quero a luz dos olhos meus
Na luz dos olhos teus
Sem mais lá ra ra ra...
Pela luz dos olhos teus
Eu acho, meu amor, que só se pode achar
Que a luz dos olhos meus precisa se casar.

(Lá ra ri ra ra ra...)
(Lá ra ri ra ra ra...)

Quando a luz dos olhos meus
E a luz dos olhos teus
Resolvem se encontrar,
Ai, que bom que isso é, meu Deus,
Que frio que me dá o encontro desse olhar.
Mas se a luz dos olhos teus
Resiste aos olhos meus
Só pra me provocar,
Meu amor, juro por Deus,
Me sinto incendiar.

Meu amor, juro por Deus
Que a luz dos olhos meus
Já não pode esperar.
Quero a luz dos olhos meus
Na luz dos olhos teus
Sem mais lá ra ra ra...
Pela luz dos olhos teus
Eu acho, meu amor, e só se pode achar
Que a luz dos olhos meus precisa se casar...

(Lá ra ri ra ra ra...)
(Lá ra ri ra ra ra...)

Precisa se casar...
Precisa se casar...
Precisa se casar...


Você pode ouvir a canção acima na interpretação de Miúcha e Tom Jobim clicando em - https://www.youtube.com/watch?v=YEndB-FX7rw E se quiser ouvi-la na interpretação de Gal Costa e Djavan, basta clicar neste link - https://www.youtube.com/watch?v=Bq3p07ug5-c

domingo, 25 de agosto de 2013

Os objetivos de nossa estada neste mundo

Em seu livro Socialismo e Espiritismo, obra publicada pela Casa Editora O Clarim, Léon Denis diz que a solução dos graves problemas que assolam nosso mundo passa por um processo educativo que explique ao homem o porquê de sua presença e de sua passagem sobre a Terra. Com efeito – observou Denis –, de que serve ao homem conquistar os ares, as águas e todas as forças materiais, se ele não aprende a conhecer, a discernir as finalidades de sua vida? 
O objetivo da encarnação dos Espíritos em planetas como o nosso é algo bem definido na doutrina codificada por Allan Kardec.
O Codificador do Espiritismo perguntou aos imortais: – Qual a finalidade da encarnação dos Espíritos? Eles responderam: “Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los chegar à perfeição. Para uns, é expiação; para outros, missão. Mas, para alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas as vicissitudes da existência corporal: nisso é que está a expiação. Visa ainda outro fim a encarnação: o de pôr o Espírito em condições de suportar a parte que lhe toca na obra da criação. Para executá-la é que, em cada mundo, toma o Espírito um instrumento, de harmonia com a matéria essencial desse mundo, a fim de aí cumprir, daquele ponto de vista, as ordens de Deus. É assim que, concorrendo para a obra geral, ele próprio se adianta”. (O Livro dos Espíritos, questão 132.)
Em outro momento, Kardec indagou: – Como pode a alma acabar de se depurar? Resposta: "Submetendo-se à prova de uma nova existência". A finalidade da reencarnação é, pois: "Expiação, melhoramento progressivo da Humanidade. Sem isso, onde estaria a justiça?" (O Livro dos Espíritos, 166 e 167.)
Em um artigo publicado na Revue Spirite em 1863 Kardec examinou a tese de que os Espíritos não teriam sido criados para se encarnarem. A encarnação não seria senão o resultado de uma falta. O Espiritismo afirma o contrário, ou seja, que a encarnação é uma necessidade para o progresso do Espírito e do próprio planeta em que ele vive, e não uma forma de castigo, como ensina de modo equivocado o roustainguismo.
Comunicação obtida em 1864 na Sociedade Espírita de Sens diz que a reencarnação é fator indispensável ao progresso espiritual, à qual Kardec acrescenta que, trabalhando para si mesmo, o Espírito encarnado trabalha para o melhoramento do mundo em que habita.
Em Paris, o mesmo tema foi focalizado por outro Espírito, que explicou que a reencarnação é necessária enquanto a matéria dominar o Espírito. Do momento em que o Espírito passa a dominar a matéria, a reencarnação não se torna mais necessária; é o estado dos chamados Espíritos puros. O texto pode ser visto na Revue Spirite de 1864, pp. 48 a 50.
Desta última comunicação destacamos os ensinamentos seguintes:
I) À medida que as sensações corporais do homem se tornam mais requintadas, suas sensações espirituais também despertam e crescem.
II) Sendo os fluidos os agentes que põem em movimento o nosso corpo, são eles os elementos de nossas aspirações, pois existem fluidos corpóreos e fluidos espirituais.
III) Esses fluidos compõem o corpo espiritual do Espírito que, uma vez encarnado, age por meio deles sobre a máquina humana, que ele deve aperfeiçoar.
IV) O Espírito possui livre-arbítrio e procura sempre o que lhe é agradável e satisfaz. Se for um Espírito inferior e material, busca suas satisfações na materialidade e dá, assim, um impulso aos fluidos materiais.
V) Como necessita de depuração e esta só é alcançada pelo trabalho, as encarnações escolhidas lhe são mais penosas, porque – depois de haver dado supremacia à matéria e a seus fluidos – deve constrangê-la, lutar com ela e dominá-la. 
Comentando a mensagem, Kardec ensina que, considerada do ponto de vista do progresso, a vida dos Espíritos apresenta, assim, três períodos principais:
1. O período material, no qual a influência da matéria domina a do Espírito. 
2. O período do equilíbrio, no qual ambas as influências se exercem simultaneamente.
3. O período espiritual, no qual, tendo dominado completamente a matéria, o Espírito não mais necessita da encarnação e seu trabalho passa a ser inteiramente espiritual; é o estado dos Espíritos nos mundos superiores.
Reafirmando a necessidade do processo reencarnatório, Emmanuel diz na questão 96 do livro O Consolador que a reencarnação representa, em si mesma, uma estação de tratamento e de cura de certas enfermidades d’alma, às vezes tão persistentes que podem reclamar várias estações sucessivas.
E é exatamente isso que nos mostram as trovas seguintes, psicografadas por Chico Xavier, constantes do livro Na Era do Espírito, cap. 4:
"Para quem sofre no Além
Sob a culpa em choro inglório
O regresso ao lar terrestre
É a bênção do purgatório" (Oscar Leal)
"Não adianta fugir
Do débito que se atrasa,
Reencarnação chega logo
Cobrando dentro de casa" (Cornélio Pires)
"Quando um sábio das Alturas
Necessita reencarnar
Ninguém consegue impedir
Nem adianta evitar" (Casimiro Cunha)
"De quaisquer provas na Terra
A que mais amansa a gente:
Inimigo reencarnado
Sob a forma de parente" (Lulu Parola).




sábado, 24 de agosto de 2013

A história que eu sei contar

ARTHUR BERNARDES DE OLIVEIRA
tucabernardes@gmail.com
De Guarani, MG


IX – Pequeno detalhe

Esqueci-me de um detalhe, cuja influência na realização do meu objetivo até hoje não pude analisar bem.
Mas eu explico.
Pela primeira vez na vida, eu sentia dificuldades sérias em começar a conversa. Já afirmei que a minha técnica primitiva fora abandonada. Aquela indiferença disfarçada de que falei, aliada a uma prosa irresistível, já não funcionava com a mesma capacidade de antes. Desarvorado, porque não conhecia outro processo senão aquele, fiquei no ar. Mudo e quedo na solidão do infinito como, poeticamente, sentenciaria o  inigualável poeta português.
E a minha mudez se transformou, parece-me, em bobice.
Só isso explicaria os sorrisos e deboches que depois ouvi da Lila e, até hoje, ouço de minha esposa.
É certo que fosse bobice, nascida de uma timidez sem controle.
Eu compreendo: Estava entre duas espadas. Ou melhor, entre uma certeza e uma dúvida.
A certeza de que não poderia perder aquela mulher. Perdê-la seria para mim a última derrota. Era isso o que eu pensava então. E não mudei de ideia, neste dia, em que comemoramos o nosso sétimo aniversário de casamento.
A dúvida: Não tinha muita confiança no meu sucesso.
Creio que todos os homens, quando precisam de uma vitória, passam por isso. O medo de perder, inevitavelmente, perturba a confiança.
Aí entra o detalhe.
Eu tinha um retratinho de que até hoje gosto muito.
Como toda gente, ao se julgar, eu me achava um rapaz bonito. Hoje, não tenho mais muitas ilusões a esse respeito. Mas na época, eu tinha.
É interessante esse problema da beleza. Nunca vi ninguém que, realmente, se julgasse feio. No fundo, todos descobrem em si traços que encantam, ou que agradam.
Nada mais natural, porque o conceito de beleza não é universal. A beleza, segundo entendo, não está nas coisas, mas nos olhos que as observam. Só isso justificaria a grande diversidade de gosto. Só por isso se diz que, em matéria de gosto e de cores, não se discute.
E a sabedoria popular acrescentou: “Quem ama o feio, bonito lhe parece.”
É evidente que este conceito não anula certas belezas que eu reputo universais. Sei que existem, mas são poucas.
O que não é pouco é que o conceito de belo é bastante pessoal.
Mas eu me achava bonito. E estava em boa companhia, porque minha mãe também  achava.
Então, o que fiz? Pedi à minha irmã Anita que entregasse à mocinha aquele meu retrato. Pensei cá comigo: Ela vai analisar, vai me achar bonito, e o trabalho fica facilitado.
De qualquer forma isso que me parece bobice, ou ingenuidade, sei lá, serviu para me dar mais força.
Tanto que, algumas horas depois, cheguei a ela e disse:
– Preciso falar com você. Se você quiser nós subirems juntos!

X – Aqui me defino

A subida seria para o reabastecimento espiritual.
Os habituados às semanas espíritas conhecem este tipo de reunião. São reuniões matinais, que realizamos, quase sempre, ao ar livre, para, aberto o evangelho ao acaso, estudarmos e meditarmos sobre a mensagem do dia.
Os que desejarem poderão, em tempo curto, em geral três a cinco minutos, emitir sua opinião e tecer comentários sobre o ponto lido.
Terminados os comentários, um espírita mais experimentado faz o que nós chamamos de reajustamento, coordenando as opiniões, desbastando as arestas ocasionais e resumindo a essência da  lição.
Seguem-se números de cantos e de poesias, e logo após a prece de encerramento.
Subimos para o reabastecimento espiritual.
E no caminho eu lhe disse mais ou menos isto:
“Não sei se você já me conhece bem. É provável que já me conheça mal.
Tenho sido até aqui, Elizabeth, um moço marcado por desvios.
Embora seja bom, no fundo, a vida me tem obrigado a inúmeros papelões.
De mim se pode dizer com justiça ser o próprio vício que não cede.
Todos os pais se atemorizam quando me aproximo de suas filhas.
Não pelo que lhes possa fazer, quanto à dignidade ou quanto à honra, mas pela minha absoluta incapacidade para o amor.
Tenho, talvez, uma única virtude: embora não me preocupe muito em que me façam feliz, tenho capacidade plena de fazer felizes aqueles a quem  amo.
Acho que a farei feliz, por isso.
Pois bem, analisando profundamente a minha vida, nesse ano e meio de meditações em Astolfo Dutra, cheguei a uma conclusão inevitável: preciso de alguém para viver comigo; preciso casar-me, e casar-me logo.
De modo que você foi a escolhida: aceita casar-se comigo?”
Uma pergunta assim, de sopetão, para uma menina é um caso muito sério. Sobretudo nessa fase em que a menina só pensa em coisas fúteis. Bailes, esportes, diversões, gozar a beleza da juventude mal surgida.
Ela emudeceu compenetrada.
E apenas disse: “Vamos tentar, não é?” (Continua.)


Nota:


O texto acima faz parte do livro intitulado “A história que eu sei contar”, escrito por Arthur Bernardes de Oliveira e concluído no dia 28 de julho de 1964. O livro compõe-se de 20 capítulos e está sendo publicado aqui ao longo de dez semanas, sempre aos sábados. A primeira parte foi publicada neste blog no dia 28 de julho de 2013.

Pérolas literárias (50)

Diante da Terra

Edmundo Xavier de Barros


Fugindo embora à paz de eternos dons divinos,
Sem furtar-se, porém, à luta que aprimora,
O homem é o semeador dos seus próprios destinos,
Ave triste da noite, esquivando-se à aurora...

Em derredor da Terra, estrelas cantam hinos,
Glorificando a luz onde a Verdade mora,
Mas no plano da carne os impulsos tigrinos
Fazem a ostentação da miséria que chora!

Necessário vencer nos vórtices medonhos,
Santificar a dor, as lágrimas e os sonhos,
Do inferno atravessar o abismo ígneo e fundo,

Para ver a extensão da noite estranha e densa,
Que os servos da maldade e os filhos da descrença
Estenderam, sem Deus, sobre a fronte do mundo!...



Poeta e desenhista notável, Edmundo Xavier de Barros, nascido em 1861, no Estado de Goiás, desencarnou na cidade do Rio de Janeiro, como capitão da arma de Cavalaria, em 17 de janeiro de 1905. O soneto acima integra o Parnaso de Além-Túmulo, obra psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.


sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Como definir uma vivência cristã legítima?

A pergunta que dá título a este texto foi-nos apresentada por uma leitora.
A vivência cristã implica um clima de convivência social em regime de fraternidade, em que todos se ajudam e se socorrem, dirimindo dificuldades e problemas. Viver o Cristo é conviver com o próximo, aceitando-o tal qual é, com seus defeitos e imperfeições, sem a pretensão de corrigi-lo.
O verdadeiro cristão inspira seu semelhante com bondade para que ele mesmo desperte e mude de conduta de moto próprio.
Isolar-se a pretexto de crescer espiritualmente não passa, pois, de uma experiência em que o egoísmo predomina, porque afasta o indivíduo da luta que forja heróis e constrói os santos da abnegação e da caridade. Segundo o Espiritismo, tal procedimento só merece reprovação, visto que não pode agradar a Deus uma vida pela qual o homem deliberadamente se condena a não ser útil a ninguém. É claro que não nos referimos aos que se afastam do bulício citadino buscando no retiro a tranquilidade reclamada por certas ocupações, nem aos que se recolhem a determinadas instituições fechadas para se dedicarem, amorosamente, ao socorro dos desgraçados. Apesar de afastados da convivência social, prestam eles, obviamente, excelentes serviços à sociedade e adquirem duplo mérito porque têm a seu favor, além da renúncia às satisfações mundanas, a prática das leis do trabalho e da caridade cristã.
Lembra-nos Joanna de Ângelis que, ao descer das Regiões Felizes ao vale das aflições, para nos ajudar, Jesus mostrou-nos como devem agir os que se dizem cristãos. O Mestre não convocou a si os privilegiados, mas os infelizes, os rebeldes, os rejeitados, suportando suas mazelas e amando-os.
Evocando o exemplo do Cristo, a mentora de Divaldo P. Franco recomenda (Leis Morais da Vida, cap. 31):
“Atesta a tua confiança no Senhor e a excelência da tua fé mediante a convivência com os irmãos mais inditosos que tu mesmo.
Sê-lhes a lâmpada acesa a clarificar-lhes a marcha.
Nada esperes dos outros.
Sê tu quem ajuda, desculpa, compreende.
Se eles te enganam ou te traem, se te censuram ou te exigem o que te não dão, ama-os mais, sofre-os mais, porquanto são mais carecentes de socorro e amor do que supões.
Se conseguires conviver pacificamente com os amigos difíceis e fazê-los companheiros, terás logrado êxito, porquanto Jesus em teu coração estará sempre refletido no trato, no intercâmbio social com os que te buscam e com os quais ascendes na direção de Deus.”



quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Pílulas gramaticais (65)

Há na língua portuguesa palavras que somente são usadas no plural.
Eis alguns exemplos:
- óculos
- trevas
- fezes
- olheiras
- núpcias
- afazeres
- arredores
- exéquias
- férias (no sentido de descanso)
- belas-artes
- confins
- esponsais
- escombros.
E existem vocábulos que mudam de sentido quando usados no plural.
Veja estes exemplos:
- liberdade (condição de quem é livre) e liberdades (atrevimento)
- cobre (metal) e cobres (dinheiro)
- honra (virtude) e honras (honrarias)
- féria (receita obtida) e férias (dias de descanso)
- bem (o oposto de mal) e bens (propriedades)
- confiança (atributo daquele que confia) e confianças (atrevimento).



quarta-feira, 21 de agosto de 2013

A laboriosa abelha dourada

CÍNTHIA CORTEGOSO
cinthiacortegoso@hotmail.com
De Londrina-PR

Sob o sol brilhoso, a abelha exibe sua liberdade, disciplina e determinação. Ela é um modelo da conscientização impressa em seu instinto: o trabalho cria meios e resultados propícios para o progresso.
Em um dia ela é capaz de visitar até quarenta mil flores para produzir mel, geleia real, cera e própolis para sua colônia, na verdade, essa produção se estende também para a humanidade e outros animais. Tão perseverante, é um exemplo positivo a copiar; uma pequenina tão trabalhadora na seara do meio ambiente.
Seu corpinho também carrega o ferrão, usado em casos de defesa, pois ainda há essa necessidade. O Planeta precisa de mais amor, harmonia e quando se alcançar um padrão mais elevado o ferrão dará lugar a bolsinhas repletas de carinho. Mas ainda assim, a abelha produz um alimento doce, energético e com tantas propriedades medicinais.
Como essa mesma abelhinha que vejo agora, incontáveis outras polinizam a maior parte das flores conhecidas e as que nem imaginamos; porém, existem, estão lá com sua peculiar formosura e importância. A sublime criação encaminha ao trabalho toda criatura interessada em aprender, pois, de fato, não há outro meio a não ser seguir adiante, alcançar a evolução. Muitos ainda sofrem demasiadamente e perdem precioso tempo rasgando inversa estrada, mas no decorrer, todos compreendem a natureza do espírito: ascensão.
Ah, que linda! Procurou uma florzinha e depois de saciada, foi com seu brilho dourado a outros jardins públicos e privados respeitando seu compromisso; muitas outras mil flores precisariam ser visitadas.
O trabalho amansa o coração, pois quando este se ocupa com propósitos saudáveis e produtivos, ele afirma o sentimento de felicidade e dever cumprido.
As ações são consideradas esplêndidas quando, depois de inúmeras vezes praticadas, elas se constroem com leveza e convicção e são munidas da mais pura arte, o amor. Vontade e confiança são princípios fundamentais para compreender a existência.
E lá se foi a pequena abelha sem saber todos os porquês de seu voo vital, mas com plena segurança de que o seu trabalho seria concretizado para a harmonia do mundo o qual conhecia.
O coração se sente capaz de amar, de ser feliz e de produzir quando está apto a concretizar e seguro de que aquilo realizado é o melhor meio para o progresso, e isso a abelhinha dourada já havia compreendido.
Quanto mais o espírito se ascende, mais livre se sente no eterno caminho.

Visite o blog Conto, crônica, poesia… minha literatura: http://contoecronica.wordpress.com/



terça-feira, 20 de agosto de 2013

A ideia de expiação era comum ao tempo de Moisés

Realizamos nesta noite mais uma etapa do estudo do Deuteronômio, livro que faz parte do Pentateuco Mosaico. O estudo realiza-se no Centro Espírita Nosso Lar, de Londrina-PR, em dois horários: na terça-feira (18h30) e na quinta-feira (14h30).

Eis as questões propostas nesta noite para debate:

1. Obedecer às leis do Senhor traria vantagens ao povo?
2. A ideia de expiação era comum ao tempo de Moisés?
3. A escravização e dispersão do povo hebreu foram aí preditas?
4. As gerações futuras de Israel deveriam observar a aliança firmada?
5. Obedecer aos mandamentos seria uma condição indispensável?

*

Depois de um rápido debate acerca das questões acima, realizou-se o estudo da noite e foram apresentadas, ao final, as respostas dadas às perguntas propostas.

Ei-las:

1. Obedecer às leis do Senhor traria vantagens ao povo?

Sim. Vastas compensações Moisés prometeu aos que obedecessem às leis do Senhor: o povo seria bendito no campo e na cidade e benditos os frutos do seu ventre e das suas terras; diante deles cairiam os inimigos e seus celeiros seriam fartos. "O Senhor abrirá o seu riquíssimo tesouro, que é o céu, para derramar sobre a terra chuva em seu tempo; e Ele abençoará todas as obras das tuas mãos", asseverou Moisés. A única condição seria a observância e o cumprimento dos mandamentos do Senhor. Aos desobedientes estariam, ao contrário, reservadas maldições de toda espécie, no campo e na cidade; seu celeiro seria amaldiçoado e malditos os frutos do seu ventre e das suas terras. Os que não cumprissem os mandamentos seriam malditos ao entrar e ao sair, e o Senhor mandaria sobre eles a indigência e a fome, bem como a maldição sobre todas as suas obras, até reduzi-los a pó. O descumprimento ou a não observância das leis de Deus acarretaria: pestes e pobreza, febre e frio, calor e secura, ausência de chuvas, derrota diante dos inimigos, doenças como as úlceras do Egito, a sarna e o comichão, loucura e cegueira, calúnias e opressão. (Dt., 28:1 a 29.)

2. A ideia de expiação era comum ao tempo de Moisés?

Sim. Moisés estabeleceu um vínculo direto entre a desobediência à lei e os males daí advindos. Eis alguns deles: receber por sua uma mulher e outro dormir com ela; edificar uma casa e não poder habitá-la; plantar uma vinha e não conseguir colher seus frutos; imolar um boi mas não comer dele; ver seu jumento ser arrebatado ou suas ovelhas dar-se aos seus inimigos; ver seus filhos e filhas entregues a outros povos; perder as forças das mãos; não poder evitar que pessoas estranhas comam os frutos de sua terra e de seu trabalho; ser caluniado e oprimido todos os dias; ficar atônito de terror por coisas que seus olhos haveriam de ver; ser tomado de chagas nos joelhos, nas barrigas e nas pernas, sem poder ser curado desde a planta do pé até o alto da cabeça; ser levado, bem como o seu rei, a outra gente, ali servindo a deuses estranhos; ser reduzido à última miséria; lançar muitas sementes à terra, mas recolher muito pouco, porque os gafanhotos comeriam tudo; plantar a vinha, mas nada colher, porque os bichos a destruiriam; ter oliveiras em suas terras, mas não o azeite, porque tudo cairia, perdendo-se; gerar filhos que seriam levados cativos. (Dt., 28:30 a 48.)

3. A escravização e dispersão do povo hebreu foram aí preditas?

Sim, como se pode ver nesta passagem: "O Senhor mandará de longe e das extremidades da terra sobre ti uma nação, à semelhança da águia que voa impetuosamente, cuja língua tu não possas entender: nação atrevidíssima, que não terá respeito algum ao velho, nem se compadecerá do menino". Os filhos de Israel seriam sitiados dentro de suas portas. A miséria ali seria grande, a ponto de ter de comer o fruto do seu ventre e as carnes de seus filhos e filhas. A mesquinhez e a desdita reinariam soberanas. Viriam as pragas, as doenças malignas e incuráveis, e voltariam contra os filhos de Israel todas as aflições do Egito, e o Senhor ainda os espalharia por todos os povos, de uma extremidade a outra da Terra, onde viveriam em permanente aflição. (Dt., 28:49 a 68.)

4. As gerações futuras de Israel deveriam observar a aliança firmada?

Sim. Em seu discurso, Moisés advertiu seu povo de que a aliança firmada com o Senhor obrigaria também as gerações futuras. O respeito aos mandamentos e aos cultos estabelecidos pelo Senhor seria fundamental e sua felicidade futura dependeria disso. A desobediência, ao contrário, lhes traria desgraças e desolações. (Dt., 29:1 a 29.)

5. Obedecer aos mandamentos seria uma condição indispensável?

Sim. Isso pode ser deduzido da advertência seguinte de Moisés, que lhes lembrou que, quando viessem sobre o povo as bênçãos ou as maldições por ele anunciadas, e os israelitas, tocados de arrependimento, tornassem para Deus com seus filhos, e passassem a obedecer aos seus mandamentos, de todo o seu coração e de toda a sua alma, o Senhor os tiraria do cativeiro e se compadeceria deles, congregando-os de novo e circundando o seu coração e o coração dos seus filhos, para que assim amassem o Senhor seu Deus de todo o coração e de toda a sua alma, para que pudessem viver. E converteria todas as maldições contra os inimigos, desde que Israel voltasse a ouvir a voz do Senhor e a cumprisse, observando os seus mandamentos. (Dt., 30:1 a 20.)

*

Na próxima terça-feira publicaremos neste blog o resumo do estudo realizado, para que o leitor, desde que o queira, possa acompanhar o desenvolvimento de nossas reuniões.