sábado, 11 de abril de 2015

A revolução militar de 1964 e o governo atual

JORGE LEITE DE OLIVEIRA
jojorgeleite@gmail.com
De Brasília-DF

A vida não está fácil, amiga leitora. O sapo barbudo e seus cúmplices foram presos e estão sob estrita vigilância do serviço de informação do Exército. Dizem que Vladimir Herzog acaba de se suicidar após o 31 de março de 1964...
51 anos depois...
Vamos fazer uma regressão de memória a um ex-soldado e fazê-lo lembrar-se da primeira entrevista que deu, em sua vida, sem ter a mínima noção do que estava acontecendo no país.
O ano é o de 1971...
— Soldado, qual é o seu nome, de onde você veio e o que faz aqui?
— Meu nome de guerra é Etiel, venho do morro das quatro bicas, na Penha, Rio de Janeiro, e não sei o que faço aqui...
— Como não sabe? Então não lhe ensinaram as perguntas básicas que um soldado encarregado de uma missão tem que ter na ponta da língua?
— Ah, sim... Pra aonde vou?
— Vai para o Batalhão da Polícia do Exército.
— Por que vou?
— Porque seu cinto está com a fivela suja e você tirou o boné quando passou pela equipe da Polícia do Exército (PE) encarregada de fazer a guarda nas ruas de seu bairro.
— Limpei meu cinto com Kaol, antes de sair de casa, e foi você quem retirou meu boné ao me abordar.
— O quê? Soldado, sentido! Está me chamando de mentiroso? Mais uma falta grave. E dobre a língua; como meu subordinado, deve chamar-me sempre de senhor. Senhor cabo Massinissa. Mas continue...
— Quando vou, Sr. cabo Massinissa?
— Agora mesmo.
— Como vou?
— Vai sentado ali, no camburão da gloriosa PE, junto com outros vinte soldados da Pátria.
Assim foi um dos primeiros dias em que Job Etiel saía de casa fardado para dirigir-se ao quartel em que incorporara, em São Cristóvão, no Rio de Janeiro.  Transportado com seus vizinhos para o Batalhão da Polícia do Exército (BPE) por esse pelotão militar, desde que fora abordado pelo cabo que comandava o pelotão, observou, ali, que seus 1,77m de altura eram nada ante aqueles guardiães da ordem e da disciplina de 1,90m, no mínimo.
Dias antes, fora alertado pelo tenente Raminho, também de quase dois metros e catarinense, subcomandante de sua unidade militar, para não reagir às abordagens dos soldados da PE, pois estes eram recrutados entre os brasileiros mais altos e fortes, além de serem treinados nas lutas marciais, etc. etc.
No pátio do Batalhão, Etiel fora mandado ficar na posição de sentido e em forma com outras dezenas de cidadãos que foram obrigados a servir à Pátria. Ao ser lida uma relação com os nomes de cada um deles, tinham de gritar, bem alto, seu nome de guerra.
Horas depois seriam levados ao seu quartel de origem, onde deveriam aguardar, trabalhando, as informações sobre seu “comportamento sujo e desrespeitoso”.
Tudo isso lhe acontecia sem que Etiel tivesse a mínima noção do porquê estar sendo humilhado e punido. Inflado de orgulho por ter sido preso sem ter feito nada que justificasse isso, mas também por seu “batismo de fogo”, o jovem soldado se lembrava de como fora recrutado...
Ao se alistar, dissera ao oficial encarregado que era órfão de pai, tinha seis irmãos menores, precisava ajudar sua mãe financeiramente, pois esta não recebia pensão alimentícia e era muito pobre. Ela precisava cuidar da casa, costurar a troco de míseros trocados e alimentar seus sete filhos. Etiel era seu arrimo. Além disso, disse-lhe timidamente Etiel que tinha uns pequenos problemas de audição...
Em resposta, o oficial carrancudo informou-lhe que somente com atestado de pobreza e laudo médico poderia dispensá-lo do Serviço Militar.
Nesse momento, o jovem refletiu nas vantagens de ter um salário mínimo e uma carreira promissora no Exército para ajudar financeiramente sua família e desistiu de pedir dispensa do serviço militar. Muitos dos que estavam em sua situação bendiziam, também, a oportunidade...
No quartel, Etiel era estafeta e, certo dia, deixou de entregar ao destinatário um documento cujo prazo se encerraria dias depois. Outro soldado o substituíra, pois o sargento chefe da seção de Etiel mandou este apresentar-se ao rancho, para lavar panelas, ajudar o cozinheiro, arrumar o cassino dos sargentos, servir as refeições etc. etc. etc.
Desse modo, o jovem terminava o dia exausto, mas feliz por ver o tempo passar rápido e receber seu salário mínimo, que ele repassava à sua valorosa e querida mãezinha todo o fim de mês.
Tempo bom era aquele, deixou saudades... Quer ver? Continue lendo...
Um dia, o tenente Raminho mandou o nosso soldado comparecer ao seu Posto de Comando (PC). E o saldo da conversa foi que, após breve interrogatório sobre o tal documento que acabara por não ser entregue, resolveu puni-lo com uma semana de detenção no quartel.
A conclusão do oficial fora curiosa: ele e o sargento também eram culpados pelo atraso na entrega documental, pois não deram a Etiel o tempo necessário e nem a autorização para informar ao novo estafeta a situação dos documentos; mas a falta de Etiel, a seu ver, não se justificava, ainda que o jovem cometesse outra, se abandonasse os trabalhos do rancho sem autorização...
Faltara-lhe iniciativa e por isso seu soldado deveria ser punido. Não o outro, Etiel.
— Mas não se preocupe, concluiu bondosamente o ten. Raminho, essa punição não vai constar em seus assentamentos militares...
— É justo, respondeu-lhe o soldado Etiel. E, prestando-lhe continência, solicitou permissão para retirar-se altivo e quase feliz por tão grande lição de moral recebida naquele dia.
Naquela semana, Etiel faria aniversário no quartel sem que ninguém, nem mesmo ele, se lembrasse disso, a não ser na hora de responder ao pernoite num desses dias de detenção... Ao ouvir a data do boletim do dia, quase chorou, mas continuou calado...
Nos demais dias, antes de entrar em forma para o pernoite, às 22h, um ten. chamado Matusalém, que estava sempre de plantão, como oficial do dia, ficava até altas horas jogando damas com Etiel.  Uma noite, o jogo estava tão disputado entre ambos que o soldado lhe disse:
— Chefe, passamos da hora do pernoite...
Ao que este, bonachão, lhe respondeu:
— Deixa pra lá, Etiel, o sargento da guarda me substitui e eu justifico sua falta... Vamos continuar o jogo, pois aqui está mais quente que lá fora... (Jogavam na cozinha e o pernoite era no frio pátio do quartel em época de inverno).
E foi assim que tudo começou...
Vinte e dois anos depois, sem ter feito nenhum curso militar que lhe aproveitasse os conhecimentos na vida militar e civil, profissionalmente, Etiel deu baixa do Exército...
Trouxe de lá, entretanto, boas recordações e bons amigos, mas suas melhores lembranças são as de que a disciplina, a honestidade, a verdade e a honra são valores inegociáveis.
Outra coisa importante é que Etiel não somente foi identificado, no Exército, como também ali foi imunizado com as vacinas antiamarílica, antitetânica e antitifoide...
Já este governo civil de agora, não brinca com ele, senão ele...

Leia, quando puder, o blog www.jojorgeleite.blogspot.com


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