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quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Presença do amor

GEBALDO JOSÉ DE SOUSA
gebaldojose@uol.com.br
De Goiânia-GO

Nossa amiga participa de um grupo de senhoras que confeccionam enxovais para recém-nascidos, filhos de mães carentes, da periferia de Goiânia.
Trabalho modesto – pequenininho como as crianças –, mas perseverante. Congrega trabalhadoras que doam tempo, esforços e horas tiradas ao repouso, entre uma tarefa e outra, no lar, na família, pois que  mãos acostumadas a agir, sempre úteis e diligentes, não encontram ocasião para a ociosidade.
O resultado é que centenas de infantes, ao longo dos anos, foram aquecidos por essas mãos, que somam boa vontade, no espírito de verdadeira fraternidade. Além da alegria e do bem-estar que sentem ao realizá-lo e de quanto são sólidas as amizades que constroem entre si.

*

Há alguns anos, na ida a um hospital, viu aquela mãe vestida humildemente, prestes a dar à luz o sétimo filho. Na face, a imagem da fome, do sofrimento. Acompanhava um deles, acometido de leve enfermidade, comum em crianças, sobretudo naquelas às quais faltam o pão e a higiene.
Aproximou-se dela, a saber se possuía o enxoval para o nascituro. Após algumas palavras, entrou no assunto, com a indispensável discrição. A outra, compreendendo-a, respondeu-lhe:
– Qui nada! Num tenho cumo pensá nisso. Tô preocupada é cum os qui ficaro in casa pur conta da fia maió, qui é tamém piquena. Num sei o qui eles faiz e o qui tão cumeno...
Anotou-lhe o endereço e lhe pediu explicações de como lá chegar. Em poucos dias, lá foi ela, numa visita, a levar-lhe o enxoval para a criança, que breve nasceria: e uma sacola de alimentos, além de leite e pão.
O quadro era de muito sofrimento, penúria e carência: as crianças sujinhas, famintas e maltrapilhas; o marido enfermo, meio perturbado da mente, mas, ainda assim, a plantar o quintal, a lavar roupa; e sempre ali, junto à mulher, com carinho e humildade. Viviam em pequeno barracão. Difícil compreender como se abrigavam ali tantas almas!
O pai caíra de um andaime, machucara-se e fora abandonado à própria sorte por uma dessas construtoras que levantam espigões pela cidade. Ali era peça descartável e não um ser humano. Caiu? Machucou-se? Põe outro no lugar! Não importava ele, nem a sofrida família.
Convidou-os à oração – prontamente aceita e sempre solicitada, nas futuras visitas. Cadastrou-os como assistidos do Centro Espírita de que participava, repassando-lhes a sacola de alimentos Uma vez por mês ganhavam nova cesta de víveres, além de assistirem à evangelização, no próprio Centro Espírita.
Às vezes, em casa, lembrava-se daquela família. Reunia alguns alimentos, passava por uma padaria, a comprar leite e pães, e lá ia ela para atender ao chamado da intuição feminina. É claro que chegava na hora mais oportuna. Periodicamente, convidava amigos para doarem mantimentos, roupas e calçados, para lhes levar um presente extra, pois que eram muitas as bocas a alimentar.
Um dia, seu marido – que eventualmente a acompanhava –, ao ver a plantação de batata-doce, pensando no leite das crianças, indagou-lhes:
– Vocês fazem bom dinheiro, na época da colheita, hein? – A resposta foi surpreendente, generosa, demonstrando total desapego e até certa irresponsabilidade:
– Nada. Nóis num liga prá isso, não. Nóis dá tudo prus ôto.
E davam mesmo. Eles próprios, alguns meses após, tiveram que aceitar batatas. Sem falar nos cachos de bananas, nos chuchus, mandiocas, abacates e mamões.
O marido, vendo a carência ali existente, tentava recusar tais ofertas – quem sabe também pelo orgulho de quem ainda não sabe receber. Aprendeu a lição e conformou-se, admoestado pela própria esposa:
– Não faça isso! Não seja indelicado! Aceite-os e retribua de outra forma. Percebeu a espontaneidade e a alegria em dar o que plantam e colhem?
Nessas visitas lá chegavam em dias e horas diversos, sem aviso prévio. E nunca encontraram ali briga, rusga ou momentos de desentendimentos entre eles. Certa vez, ele indagou-lhes:
– Vocês não brigam? – Na resposta, uma lição de vida para todos nós:
– Seu minino, aqui in casa às vêis farta cumida, mas num farta amô, não! Quando num há o qui cumê, nóis vai nu quintá e arranca mandioca, cuzinha e come. Deus sempre dá um jeito. Mas nóis num briga, não sinhô, qui nóis se respeita muito!

*

Eis por que a Doutrina Espírita nos recomenda aproximarmo-nos dos sofredores. Não só para lhes doar o de que carecem, mas para deles receber lições que não se aprendem no colégio, a nos educar o coração, o sentimento.
Eles, que ali levavam o pão material, recolhiam exemplos de resignação, de humildade, de carinho, de um casal extremamente pobre, mas amoroso e desprendido.
Sentiam ali a presença do amor!
E pensar que em tanta casa onde sobra o pão faltam a harmonia, a paz, o amor, o respeito recíproco, além da confiança em Deus!






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