Páginas

sábado, 4 de outubro de 2014

A verdade sobre Dom Casmurro


JORGE LEITE DE OLIVEIRA
jojorgeleite@gmail.com
De Brasília-DF

Amiga leitora e camarada leitor, revelar-lhes-ei um segredo que, até hoje, guardei comigo a sete chaves sobre minha polêmica obra Dom Casmurro. É uma verdadeira bomba o que lhes direi: afinal, Capitu traiu ou não traiu Bentinho? Coragem, prossigam lendo até o fim, e vocês saberão a verdade.
Vamos aos fatos: Bentinho, ao sair do seminário, após conhecer ali seu amigo Escobar, com a ajuda deste, conseguiu convencer d. Glória, mãe daquele, a adotar um jovem e interná-lo no seminário para pagar sua dívida, com Deus e a Igreja, de lhes dedicar um filho sacerdote. Resolvido o imbróglio, Bento Santiago foi estudar direito em São Paulo, e Escobar ficou no Rio de Janeiro, onde se dedicou ao comércio de café e prosperava visivelmente com a ajuda da mãe de Bentinho...
Alguns anos depois, Escobar casou-se com Sancha e Bentinho desposou Capitu, a namorada de infância. Escobar e Sancha tiveram uma linda menina, mas Bento e Capitu não conseguiam engravidar...
Eis que, pouco tempo após, nasceu o filho único de Capitu e Bento Santiago: Ezequiel. Mas também Escobar e Sancha só tiveram uma filha, que virou companheira de brinquedos do menino, o qual amava e era amado por seus pais.
Ezequiel, aos seis anos de idade, tinha a mania de imitar todo o mundo e, certo dia, Bentinho observou-lhe, além da mania de imitar prima Justina e José Dias, "até um jeito dos pés de Escobar e dos olhos..." (cap. CXII). Mas eram gestos... Ezequiel era muito amigo de Capituzinha (filha de Sancha e Escobar que recebera o mesmo nome de Capitu).
Certo dia, José Dias brincou com Ezequiel, pedindo-lhe para imitar seu modo de andar na rua, o que foi reprimido pela mãe da criança. O agregado então lhe afirmou que o menino imitava muito bem, e até d. Glória o beijara como paga por sua mimese perfeita.
Foi quando Bentinho comentou que os gestos do filho iam ficando cada vez "mais repetidos, como os das mãos e pés de Escobar; ultimamente, até apanhara o modo de voltar a cabeça deste, quando falava e o de deixá-la cair, quando ria" (cap. CXVI). No entanto, enquanto Escobar vivera, nada empanava a amizade entre suas famílias.
Como suas "mulheres viviam na casa uma da outra" e "os dois pequenos passavam dias, ora no Flamengo, ora na Glória", Bento comentou que eles também poderiam se apaixonar e casar, futuramente, como ocorrera entre ele e Capitu...
Sancha acrescentou que os meninos até se pareciam; entretanto, Bentinho respondeu-lhe que não era isso e, sim, porque Ezequiel imitava os gestos alheios. Escobar concordou com ele e "insinuou que alguma vez as crianças que se frequentam muito acabam parecendo-se umas com as outras". Pura verdade, não é mesmo, amiga leitora?
Um dia, após os casais fazerem plano para viajarem à Europa, dentro de dois anos, dia de ressaca marítima, Escobar morreu afogado. Momentos antes de saber a notícia, Bento contemplava o retrato que o amigo lhe dera com a seguinte dedicatória: "Ao meu querido Bentinho o seu querido Escobar 20-4-70".
Bentinho era tão ciumento que, no dia do enterro do amigo, ficou reparando os gestos de saudades por parte de Capitu àquele, como se esta não tivesse o direito de sofrer a perda de amigo tão querido do casal. Lembrou-se da expressão "olhos de ressaca", atribuída por ele à esposa, na adolescência desta, após José Dias ter-lhe dito que os olhos de Capitu pareciam os de "cigana oblíqua e dissimulada" (cap. XXXII).
Desse dia em diante, a partir de uma observação de Capitu sobre a semelhança dos olhos de Ezequiel com os de Escobar, Bentinho, que de início vira graça na observação da mulher, passou a observar estranha transformação no filho, que, a seu ver, se parecia cada vez mais com o amigo morto. Começava ali a obsessão...
Houvesse, à época, exame de DNA e tudo ficaria esclarecido.
— Mas então, Machado, qual é a "bomba" a que você se refere?
— Sim, em verdade, Bentinho sentia um ciúme doentio por Capitu, a quem amava e nisso era correspondido por ela. Até aqui, nenhuma novidade. Entretanto, como explicar o ciúme dirigido a um morto tido, até então, por irmão muitíssimo querido?
Como explicar a desconfiança da traição da mulher idolatrada, apenas por ela chamar a atenção do marido para o olhar do filho semelhante ao do amigo; se, capítulos atrás, fora explicado que Ezequiel imitava com perfeição as pessoas?
Como explicar o esquecimento por Bentinho de que Escobar era quem mais influenciava Ezequiel, que passava o dia brincando com Capituzinha, enquanto seus pais jogavam, conversavam e riam felizes, por serem tão amigos?
Agora a bomba, mui caros leitores e leitoras: Bento foi vítima de obsessão espiritual.
Ele renegara o cumprimento da promessa materna de torná-lo sacerdote, e, em consequência, atraíra para si terrível obsessor, que o fez se sentir traído por Capitu. Ele fora tão vítima quanto ela... Vítima dos ciúmes próprios e da inveja alheia.
O culpado de toda a tragédia familiar fora este obsessor: o leproso que morrera quando Bentinho ainda era seminarista.
Afastado da Igreja, Bentinho, influenciado, tomou como provas de traição da esposa as mimeses perfeitas do filho Ezequiel e a identificação psicológica do menino com o amigo, em vista da convivência íntima diária de suas famílias...
Senão assim, como se explica alguém amar tanto um amigo e, somente após a morte deste, passar a odiá-lo e ao próprio filho, devido a simples reflexos miméticos e de semelhança puramente psicológica entre este e aquele?
Como justificar Bento Santiago se deixar levar por um ciúme doentio exatamente quando o melhor amigo, Escobar, jazia morto, sem poder se defender?
É que, por trás de tudo isso, havia um gênio mau, um espírito das trevas que passara despercebido a todos os críticos e leitores de meu romance. Esse espírito fora Manduca, o leproso pobre, que falecera magoado com Bentinho, por este não ter ido ao seu enterro (cap. LXXXIV- XC). Sete capítulos... E eis que Manduca mandou mal...
Este é o grande segredo, amigo leitor; este é o grande enigma, bondosa leitora, que lhes desvendo com prioridade e privilégio, pois ninguém, senão eu, havia antes pensado nisso. Mistério que o mundo ainda não compreende, por estar sobejamente envolvido com as teorias literárias niilistas, ateias, materialistas e desprezar outras teorias, muito mais profundas, mais intensas e verdadeiras que a dos mitos olímpicos.
Esta é a bomba fatal que infelicitou Capitolina e Bento Santiago, por não entenderem os processos espirituais que lhes devastaram a vida, lhes destruíram a felicidade conjugal e   transformaram Bentinho em Casmurro.
Houvera este ido à missa com Capitolina e Ezequiel... E o mistério continua...
Oh! dúvida cruel...

Acesse, também, quando puder, o blog: www.jojorgeleite.blogspot.com



Nenhum comentário:

Postar um comentário