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terça-feira, 29 de setembro de 2015

A pequenina que aprendeu a compartilhar


CÍNTHIA CORTEGOSO
cinthiacortegoso@hotmail.com
De Londrina-PR

Veio de muito longe, não sabia de onde. Algumas pessoas, durante o longo percurso, deram algo para ela comer e água para beber. E se instalou numa rua calma com casas grandes e muito bonitas. Já era quase noite quando chegou. Encolheu-se na calçada em frente a uma notável casa branca com belo e cuidado jardim. Ficou bem encolhidinha em frente ao portão pequeno, ao lado do da entrada da garagem.
Seus olhos, um pouco desesperançosos e solitários ‒ pois quem a adotara, simplesmente não a quis mais e a colocou na rua –, imploravam, lacrimosos, por alguma atenção; ela precisava tanto de comida e de carinho. De repente, uma pequena cachorrinha com pedigree da luxuosa casa branca percebeu a presença daquela simples e grande cachorrinha de rua e, sem perder tempo, anunciou a estranha presença com um latido irritante e persistente. Um de seus donos apareceu para ver o que era, observou a pobre cachorrinha do lado de fora, mas nem se importou com ela. Pegou sua pequenina de raça com tanto amor e carinho e fechou a porta na cara da pobre cachorrinha abandonada.
Aquela noite foi bem fria, mas finalmente os raios de sol começaram a aparecer para aquecer o animalzinho sem um lar que passara a noite no relento frio e úmido. Ela olhava para a porta, tinha a esperança de alguém abri-la e alguma coisa lhe ser oferecida... um pouco de água, um cobertorzinho e alguma comida, mas apenas o que aconteceu foi o latido da cachorrinha moradora. E os olhos bondosos da vira-lata encontraram os da pequena com pedigree. Mais uma vez, o dono a chamou e fechou a porta sem sequer querer perceber a doce criatura na calçada.
A pequena moradora, muito curiosa, insistia em observar a outra cachorrinha do lado de fora. Pela terceira vez, ela correu para a frente da casa, mas sem latir, pois compreendeu que se não fizesse alarde, poderia ficar mais tempo para conhecer melhor a visitante da hora. E as duas, com um pouco de estranhamento por parte da com pedigree, começaram a se cheirar através dos vãos das grades. A cachorrinha abandonada tinha pura bondade no olhar. Assim, a com pedigree logo voltou para dentro, estava com fome e foi até sua tigelinha sempre com ração boa e fresquinha.
Ninguém, até aquele momento, havia oferecido qualquer coisa que fosse para a doce criatura na calçada; pelo menos o sol a aquecia.
Durante a refeição da pequenina com pedigree algo muito especial aconteceu. Ela, aparentemente, apenas com o instinto de satisfazer sua fome, sentiu-se sensibilizada com a pobrezinha do lado de fora. Parou de comer, bebeu um pouco de água e correu para ver se a outra cachorrinha ainda estava na calçada. Depois de constatado, ela, então, correu até sua tigela e, com cuidado, levou-a arrastando pela boca até a direção do vão da grade onde a cachorrinha abandonada estava. Em seguida, correu para buscar a outra tigela com água que, mesmo com cuidado, chegou quase sem nada. Mas, por infelicidade, as tigelinhas eram maiores do que o espaço entre um ferro e outro. Os olhos da cachorrinha abandonada baixaram: “O que será de mim?”, pareceu ser o seu pensamento. No entanto, a pequenina com pedigree não desistiu e seus olhinhos se tornaram ainda mais brilhosos, havia tido uma ideia.
Ela olhou bem nos olhos da grande vira-lata e, decidida, pegou um grãozinho de ração e se aproximou do vão para dar na boca da cachorrinha bondosa na calçada. E, assim, muitos grãos alimentaram, com consideração e carinho, a visitante. A delicadeza com que uma doava e a outra recebia era muito emocionante de se ver, como ocorreu com o dono que, de dentro da sala através do cantinho da janela, observou toda a atitude amorosa.
Depois de comer, ficou com sede, mas a pequenina de dentro não teve nenhuma ideia para dar a água. Uma sombra bem grande surgiu sobre as duas, era o dono da menorzinha. A cachorrinha de fora abaixou a cabeça, estava com medo do que lhe pudesse acontecer. A com pedigree abanou o rabinho e sorriu com os olhos ao vê-lo.
O homem, com calma, abriu o portão e a sua pequenina ficou do lado de dentro e a vira-lata, apreensiva, ouviu as seguintes palavras:
– Chega de sofrer! Venha, minha querida, entre no lar que, a partir de agora, também será seu.
A cachorrinha maior, ainda um pouco assustada, entrou devagar, receosa, bebeu o restinho de água da tigela, recebeu um afago na cabeça do seu novo dono e ao lado da pequenina de latido insistente e irritante caminhou para a sua nova vida.
Haverá as infelicidades e as decepções, mas o amor sempre existirá para curar as dores de um coração.

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