O esquecimento do passado, que é
considerado por muitos a mais séria objeção oposta à lei de reencarnação, dá
ensejo aos antagonistas do Espiritismo de formularem indagações como estas:
- Se o homem viveu antes, por que não se lembra de suas existências anteriores?
- Se não se lembra das existências passadas, como pode aproveitar a experiência adquirida nelas?
- Se não recorda o que fez ou o que aprendeu no passado, cada existência não seria para ele qual se fosse a primeira? Não estaria ele, desse modo, sempre a recomeçar?
Allan Kardec dá-nos em O Livro dos
Espíritos, em linguagem clara e concludente, uma explicação lógica e uma
resposta convincente às referidas indagações.
Não temos durante a existência corpórea,
reconhece Kardec, lembrança exata do que fomos e do que fizemos nas anteriores
existências, mas possuímos disso a intuição, sendo as nossas tendências
instintivas uma reminiscência do passado. Não fossem a nossa consciência e a
vontade que experimentamos de não reincidir nas faltas já cometidas, seria
difícil resistir a tais pendores.
A aptidão para essa ou aquela profissão,
a maior ou menor facilidade nessa ou naquela disciplina, as inclinações
interiores – eis elementos que não teriam justificativa se não existisse a
reencarnação.
Com efeito, se a alma fosse realmente
criada junto com o corpo da criança, as pessoas deveriam revelar igual talento
e idênticas predileções, mas não é isso que vemos. Os que têm filhos sabem muito
bem quão diferentes eles são, conquanto criados no mesmo ambiente e recebendo
os mesmos estímulos.
No esquecimento das existências
anteriores, sobretudo quando foram amarguradas, há em verdade algo de
providencial que atesta a bondade e a sabedoria do Criador. Assim como se dá
com os sentenciados a longas penas, todos nós desejamos apagar da memória os
delitos cometidos e felizes ficamos quando a sociedade não os conhece ou os
relega ao esquecimento.
Frequentemente – ensina o Espiritismo –
renascemos no mesmo meio em que já vivemos e estabelecemos de novo relações com
as mesmas pessoas, a fim de reparar o mal que lhes tenhamos feito. Se
reconhecêssemos nelas criaturas a quem odiamos, talvez o ódio despertasse outra
vez em nosso íntimo, e, mesmo que isso não ocorresse, sentir-nos-íamos
humilhados na presença daquelas a quem houvéssemos prejudicado ou ofendido.
É preciso ter em conta ainda um outro
dado: o esquecimento do passado ocorre apenas durante a existência corpórea.
Volvendo à vida espiritual, mesmo que não recobremos de imediato a lembrança
das existências passadas, readquirimos informações suficientes que nos situam
perante as pessoas do nosso círculo. Não existe, portanto, esquecimento real,
mas tão somente uma interrupção temporária de nossas recordações. Livres da
reminiscência de um passado certamente importuno, podemos viver com mais
liberdade, como se déssemos início a uma nova história.
Suponhamos que em nossas relações, ou em
nossa família mesma, se encontre um indivíduo que nos deu, outrora, motivos
reais de queixa, que talvez nos tenha arruinado ou desonrado, e que,
arrependido, reencarnou em nosso meio a fim de reparar suas faltas. Se nós e
ele lembrássemos as peripécias do passado, ficaríamos na mais embaraçosa
posição, que em nada contribuiria para a renovação das atitudes.
Basta essa ordem de raciocínios para
entendermos que a reminiscência das existências anteriores perturbaria as
relações sociais e constituiria uma dificuldade adicional em nossa caminhada
rumo à perfeição.
Além dos motivos de ordem afetiva e
moral, Léon Denis e Gabriel Delanne destacam as razões de ordem científica
pelas quais as lembranças do passado não podem ocorrer ao se dar a reencarnação
do Espírito.
Ensina Léon Denis que, em consequência
da diminuição do seu estado vibratório, o Espírito, cada vez que toma posse de
um corpo novo, de um cérebro virgem, acha-se na impossibilidade de exprimir as
recordações acumuladas em suas vidas precedentes. Segundo Delanne, o
perispírito toma, ao reencarnar, um movimento vibratório bastante fraco para
que o mínimo de intensidade necessário à renovação de suas lembranças possa ser
atingido.
Podemos, então, concluir em poucas
linhas:
- O esquecimento do passado e, por conseguinte, das faltas cometidas não lhes atenua as consequências.
- O conhecimento delas seria um fardo insuportável e uma causa de desânimo para muitas pessoas.
- Se a recordação do passado fosse geral, isso concorreria para a perpetuação dos ressentimentos e dos ódios.
- A existência terrestre é, algumas vezes, difícil de suportar, e o seria ainda mais se, ao cortejo dos nossos males atuais, acrescentássemos a memória dos sofrimentos e dos equívocos passados.
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