Como devemos lidar
com a obsessão e tratá-la eficazmente
Por
que os protetores espirituais não impedem que os Espíritos obsidiem uma pessoa?
Existem
em nosso meio pessoas que lidam com a mesma dúvida, como há também aqueles que
gostariam que fosse adotada nas instituições espíritas uma prática usual em
determinados círculos, na qual o agente causador da obsessão é afastado do
enfermo, às vezes até mesmo por meio de violência.
Ora,
se essa prática fosse realmente eficaz, certamente Allan Kardec e outros
autores a teriam proposto. Ocorre que obsessão não se dá por acaso e, conforme
diz Kardec, sua causa mais frequente, sobretudo nos casos mais graves, é o
desejo de vingança. Alguém lesou determinada pessoa e esta, incapaz de perdoar,
parte para o desforço, para a desforra, para a vindita.
O
objetivo da desobsessão, em casos assim, não poderia ser, evidentemente, tão só
a separação dos litigantes, fato que, ainda que fosse possível, não resolveria
a pendência que deu origem ao sentimento de vingança. Trata-se, pois, de algo
maior: a reconciliação dos litigantes, para que eles se acertem e resolvam, em
definitivo, o problema que deu origem ao processo.
O
tratamento espírita da obsessão é objeto de inúmeras obras espíritas e todas
nos mostram que as pessoas envolvidas no processo – tanto o algoz como a vítima
– jamais deixam de ser assistidas pelos benfeitores espirituais.
É
necessário, contudo, para a real eficácia do tratamento, que a pessoa que sofre
a constrição obsessiva faça a sua parte, o que é proposto com clareza por Allan
Kardec no capítulo 28, itens 81 e seguintes, d’ O Evangelho segundo o Espiritismo.
Evidente
que, no tocante a esse assunto e a muitos outros, não podemos restringir-nos ao
que Kardec escreveu, mas todos os autores, encarnados e desencarnados, que
trataram até hoje do tema, confirmaram o que o Codificador estabeleceu para que
a terapia desobsessiva tenha sucesso, a saber:
I.
a necessidade do tratamento magnético;
II.
a importância da chamada doutrinação ou esclarecimento espiritual;
III.
a renovação das atitudes por parte do enfermo.
Encontramos
na Revista Espírita de janeiro de 1865, pp. 4 a 19, o relato de um dos fatos
que levaram Kardec a semelhante conclusão. Referimo-nos ao caso de Valentine
Laurent, uma jovem que residia em Marmande (França).
Com
13 anos na época, Valentine experimentava convulsões diárias. Ela ficava tão
violenta que era preciso amarrá-la ao leito, providência que exigia o concurso
de cinco pessoas. Exorcismos, missas, passes – nada disso resolveu o problema.
O Sr. Dombre, dirigente de um grupo espírita radicado na cidade de Marmande,
inicialmente utilizou os passes. Com a insuficiência deles, resolveu evocar a
entidade que perturbava a jovem. Teve início, então, a doutrinação, que se
realizou no período de 16 a 24-9-1864. A entidade afastou-se; deu-se depois a recaída
e afinal o êxito.
Ao
relatar na Revista Espírita a experiência de Marmande, Kardec fez as seguintes
observações:
·
O
caso demonstrou a insuficiência do tratamento magnético.
·
Era
preciso, e é preciso em casos assim, remover-se a causa.
·
Para
removê-la é necessário o que chamamos de doutrinação ou esclarecimento do
agente obsessor.
Kardec
diria depois, como vemos no cap. 28, item 81, d´O Evangelho segundo o Espiritismo, acima citado, que a vontade do
paciente torna mais fácil o sucesso.
Suely
Caldas Schubert, reportando-se ao tema, escreveu em sua conhecida e apreciada
obra Obsessão/Desobsessão:
“Esclarecer o
paciente é fazê-lo sentir quanto é essencial a sua participação no tratamento;
é orientá-lo, dando-lhe uma visão gradativa, cuidadosa, do que representa em
sua existência aquele que é considerado o obsessor; é levantar-lhe as
esperanças, se estiver deprimido; é transmitir-lhe a certeza de que existem
dentro dele recursos imensos que precisam ser acionados pela vontade firme,
para que venham a eclodir, revelando-lhe facetas da própria personalidade até
então desconhecidas dele mesmo. É, enfim, ir aos poucos conscientizando-o das
responsabilidades assumidas no passado e que agora são cobradas através do
irmão infeliz que se erigiu em juiz, cobrador ou vingador.” (Obsessão/Desobsessão, segunda parte, cap.
9, p. 114.)
“O obsidiado só se
libertará quando ele mesmo se dispuser a promover a autodesobsessão. O
Espiritismo não pode fazer por ele o que ele não fizer por si mesmo. Muito
menos ainda os médiuns, ou alguém que lhe queira operar a cura. É preciso
compreender que o tratamento da obsessão não consiste na expulsão do obsessor:
alcançado isso, se fosse possível, ele depois voltaria, com forças redobradas,
à obra interrompida. A terapia tem em vista a reconciliação; trata-se de uma
conversão a ser feita, tarefa que requer do obsidiado uma ampla cooperação,
grandes esforços e boa vontade.” (Obra
citada, segunda parte, cap. 2.)
“A renovação moral
é, como já foi dito, fator essencial ao tratamento desobsessivo. Yvonne A. Pereira,
em seu livro Recordações da Mediunidade,
é incisiva a tal respeito: ‘O obsidiado, se não procurar renovar-se
diariamente, num trabalho perseverante de autodomínio ou autoeducação,
progredindo em moral e edificação espiritual, jamais deixará de se sentir
obsidiado, ainda que o seu primitivo obsessor se regenere. Sua renovação moral,
portanto, será a principal terapêutica, nos casos em que ele possa agir’.” (Obra citada, segunda parte, cap. 2.)
Cremos
que as explicações acima dão-nos subsídios suficientes para entendermos por
que, diante da obsessão, não é suficiente afastar, por meio da violência, o
agente espiritual que a provoca, fato que, por si só, demonstra a ineficácia
dos exorcismos.
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