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sábado, 29 de outubro de 2016

Contos e crônicas



Simão, o mendigo

JORGE LEITE DE OLIVEIRA
jojorgeleite@gmail.com
De Brasília-DF

Acompanhei meu secretário e esposa em passeio que fizeram ao Rio de Janeiro. No centro da cidade, eles resolveram fazer umas compras na Av. Nossa Senhora de Copacabana.
Como de praxe, viram deitados ou sentados nas calçadas diversos mendigos. Um deles era Simão, idoso e enfermo, cujo cajado estava encostado na porta fechada de uma loja.
Vagara, incerto, após fugir da seca no Piauí e fora despejado do pardieiro onde se hospedara, após acabar-se o pouco dinheiro que trouxera, resultante da venda de seu pequeno sítio a parentes que prometeram ajudá-lo, mas o deixaram desamparado. Agora, não lhe restava outra opção a não ser a de ser mais um dentre tantos seres humanos (ser, ser, seres, notou, leitor?) sem lar, sem cama, sem pão (sem, sem, sem, leitora, você viu isso?) e maltrapilho a vagar incerto, pelas longas e, por vezes, tumultuadas avenidas cariocas (as, as, as... isso é coisa da carioca Cecília Malan, rs).
Os cabelos alvos, a face enrugada, as mãos encarquilhadas de Simão muito pouco comoviam os transeuntes, que não se importavam em saber de onde viera e por que ali se encontrava. Os que o viam, apenas sabiam que se tratava de um mendigo. Não lhe conheciam o passado e nem lhes interessava seu futuro.
Com o passar dos dias, sem condições de comprar remédios para as feridas que surgiam em seu corpo encarquilhado, em virtude da desidratação e quedas, muitos pedestres o tratavam mal. Diversas pessoas afastavam-se enojadas. Alguns diziam que era “leproso”, outros alegavam que ele se fazia de doente e necessitado, mas que era farsante explorador da bolsa alheia.
Muitas vezes, Simão refletia em como fora difícil sua vida na caatinga nordestina; todavia, quando moço, possuía corpo robusto e boa saúde, a tudo superando, até chegar ali, na esperança de encontrar ao menos um biscate, um pequeno quarto onde repousar da velhice, alguma roupa limpa para vestir e o pão de cada dia. O tempo foi passando e Simão foi ficando cada vez mais fraco, mais desiludido, mais enfermo e cansado. Já não tinha forças nem mesmo para tentar localizar seus parentes no Piauí. Muito menos coragem para tal, pois sabia que seus três “filhos homens” e suas “cinco filhas mulheres” viviam em situação de penúria material e sua viagem para a “Cidade Maravilhosa” fora, para todos, uma boca a menos para comer a mandioca ralada com o pouco feijão da cuia; mais caldo do que feijão.
Um dia, porém, quando Joteli e esposa já não mais caminhavam pela avenida Nossa Senhora de Copacabana, após uma noite de chuva e de frio, o velho sofredor tentou levantar-se do seu canto na calçada onde dormira e caiu. Perdeu os sentidos e... horas depois, um rabecão que por ali passava recolheu seu corpo sem vida e o enterrou como indigente.
Assim é o destino de milhões de seres humanos.
Esta e outras cenas, vistas por meu amigo, o poeta português João de Deus, inspirou-lhe o seguinte poema, que compartilho com meus trinta ou quarenta fiéis leitores semanais:

Simão, o mendigo

Doente, pobre, velhinho,
O desditoso Simão,
Arrimado a seu bordão,
Andava devagarinho...

Pés e mãos em chaga aberta,
Lá ia o velho, coitado!
Enfermo, desamparado
E humilde na estrada incerta.

Cabelo todo branquinho,
Rugosa a face morena,
O pobre metia pena
A vagar pelo caminho...

De onde viera? Ora, quem
Buscava saber ao certo?
Vinha de longe ou de perto?
Ninguém sabia, ninguém.

Só lhe sabiam do nome,
E que, em miséria, sem nada,
Ele esmolava na estrada,
A fim de matar a fome.

Estendendo seu chapéu,
Pedia, cheio de dor:
— Uma esmola, meu senhor,
Por amor ao Pai do Céu!...

Mas, oh! Deus, que desalento
Neste mundo de aflição!
Ninguém ouvia Simão
Nas horas do sofrimento.

— Passai de largo! é leproso!...
Diziam homens cruéis
— Oh! não vos aproximeis
Deste ancião perigoso!...

— Ah! que graça! Põe-te à brisa! —
Exclamava outro passante —
— Nada de esmola ao tratante,
Que este velho não precisa!...

O mendigo, nos seus ais,
Dizia: — Viva a saúde!
Trabalhei enquanto pude,
Agora, não posso mais...

Toda a gente lhe fugia,
Ninguém lhe dava uma sopa,
Nem um trapinho de roupa
Para a noite da agonia.

Muito tempo era passado,
E o desditoso velhinho
Sentia-se mais sozinho,
Mais doente, mais cansado...

Chegou, enfim, um momento
Em que o velho sofredor
Caiu de frio e de dor
Na estrada do sofrimento.

Caiu e sonhou, contente,
Embora a sede e o cansaço,
Que Jesus vinha do Espaço
Dizendo-lhe, docemente:

— Escuta, meu bom Simão,
Não temas, querido amigo!
Sê forte! Eu estou contigo.
Chegaste à ressurreição.

Não chores. Estou aqui!...
Terminou tua aflição,
Estás em meu coração!
Pensavas que te esqueci?

Enquanto o mundo enganado
Atormentava-te ao peso
De zombaria e desprezo,
Eu sempre estive ao teu lado.

Teus prantos e tuas dores
São, hoje, a luz que te veste
No campo do amor celeste,
Repleto de eternas flores.

E Jesus, em voz mais terna,
Concluía: — Vem, Simão,
À doce consolação
Do mundo de luz eterna!...

E Simão, chorando e rindo,
A seguir, ditoso, o Mestre,
Esqueceu a dor terrestre,
No céu venturoso e lindo.

O caminho era de estrelas
De tão sublime matiz
Que o pobre ria, feliz,
Sem saber como entendê-las.

No outro dia, ao reconforto
Do Sol de coroa erguida,
Acharam Simão sem vida...
O mendigo estava morto.

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O livro também possui belas mensagens de Emmanuel, Humberto de Campos e outros escritores e poetas que já atravessaram o Campo da Esperança e me fazem companhia no Clube Beethoven ou na Academia Celestial de Letras de cidade vizinha a Nosso Lar. Ótimo presente de Natal! que poderá ser adquirido em dezembro nas livrarias espíritas ou na livraria da FEB, em Brasília, na Av. L2 Norte, ou no Rio de Janeiro, Centro, na Av. Passos, número 30.






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