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terça-feira, 30 de maio de 2017

Contos e crônicas


Reminiscência

CÍNTHIA CORTEGOSO
cinthiacortegoso@gmail.com
De Londrina-PR

‒ O senhor pode me ensinar a construir violinos? ‒ o menino Antoine perguntou ao antigo vizinho de bem antes de ele nascer.
Após a escola e o almoço, o menino se aproximava da oficina onde o senhor Marion construía muitas peças lindas em madeira. A casa mais antiga era a de Marion e a menos um pouco, ao lado, a de Antoine que nascera ali, herança de seus avós maternos. Por volta normalmente das catorze horas, o menino já estava sentado num banquinho construído pelo senhor e observando a arte que Marion dava a qualquer pedaço de madeira. Era antes um grande carpinteiro que se tornara um artista sensível, no entanto, sem alarde, apenas manteve-se com sua simplicidade.
O senhor construíra desde pequenos brinquedos a grandes móveis que enfeitavam as nobres casas francesas daquela região. E há alguns anos, ganhara muitas madeiras de boa qualidade e algumas delas apropriadas para o feitio de violinos ‒ madeiras que eram ideais para a acústica ‒, no entanto, nunca havia construído nenhum instrumento sequer. Mas, como ele sempre dizia, “tudo se pode aprender”, então, Marion foi em busca de projetos para a construção de violino. A mesma pessoa que o presenteara com as madeiras também havia encomendado o primeiro instrumento ao carpinteiro.
“Todo objetivo precisa de empenho”, uma das falas de Marion. E com este não fora diferente, pois não era tão comum encontrar um projeto ideal para um bom violino; porém, quem deseja sinceramente alcança o objetivo e, assim, Marion conheceu um senhor inglês radicado numa cidade bem próxima de onde morava que construía instrumentos de madeira com cordas. Além do objetivo, também angariou uma preciosa amizade de já alguns anos que dura até os dias presentes.
Marion tomou um grande gosto pela feitura de violinos que passou a ser o seu trabalho, vez ou outra construía outros objetos ou brinquedos. Ele se tornou um reconhecido luthier, não só da região como do país e referência no exterior. E Antoine nascera ali do lado e era natural ver um senhor construindo violinos.
No entanto, Antoine sabia que não eram violinos tão comuns, mas construídos com muito cuidado e requinte. O menino observava atenciosamente cada gesto e forma utilizados em cada parte da construção do instrumento. Sabia quais ferramentas seriam usadas, qual a sequência para a feitura, a medida das partes. Ele sabia que cada violino construído ali era “incomparável, único, por isso tão especial”, pois era assim que o senhor Marion falava em voz alta.
E naquele dia, sem responder ainda à pergunta, o luthier pediu ajuda ao menino, que segurasse o pedaço de madeira para o senhor terminar o acabamento; era uma encomenda feita por um dos mais renomados violinistas da Suíça. O projeto fora desenhado pelo próprio instrumentista, um design inovador e perfeito, pareceria inteiramente com vida o reverberar das notas no instrumento, seria pura emoção.
O pequeno Antoine segurou com precisão a madeira, uma das partes do violino. Com respeito pelo trabalho, com carinho pelo instrumento, com a certeza do magnífico som que sairia, foi assim que o menino ajudou o luthier.
Quando o sol já ameaçava esconder-se é que o senhor e o menino terminaram a parte do violino para aquele dia. O senhor Marion deu um sorriso de canto de boca, entretanto, seus olhos estavam radiantes.
E o senhor já havia percebido que Antoine amava violinos. Naquele fim de tarde, Marion ofereceu um violino da oficina com o arco para o menino vê-los de mais perto e senti-los. Agora, os olhos de Antoine é que estavam radiantes.
Ele observou cada partinha do instrumento, enquanto isso, o senhor organizava a oficina. E quando o último raio de sol se escondeu para iniciar o turno das estrelas, foi ouvido o som imensamente sensível vindo do instrumento das mãos de Antoine.
O senhor parou imediatamente o que fazia e muito devagar se virou para o menino.
‒ Sim, posso ensiná-lo a construir violinos já que é seu instrumento tão particular de há muito tempo... certamente de muitas existências ‒ falou em tom baixo ouvindo a melodia.

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