Onde há verdadeira fraternidade, o orgulho é uma
anomalia
Não
é difícil apurar a qualidade de uma fruta quando estamos no mercado diante de
uma banca. No caso da melancia, para convencer o cliente, muitos vendedores têm
por costume oferecer um pedaço da fruta e aí, ao experimentá-la, o paladar não
deixa ninguém em dúvida.
No
tocante à qualidade da sociedade em que vivemos, a aferição se faz por meio dos
exemplos que deparamos a cada momento.
Algum
tempo atrás, em um jogo de futebol disputado em Huancayo, Peru, todas as vezes
em que o jogador Tinga, do Cruzeiro, tocava na bola, torcedores da equipe Real
Garcilaso imitavam sons de macacos, um episódio de racismo que repercutiu no
mundo do futebol aqui e fora do Brasil, suscitando até mesmo uma manifestação
pública do governo do Brasil, e do governo do Peru, que classificaram de
“lamentável” o incidente.
Dias
antes do citado episódio, uma professora universitária, docente na PUC-Rio,
postou no Facebook uma foto de um homem de bermuda e regata, acrescentando-lhe
a seguinte frase: "aeroporto ou rodoviária?". Aos que não sabem,
explicamos: PUC-Rio é a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, uma
instituição de ensino que prestou e vem prestando relevantes serviços à
educação em nosso País.
O
conteúdo dos comentários postados na mesma página com relação à frase da
professora envolveu, igualmente, críticas à presença de passageiros pobres nos
voos. "O 'glamour' foi para o espaço", escreveu o reitor da
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), ao que a professora
respondeu: "Puxa, mas para glamour falta muuuitooo!!! Está mais para
estiva".
Em
seguida, outra professora universitária, também da PUC-Rio, acrescentou:
"E sabe o que é pior? quando esse tipo de passageiro senta exatamente a
seu lado e fica roçando o braço peludo no seu, porque – claro – não respeita
(ou não cabe) nos limites do seu assento".
O
fato repercutiu na mencionada rede social e foi, de imediato, censurado por
milhares de pessoas, justamente inconformadas com a absurda manifestação de
preconceito social expressa – por incrível que pareça – por três professores
universitários.
*
Toda
forma de preconceito – racial, social, religioso – é filha dileta do orgulho,
que é, como se sabe, a fonte de todos os nossos males. Pelo menos é assim que
Adolfo, ex-bispo de Argel, escreveu em uma mensagem publicada em O Evangelho segundo o Espiritismo, cap.
VII, item 12, que adiante parcialmente transcrevemos:
Não podeis ser
felizes, sem mútua benevolência; mas, como pode a benevolência coexistir com o
orgulho? O orgulho, eis a fonte de todos os vossos males.
Aplicai-vos, portanto,
em destruí-lo, se não lhe quiserdes perpetuar as funestas consequências. Um
único meio se vos oferece para isso, mas infalível: tomardes para regra
invariável do vosso proceder a lei do Cristo, lei que tendes repelido ou
falseado em sua interpretação.
Por que haveis de ter
em maior estima o que brilha e encanta os olhos, do que o que toca o coração?
Por que fazeis do vício na opulência objeto das vossas adulações, ao passo que
desdenhais do verdadeiro mérito na obscuridade? Apresente-se em qualquer parte
um rico debochado, perdido de corpo e alma, e todas as portas se lhe abrem,
todas as atenções são para ele, enquanto ao homem de bem, que vive do seu
trabalho, mal se dignam todos de saudá-lo com ar de proteção.
Quando a consideração
dispensada aos outros se mede pelo ouro que possuem ou pelo nome de que usam,
que interesse podem eles ter em se corrigirem de seus defeitos? (Adolfo, bispo
de Argel. Marmande, 1862.)
Relativamente
ao orgulho devemos todos ter presente a seguinte frase que integra os
Prolegômenos d´O Livro dos Espíritos:
“O orgulho e a ambição serão sempre uma barreira erguida entre o homem e Deus”.
Enquanto
não houver entre nós, seres humanos, o sentimento real de fraternidade, é óbvio
que o orgulho continuará imperando e, como consequência, veremos aqui e ali
atos de racismo, como o que ocorreu com o jogador Tinga, e de preconceito
social contra os não-ricos, a que nos referimos acima.
Quando,
porém, a fraternidade no seio dos povos for de fato uma realidade, poderemos
repetir a frase que Allan Kardec inseriu na parte III da Conclusão d´O Livro dos Espíritos: “Onde há
verdadeira fraternidade, o orgulho é uma anomalia”.
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