A reencarnação e as Escrituras
ASTOLFO
O. DE OLIVEIRA FILHO
aoofilho@gmail.com
De
Londrina-PR
Toda
vez que o tema reencarnação é criticado pelos opositores das ideias espíritas, os
analistas fazem questão de enfatizar que o termo reencarnação não figura em
nenhum dos livros que compõem as Escrituras.
Sim,
isso é verdade, mas não custa lembrar que entre os hebreus a ideia das vidas
anteriores era geralmente admitida, embora algumas vezes de maneira velada,
como se vê em Isaías (26:19) e Jó (14:10 e 14).
O
Decálogo, recebido por Moisés no Sinai, refere-se à ideia da reencarnação – de forma
indireta – logo no primeiro mandamento, assim constante de Êxodo, 20:1-17:
"Eu sou o Senhor
teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão. Não terás deuses
estrangeiros diante de mim. Não farás para ti imagem de escultura, nem figura
alguma de tudo o que há em cima no céu, e do que há embaixo na terra, nem de
cousa alguma que haja nas águas debaixo da terra. Não as adorarás, nem lhes
darás culto: porque eu sou o Senhor teu Deus, o Deus forte e zeloso, que vinga
a iniquidade dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração daqueles que
me aborrecem. E que usa de misericórdia até mil gerações com aqueles que me
amam e que guardam os meus preceitos."
A
punição dos "filhos" por causa do erro dos pais, um absurdo,
especialmente se praticada por Deus, é na verdade a punição dos
"pais" que retornam à carne anos depois de sua desencarnação,
geralmente na mesma família, fato registrado na literatura espírita e que é,
por sinal, bastante comum.
No
Evangelho de Mateus, 16:13-16, lemos:
"Tendo chegado à
região de Cesareia de Filipe, Jesus perguntou aos discípulos: Quem dizem por aí
as pessoas que é o Filho do homem? Responderam: Umas dizem que é João Batista;
outras, que é Elias; outras, enfim, que é Jeremias ou algum dos profetas."
Ora,
Jeremias, que vivera séculos antes do Cristo, morrera velhinho e doente. Jesus
era um jovem e sua mãe, conhecida. Se Jeremias, como pensavam os hebreus, fosse
Jesus, só poderia sê-lo pelo processo da reencarnação, ou seja, por seu retorno
à carne em outro corpo, que é exatamente a ideia da palingenesia ou
reencarnação.
Ainda
em Mateus, 11:13-15, encontramos:
"Com efeito,
todos os Profetas, bem como a Lei, profetizaram até João. E, se quiserdes
compreendê-los, João é o Elias que estava para vir. Quem tiver ouvidos, que
escute bem."
E
adiante, no mesmo Evangelho, 17:11-13:
"Respondeu-lhes
Jesus: Elias há de vir para restabelecer todas as coisas. Mas eu vos digo que
Elias já veio e não o reconheceram, mas fizeram com ele o que quiseram. Então,
os discípulos compreenderam que Jesus lhes tinha falado a respeito de João
Batista." (Mateus, 17:11-13.)
No
diálogo com Nicodemos, Jesus declarou:
"Eu vos afirmo e
esta é a verdade: se alguém não nascer da água e do Espírito, não poderá entrar
no Reino de Deus. O que nasce da carne é carne; o que nasce do Espírito é
espírito." (João, 3:5-6.)
Ensinada
por inúmeros sábios e filósofos da Antiguidade, como Pitágoras, a palingenesia
ou reencarnação não foi estranha aos cristãos primitivos. Aliás, foi Pitágoras,
o grande matemático, quem introduziu na Grécia a ideia da doutrina das vidas
sucessivas, que ele aprendera no Egito e na Pérsia, ideia essa que teria sido
adotada por Sócrates e por Platão, autor de conhecida frase: “Aprender é
recordar".
Diz
São Jerônimo que essa doutrina foi ensinada por muito tempo como uma verdade
esotérica e tradicional e Orígenes a admitia como uma necessidade lógica para a
compreensão da Bíblia.
Evidentemente,
o Espiritismo não a buscou nas Escrituras, porque são inúmeras as provas –
independentemente da sanção bíblica – de que a reencarnação é uma lei natural,
e foi por isso que Allan Kardec a arrolou entre os princípios fundamentais da
Doutrina Espírita, primeiro por ser lógica, segundo por estar sancionada pelos
fatos.
Quem
é pai e foi instruído pela religião dominante a pensar que nossa existência
corpórea é uma só e que, portanto, nossos filhos não tiveram experiências
anteriores, tem enorme dificuldade para entender as diferenças físicas, morais
e intelectuais que se observam, desde a infância, em sua prole, em que uns são
muito inteligentes, outros medianos; uns são calmos e amorosos, outros rudes e
indiferentes; uns desfrutam ótima saúde, outros enfrentam desde cedo doenças ou
limitações; uns morrem em tenra idade, outros vivem por longo tempo...
Sem
as possibilidades de crescimento moral e intelectual que a reencarnação nos
oferece, que futuro têm os indígenas, as crianças mortas durante a infância e
todos aqueles que, nascendo em paupérrimas condições, jamais puderam ir à
escola?
Quanto
à ausência de menção do termo reencarnação nas Escrituras, o motivo é fácil de
explicar, porque foi apenas entre os séculos XVI e XVIII que surgiu, no Latim
tardio, o termo erudito e acadêmico reincarnatio,
reincarnationis, que passou, em
seguida, para as línguas românicas e para o inglês. Em francês é
"réincarnation".
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