CÍNTHIA CORTEGOSO
cinthiacortegoso@gmail.com
De Londrina-PR
– Talvez
minhas lembranças sejam mais assustadoras que reconfortantes, porém fiz
história... história que, compreendendo um pouquinho mais agora, na verdade
fora somente ilusão orgulhosa e prepotente. Pobre espírito, desventuroso e
enfraquecido, quanto vagueei no vale do sofrimento, quanto chorei e padeci por
não perceber a grandeza da vida, perfeita criação de Deus.
Julguei-me
superior e agi com vaidade e poderio. Com apenas uma palavra de ordem guiava
milhares de pessoas a caminhos desgostosos e contrariados. Assim me mantive por
algumas décadas; ilusão... triste ilusão. Os indivíduos que me acompanhavam
tinham mais interesse que boa vontade sincera, eles sabiam que algo vantajoso
sempre lhes restaria, por isso estavam por perto, só por isso.
E o puro amor
não me visitou nesses meus dias de poder e nem foi capaz de romper a barreira
do frio orgulho; deveras, o puro amor é sutil e nobre demais para esse tipo de
sentimento; nós é que devemos nos redimir para na simplicidade encontrarmos a
grandeza. Nem as exclusivas roupas, nem o exuberante castelo, nem o poder sobre
um povo, nem o ouro e a riqueza extrema me trouxeram a verdadeira paz que agora
levemente comecei a sentir, pois compreendi que, antes de qualquer posição ou
existência, somos espíritos... eternos, e essa centelha só precisa vivenciar os
reais valores, para encontrar a plenitude estando um pouquinho mais próxima da
luz abençoada do Mestre Jesus.
O que mais
perturba não é a dura perseguição sofrida por irmãos cuja energia vibra na
mesma faixa; o que mais perturba o coração é a própria consciência observadora,
detalhista e impiedosa que insistentemente nos traz os fatos equivocados,
inúmeras vezes... repetidas vezes, à nossa frente, como se continuamente
estivéssemos reincidindo.
Oh, quantos
enganos, quantos dissabores! Quanto tempo desperdiçado, propício apenas para
incontáveis débitos adquiridos.
E não
observei a natureza; não passeei no campo verde de paz; não me encantei com os
pássaros e nem com as lindas flores coloridas; não conversei ao entardecer com
amigos, pois não os tive; não abracei a quem amei; não criei oportunidade de
ajudar as pessoas que, de joelhos, me imploraram; não quis sorrir para as
crianças que me acenaram; nunca toquei a mão, em um cumprimento, de alguém
humilde; não economizei atitudes a fim de alcançar os objetivos necessários
para deter ainda mais poder. Ou melhor, no campo material fui literalmente uma
incontestável infeliz rainha; no campo espiritual, o real, sou uma criatura que
bem recentemente deixou de rastejar, por tempo indeterminado, pelo pântano
sombrio das tristes ações de minha consciência. Nada se perde: nem o bem, nem o
mal.
Só mais
algumas palavras: a vida é o maior gesto de amor que Deus nos concede. Há
poucos meses estou em tratamento. A bondade divina me socorreu depois de tanto
eu me envergonhar e, finalmente, reconhecer que precisava de ajuda. E um dos
socorristas, falaram-me, foi quem me serviu em meu esplêndido castelo de ilusão
na materialidade, mas sua bondade e moral em forma de luz acabam por quase me cegar.
Agora estou neste verdadeiro castelo pleno de paz; disseram-me que é um
hospital, no entanto, nem fiz muitas perguntas para não os importunar. Para
mim, todos eles são mais anjos que médicos e enfermeiros.
Agradeço-lhe
muito por me ouvir, mas preciso descansar, ainda estou debilitada demais;
entretanto, com disciplina reviverei menos a minha incorreção passada e terei
mais fé na prece que rogo ao Mestre. Você é muito jovem e aprenderá, por meio
de observações como as que compartilhei, a não sofrer tanto.
*
A senhora
saiu amparada por dois cuidadores e nem se deu conta de que a jovem para quem
relatou sua história tinha sido a única filha na existência na qual fora uma
rainha reinante, filha adorável que nunca recebera um carinho, espírito que há
muito a acompanhara, contudo, quando a senhora mais se equilibrar, começará a
discernir e terá também melhores condições de trilhar os caminhos abençoados
que a divina providência sempre apresenta.
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