Flanelinhas e passagens de pedestres
JORGE LEITE DE OLIVEIRA
jojorgeleite@gmail.com
De Brasília-DF
Faz uns cinco anos que estivemos em
Salvador, onde residi quando solteiro, há mais de quatro décadas. Agora, ali
estava com esposa, filha, genro e neto. Mais precisamente, no Largo do
Pelourinho, na Cidade Alta, onde há diversas atrações turísticas, como museus,
associações de capoeiristas e lojas de artesanato.
Estávamos de carro locado, e meu genro
era o motorista. Tentamos estacionar numa vaga de estacionamento público,
quando nos vimos cercados por “flanelinhas”. Um deles dirigiu-nos a palavra e
cobrou antecipadamente dez reais para “vigiar” nosso carro, caso quiséssemos
deixá-lo ali. O “preço” a ser pago antecipadamente era da hora, mas se o carro
ficasse mais tempo, teríamos de pagar o equivalente.
Perguntamos-lhe se ele era funcionário
da prefeitura. Ele disse que não. Nesse momento, um dos guardas do local
aproximou-se e, indignados, expusemos-lhe a situação.
O agente de segurança também se
demonstrou altamente perplexo e passou a ameaçar o “flanelinha”, caso ocorresse
qualquer coisa com o nosso automóvel. O teatro armado na hora foi perfeito:
— Não incomode estes cidadãos. Eles vão
deixar o carro aqui e vão aonde quiserem. Quando voltarem, se você os
importunar vai se ver comigo.
— Sim, senhor... sim senhor! Eu só...
— Cale a boca!
— Mas...
— Fique calado! já lhe falei... Se
houver qualquer reclamação dessas pessoas contra você essa será a primeira e a
última.
Em seguida, disse-nos:
— Podem ir ao seu passeio, cidadãos.
Vocês não serão mais incomodados.
Ficamos até emocionados com a
autoridade do guarda. Chegamos a julgá-la, mesmo, um tanto exagerada, mas
saímos dali alegres e tranquilos. Fomos ao comércio local, compramos algumas
lembranças, visitamos um museu, assistimos a um evento de capoeira e, uma hora
depois, retornamos ao lugar do estacionamento.
Embora o dia ainda estivesse claro,
pois ainda não dera dezoito horas, para nossa surpresa, não havia mais um único
guarda ali, mas “flanelinhas” é que não faltavam. O que fora repreendido pelo
guarda havia posto um carro na frente do nosso, impedindo-nos a saída. Ao
avistar-nos, como se nada houvesse acontecido, cobrou pela hora em que o carro
ali ficara e, só após o pagamento da “taxa”, empurrou o veículo que impedia a
saída do nosso.
Também no Rio de Janeiro, há poucos
anos, no centro da cidade, à noite, minha família e a de meu primo procurávamos
um estacionamento público para deixar nosso carro, após o que jantaríamos em um
dos restaurantes locais. Depois de muito procurar, encontramos uma vaga, mas
assim que paramos ali, surgiu à nossa frente um “flanelinha” com a seguinte
informação:
— Cinco “real”, doutor, para vigiar...
E para não acontecer nada com o carro, mais cinco, na volta...
Não precisou dizer mais... saímos dali
e fomos procurar outro local para estacionar, pois a insegurança já estava
instalada. Nenhum guarda estava nas proximidades. Em Brasília, os “flanelinhas”
nos agradecem qualquer real, ou mesmo centavos, que lhes damos; salvo rara
exceção. Ainda bem! Por via das dúvidas, sempre procuro ter algumas notas de
dois reais e moedinhas de um real no carro.
Aqui no Plano Piloto, onde resido, em
Brasília, existem diversas passagens subterrâneas de pedestres. Em pleno centro
da Capital, entretanto, tais passagens são verdadeiramente imundas e não
oferecem nenhuma segurança para quem tem a coragem de por ali passar. Vândalos
quebram pisos e as paredes outrora ladrilhados, bem como espalham todo o tipo
de sujeira por lá. À noite, esses locais servem de abrigo a moradores de rua
que nos brindam com pontas de cigarro, garrafas vazias de cachaça, dejetos
fecais e urina.
Quanta diferença entre preservação e
segurança de nosso espaço turístico e o de países europeus, como Portugal, por
exemplo. Estivemos em Lisboa e outras cidades portuguesas há poucos anos e
ficamos admirados com a limpeza dos locais públicos. Raras eram as pichações
nesses lugares, e a segurança nos assegurava o direito de ir e vir sem
sobressaltos.
Um fato pitoresco, que observamos em
Lisboa, ao passarmos por estacionamento em frente a pequena loja, foi o cartaz
colocado ali: “Proibido estacionar. Obrigatório ler”.
É bem verdade que, em Paris, onde
também já estivemos, a limpeza dos espaços públicos não era tão exemplar. O
francês fuma muito e joga guimbas de
cigarro para todo lado. Entretanto, havia boas condições de segurança, nas ruas
francesas, à noite.
Enquanto isso, na capital do Brasil,
país com uma das mais altas arrecadações de impostos do mundo, quase nada se faz
para proporcionar aos turistas e cidadãos locais ao menos um pouco de segurança
e prazer no desfrute de um bom restaurante à noite, sem sobressaltos.
Vejam, que beleza!... quanta segurança!
Trabalhos “artísticos” nas paredes... (foto ao lado.) E assaltos, diversos assaltos! Nunca vi
um guarda ali!
E essa é apenas uma das diversas passagens subterrâneas
construídas para não sermos atropelados ao tentar cruzar o eixinho, logo acima.
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