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terça-feira, 26 de junho de 2018




Como se fosse para entrega

CÍNTHIA CORTEGOSO
cinthiacortegoso@gmail.com
De Londrina-PR

Passava das duas da tarde. Era dia de trabalho, ainda no meio da semana, e o simples restaurante da esquina estava fechando. Um menino de seus oito ou nove anos aguardava, discretamente na calçada, o encerramento para ganhar uma marmita. E assim aconteceu. O dono lhe passou uma sacola branca com a comida do dia, uma marmita como se fosse para entrega.
Próximo do local havia uma praça que se emendava a um campo de bairro de futebol. Na pracinha, também havia um campo de bocha, algumas mesas e bancos de cimento. E foi para lá que o menino se encaminhou. Com todo cuidado, colocou a sacola numa mesa e sentou-se num banco. Tirou a marmita, fez da sacola um guardanapo onde descansou a vasilha descartável com a comida, descolou o garfinho grudado na tampa, abriu-a devagar, olhou a comida e sentiu o cheirinho de conforto de quem se alimentaria. Embora estivesse com fome, o seu respeito pelo momento da refeição fora maior e com calma começou a comer.
Era só o menino na praça, ninguém mais. Sentado, talvez pensando em tantas coisas, como em sua família que quiçá não tivesse o que comer, ou ainda na família que nem existisse, ou em para onde ir depois de almoçar, ou onde dormir. Poderiam ser tantos questionamentos, tantos sonhos, dores, sentimentos, mas poderia também ser o pensamento de viver somente um dia de cada vez, respeitando-o com gratidão e fazendo o melhor que pudesse.
O menino terminara o almoço. Juntou o garfinho e a marmita vazia e colocou-os no saquinho branco. Ficou mais uns minutos, sentado, descansando. Quem sabe teria um lugar para voltar ou não. Então, levantou-se, deixou o saquinho em uma das latas próprias para esse tipo de resíduo e continuou seu caminho. E foi. Foi ao encontro de um dia ser ele o amparador de alguém mais necessitado, de ser o refrigério, por um momento que seja, para alguém com mais dificuldade, desesperança, desamor.
Mas talvez o menino ainda volte amanhã e ganhe mais uma marmita como se fosse para entrega.

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