O Jaque da reforma
JORGE LEITE DE
OLIVEIRA
jojorgeleite@gmail.com
De Brasília-DF
Há
três semanas, iniciou-se a reforma de nosso apartamento, em Brasília. No
princípio, o trabalho era feito por três pessoas, além do mestre de obras,
indicado pela arquiteta, que, para mau fado dela, é nossa vizinha do
apartamento ao lado.
O
tempo passou e, de uma previsão inicial de conclusão da obra em trinta a
quarenta dias, já estamos na quarta semana e a nova previsão é de, pelo menos,
outras duas. Entretanto, não garanto que a obra fique pronta nesses 42 dias. A
culpa é de um tal de Jaque: “Já
que trocamos as duas portas da frente, vamos trocar as dos três quartos. Já
que trocamos as dos quartos, por que não trocar as da cozinha e sala? Já
que um dos quartos será o escritório do Jó, vamos trocar o piso do
quarto...
Desse
modo, de “já que” em “já que” eu e minha querida esposa, estamos aproveitando
bem esta reforma do apartamento, já que entramos, há alguns anos (eu
mais que ela), na “melhor idade”. Não aceitamos menos que mudar tudo, já que
esta é a última reforma que pretendemos fazer, antes de nos mudarmos para o
campo dos pés juntos nos próximos trinta anos. Caso Matusalém interceda por
nós, para que ainda vivamos tudo isso. Depois... como gosto não se discute,
o Jaque volta à cena sob nova
direção.
Nesse
ínterim, conhecemos duas histórias
muito tristes, narradas pelo
mestre de obras.
Um
dos pedreiros que atuam na reforma é seu genro, jovem de 21 anos de idade, que
foi “apadrinhado” pelo Mauro, o mestre de obras, há poucos anos, após tragédia
familiar no lar do Rodrigo, seu genro, que se casou com uma das filhas do
Mauro, chamada Alice.
Dois
dias atrás, Rodrigo faltou ao serviço, o que não costuma ocorrer. Mais tarde,
Mauro veio ao que resta de nosso
antigo apartamento e nos narrou, não uma, mas duas histórias muito tristes.
A
primeira é a de que a filhinha
do jovem está hospitalizada e entubada, com grave problema respiratório. A
criança, de pouco mais de um ano, é portadora da Síndrome de Down, para
tristeza dos pais.
A
segunda é a de que Mauro, coração generoso, procura ajudar a família do genro
há alguns anos, quando a mãe deste foi brutalmente assassinada, com 27 facadas,
por seu ex-companheiro, bem mais velho que ela, inconformado com a separação.
Um
dos diálogos de Jesus com seus discípulos, narrado pelo Espírito Neio Lúcio,
termina com a seguinte frase do Mestre Amado:
— O
ódio pode atear muito incêndio de discórdia no mundo, mas nenhuma teoria de salvação
será realmente valiosa sem o justo benefício aos espíritos que a maldade ou a
rebelião desequilibraram. Para que o bem possa reinar entre os homens, há de
ser uma realidade positiva no campo do mal, tanto quanto a luz há de surgir
pura e viva, a fim de expulsar as trevas (LÚCIO, Neio - Espírito. Jesus no Lar. Psicografado por Chico
Xavier. Cap. 15 O ministro sábio).
O
ensinamento do perdão, que não isenta o criminoso da expiação do seu crime, ante
as Leis Divinas, está sempre presente nas mensagens dos Espíritos superiores
contidas nas obras básicas da Doutrina Espírita, em especial n’O Evangelho Segundo o Espiritismo, como
lemos abaixo:
[...]
Deveis amar os infelizes, os criminosos, como criaturas de Deus, às quais o
perdão e a misericórdia serão concedidos, se se arrependerem, como também a
vós, pelas faltas que cometeis contra a sua Lei. Considerai que sois mais
repreensíveis, mais culpados do que aqueles a quem recusardes perdão e comiseração,
visto que, na maioria das vezes, eles não conhecem Deus como o conheceis,
sendo-lhes pedido muito menos do que a vós (KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. XI. Caridade com os
criminosos).
Mais
adiante, Elizabeth de França, Espírito de alta evolução, após pedir nosso
socorro de oração ao criminoso, conclui:
Nunca
digais de um criminoso: “É um miserável; deve-se expurgar a Terra de sua
presença; a morte que lhe infligem é muito branda para um ser de tal espécie”.
Não, não é assim que deveis falar. Observai o vosso modelo, Jesus. Que diria
Ele, se visse esse infeliz junto de si? Lamentá-lo-ia; considerá-lo-ia como um
doente bem digno de piedade; estender-lhe-ia a mão [...]. O arrependimento
pode tocar seu coração, se orardes com
fé. É tanto vosso próximo, quanto o melhor dos homens; sua alma, transviada e
revoltada, foi criada, como a vossa, para se aperfeiçoar; ajudai-o, pois, a
sair do lamaçal e orai por ele (Op. cit.,
it. 15).
Aprendemos,
com os bons Espíritos, que o perdão recomendado por Jesus tem o grande mérito
de nos livrar do ódio, que tanto mal nos faz, e das próprias emanações mentais
negativas de quem nos prejudicou. Se, como vítimas, além disso, orarmos pelos
nossos inimigos, nossa prece auxiliá-los-á a se arrependerem, que é o primeiro
passo para a expiação de seu crime, ao qual se seguirá, de futuro, a
imprescindível reparação. De nossa parte, estaremos livres de todo o mal, além
de quites com a Justiça Divina de nossas dívidas passadas e presentes, conforme
for o caso. Foi isso que Jesus quis dizer, quando nos ensinou: “Perdoai as
nossas ofensas, assim como nós perdoamos aos nossos ofensores”.
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