O Espiritismo perante a Ciência
Gabriel Delanne
Parte 43
Continuamos o estudo do clássico O Espiritismo perante a Ciência, de
Gabriel Delanne, conforme tradução da obra francesa Le Spiritisme devant la Science.
Nosso objetivo é que este estudo possa
servir para o leitor como uma forma de iniciação aos chamados Clássicos do
Espiritismo.
Cada parte do estudo compõe-se de:
a) questões preliminares;
b) texto para leitura.
As respostas às questões propostas
encontram-se no final do texto abaixo.
Questões preliminares
A. É verdade que nos fenômenos de
transporte o médium fica fatigado?
B. Como o Espírito explicou a passagem
do objeto transportado pela parede do recinto?
C. Durante o transporte qual é o estado
do médium?
Texto para leitura
951. Eis como Vincent relatou, em
notas datadas de 28 de setembro de 1880, como se deu o primeiro transporte,
obtido em sua casa, com portas e janelas fechadas:
“Já há alguns dias magnetizo o médium todas as noites. Essa
recomendação me foi feita pelo Espírito que quer produzir o transporte, a fim
de bem dispor o sensitivo, que não é bastante forte para efeitos físicos, de
modo a que seja possível obter espontaneamente com seus fluidos um tal
fenômeno. Magnetizo-o, pois, ainda esta noite. Logo que adormeceu, chegou o
Espírito. Eu o interrogo como se falasse a um espírito encarnado. Ele me
entende e seu pensamento formula uma resposta que impressiona o cérebro do
médium adormecido. Este me transmite, então, de viva voz, como se ela fosse
emitida por seu pensamento, a frase que acaba de ouvir; faço, depois, outra
pergunta, e a conversa continua até que o Espírito, percebendo o médium
fatigado, me aconselha que o acorde.
– É provável – disse ele – que eu possa fazer amanhã meu
transporte.
– E que nos trareis? – pergunto.
– Tenho dois objetos em vista. Estão ambos na Inglaterra,
em Londres. Um é uma imagem que dei à minha irmã, no século passado. Há
palavras inglesas, por trás. O outro é uma lembrança que o médium deu, outrora,
a pessoa amiga. Trarei – acrescentou o Espírito – um ou outro, talvez ambos.
– Ireis, então, buscá-los na Inglaterra?
– Irei. Podes agora acordá-lo. Até amanhã.
– Acordo o médium. A sessão durou um quarto de hora.
No dia seguinte, 29 de setembro, magnetizo o médium às 9
horas da noite. O Espírito chega e me diz que vai produzir o fenômeno.
Seguindo-lhe os conselhos, fiz o médium deitar-se no chão. O Espírito manda que
apague a luz, o que faço. Colocado perto do médium, ouvir-lhe-ia os menores
movimentos. Ele não se mexe.
Espero. Ao fim de dois ou três minutos, o médium me diz,
sempre adormecido:
– Ele me apresenta alguma coisa, mas não posso tomá-la.
– Que lhe apresenta ele?
– Ah, põe-na a meu lado.
Dirijo-me, então, ao Espírito:
– Estais ainda aí?
Ele responde com voz fraca:
– Estou; voltarei, amanhã, e dar-te-ei pormenores.
Acorda-o.
Acendo a lâmpada e encontro, ao lado do médium, uma imagem
um tanto semelhante a essas gravuras que as jovens trazem em seus livros
sagrados; num lado, há um desenho representando uma rosa colorida e, por trás,
as seguintes palavras em inglês: For my
dear Rika, October, 1783.”
952. Segundo Vincent, em uma abertura,
feita na imagem, acima da rosa, passavam três pequenas fitas brancas, um pouco
desbotadas. Numa, ele leu, bordadas, estas palavras: Eu sou o pão da vida. Na
outra: God is love. E na terceira:
Cristo é minha vida. As fitas tinham algumas dobras, mas a imagem estava
intacta, e seria absolutamente impossível, rodeada como é, de um rendado muito
frágil, que esse rendado não se amarrotasse e partisse, se o médium tivesse
trazido consigo esses objetos para os colocar a seu lado. “Repito, aliás, que
ele não fez um único movimento durante a experiência. Acha-se como aniquilado
nas almofadas em que o deitei e tenho muito trabalho em acordá-lo”, afirmou
Vincent, acrescentando que o médium ficou muito fatigado, durante a noite e no
dia seguinte. Era como uma espécie de esgotamento; não havia dor, mas lassidão
geral.
953. Prossegue o relato de Vincent:
“No outro dia, às 9 e meia da noite, magnetizo o médium; o
Espírito chega.
– O médium ficou muito fatigado – diz ele – por esse
transporte; assim, não convém prolongar-lhe o sono. Desejaria que lhe tivesse
observado o coração e as pulsações. Terias notado que elas eram menos fortes
que de costume, que ele não estava mais em seu estado ordinário.
– Podeis dizer-me como procedestes?
– Não tão bem quanto queria. Foi por uma espécie de
absorção do fluido vital. Nós nos impregnamos dos fluidos do médium.
– Queria também perguntar como pudestes fazer com que esses
objetos atravessassem a parede, desde que o quarto da experiência não tem
chaminé, e as portas e as janelas estavam fechadas?
– Fui buscar os objetos de dia, com os fluidos tomados do
médium. Desmaterializei-os nos lugares em que eles se achavam, porque estavam
em duas casas diferentes; depois, quando eles se tornaram fluídicos, por essa
primeira operação, transportei-os para aqui, fazendo-os atravessar a parede,
como eu mesmo a atravesso. Tomei-os, em seguida, materiais, com outros fluidos
tomados do médium, que acabavas de adormecer. A imagem fora dada por mim,
antigamente, a minha irmã, chamada Frederika ou Rika, por abreviação, na época
em que habitávamos Londres, depois de ter deixado a Alemanha. Quanto às três
pequenas fitas, foi o médium quem as deu, há quinze ou dezesseis anos, a uma
pessoa amiga, morta depois em Londres. Agora, acorda o médium.
Acordo-o; são dez horas e um quarto. Tal é a história desse
primeiro transporte. Durante muitos dias interroguei o mesmo Espírito para
saber alguns detalhes sobre a maneira pela qual se operava o fenômeno. Ele
dizia sempre que não me podia explicar melhor do que o houvera feito.”
954. Segundo Vincent, no dia 11 de
novembro de 1880, outro Espírito deu esta resposta pela escrita medianímica:
“Pediste ao nosso amigo uma explicação do fenômeno dos transportes. O mais
erudito Espírito não poderia resolver certos problemas, que explicaria por meio
de aparelhos especiais, se vivesse na Terra. A matéria cósmica tem sempre o
maior papel nas operações dos Espíritos. Analisar como se desagrega um corpo
sólido com o auxílio dessa matéria, não é fácil, pois que o Espírito nem sempre
sabe exatamente como opera. É preciso contar também com a vontade do Espírito
que quer fazer alguma coisa. Em suma, os termos nos escapam. Sê indulgente e
crê nos vossos amigos.”
955. Na descrição desse transporte,
notamos que o estado do médium é vizinho da catalepsia e que houve perda de
fluido vital. As explicações dos Espíritos não parecem trazer grande luz ao
assunto, mas, com os conhecimentos que já possuímos, elas nos podem fazer
compreender a maneira pela qual o fenômeno se realiza.
956. Notemos que o Espírito reconhece
que ele age pela vontade, o que tínhamos estabelecido nos outros gêneros de
manifestação. A vontade é o único agente de que dispõe para manipular os
fluidos; é uma força que o Espírito dirige como quer.
957. Ele não percebe como os fenômenos
se operam; verifica-os, mas não os pode analisar, assim como há alguns séculos
acontecia com a nutrição, a respiração, que os homens ignoravam como se
produziam. Ainda hoje, a geração é uma operação misteriosa, apesar das
numerosas pesquisas feitas sobre o assunto.
958. Tentemos, entretanto, investigar
a maneira de se dar um transporte. Vimos que os corpos podem ocupar estados
diferentes, desde o sólido à matéria radiante; podemos, pois, compreender que o
Espírito, por sua vontade e com os fluidos do médium, produzirá uma operação
semelhante à da água, quando passa a vapor por meio do aquecimento. O fluido
vital faz, na desmaterialização, o papel de calórico; como compreender, porém,
que o corpo desmaterializado conserve a sua forma e as relações das moléculas
entre si?
959. Se tivéssemos apenas que lidar
com os corpos brutos, poder-se-ia supor que o Espírito forma, por sua vontade,
uma espécie de invólucro fluídico e que ele encerra o corpo desmaterializado
nesse tecido fluídico, mas não se conceberia como, voltando esse corpo ao
estado de matéria, podem as moléculas recolocar-se em sua ordem normal.
960. Vejamos uma hipótese que nos
parece a mais racional. Demonstramos que o homem tem um invólucro semimaterial
e que os animais possuem um semelhante; há duplos fluídicos em todas as
criaturas que têm vida, porque todas se desenvolvem segundo um tipo
determinado, e é necessário que uma força fluídica o conserve em meio às
contínuas mutações da matéria. Assier estabeleceu esse fato para os animais e
para as plantas, tanto pela lei de analogia, como pelas experiências diretas
que se encontram relatadas no capítulo III do seu livro sobre a humanidade
póstuma. Ele leva seu sistema mais longe ainda, e crê que o duplo fluídico se
aplica, mesmo aos corpos brutos.
961. Se considerarmos que os metais
cristalizam em tipos determinados, reconhecer-se-á que eles são também
dirigidos por uma força fluídica e que podem possuir um duplo fluídico.
Admitido esse fato, tudo se torna perfeitamente claro. O Espírito que quer fazer
um transporte tem apenas que volatilizar, de alguma sorte, a matéria do objeto
sobre o qual opera, depois transporta esse duplo para o lugar que escolheu e lá
ele toma ao fluido universal os elementos necessários à reconstrução do objeto
material por meio do fluido vital.
962. Com as plantas a operação é a
mesma. O duplo fluídico reproduz, molécula por molécula, todas as partes da
planta, pois que, sendo-lhe o esboço, basta incorporar as moléculas do fluido
universal, tornadas materiais pelo Espírito, e a planta aparece com todos os
seus pormenores, sua frescura, seu colorido, aos olhos dos assistentes. Enfim,
é sempre a mesma operação que se executa, quando um Espírito se quer tornar
visível e tangível, como nas experiências de Crookes.
963. Não sabemos até que ponto nossa
hipótese se aproxima da realidade, mas os fenômenos se produzem, é preciso
explicá-los e a nossa teoria, até agora, é a que nos parece mais de acordo com
o ensino espírita e os descobrimentos modernos. (1)
(1) Os fenômenos de transporte foram estudados por Ernesto
Bozzano, que publicou a respeito o livro Fenômenos
de Transporte, estudado sequencialmente nas edições 175 a 183 da revista O Consolador. Eis o link que remete à primeira parte do
estudo da citada obra: http://www.oconsolador.com.br/ano4/175/classicosdoespiritismo.html
Respostas às questões preliminares
A. É verdade que nos fenômenos de transporte o médium fica
fatigado?
Sim. O relato feito por Vincent revela
esse fato. Segundo ele, após a realização do transporte, o médium ficou muito
fatigado durante a noite e no dia seguinte. Era como uma espécie de
esgotamento; não havia dor, mas lassidão geral. (O Espiritismo perante a ciência, Quinta Parte, Cap. III – Médiuns
videntes e médiuns auditivos.)
B. Como o Espírito explicou a passagem do objeto
transportado pela parede do recinto?
O Espírito disse que foi buscar os
objetos com os fluidos tomados do médium. Ele os desmaterializou nos lugares em
que se achavam, porque estavam em duas casas diferentes; depois, quando se
tornaram fluídicos, transportou-os, fazendo-os atravessar a parede, como ele
próprio a atravessava. (Obra citada, Quinta Parte, Cap. III – Médiuns videntes
e médiuns auditivos.)
C. Durante o transporte qual é o estado do médium?
Segundo Delanne, o estado do médium,
durante o fenômeno, é vizinho ao da catalepsia, produzido certamente pela perda
de fluido vital. (Obra citada, Quinta Parte, Cap. III – Médiuns videntes e
médiuns auditivos.)
Observação:
Para acessar a parte 42 deste
estudo, publicada na semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2021/01/o-espiritismo-perante-ciencia-gabriel.html
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