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sábado, 22 de outubro de 2022

 



Às almas irmãs!

 

JORGE LEITE DE OLIVEIRA

jojorgeleite@gmail.com

De Brasília, DF

 

Salve, alma querida!

Estou lendo obra interessante, que recomendo a todos os espíritas cristãos e aos cristãos de modo geral. Trata-se do livro de Bittencourt Sampaio, publicado pela Federação Espírita Brasileira. O título dele é A Divina Epopeia, e o assunto principal de que trata é a reprodução parafraseada de todo o evangelho de João, em versos decassílabos livres.

Agora mesmo, revendo um poema de Machado de Assis, percebi que Bittencourt e o Bruxo do Cosme Velho utilizam semelhante processo de versificação em seus poemas, no estilo canto, quando Machado, em sua obra intitulada O Almada, poema herói-cômico em oito cantos, como Bittencourt, também versifica suas estrofes em decassílabos, cujo fragmento de verso final de cada estrofe, por vezes, é completado no início da estrofe seguinte.

Bem mais extenso do que O Almada, o evangelho de João é relatado em 21 cantos. O objetivo aqui é não somente comparar a estrutura de cada poema, mas também mostrar a diferença do objetivo dos seus autores. Machado explica, antes dos seus oito cantos, que o tema de seu poema “é rigorosamente histórico” e, mais adiante, diz que buscou o cômico “no contraste da causa com seus efeitos”. Bittencourt, ao contrário, busca o aspecto espiritual da vida e obra de Jesus em seus cantos.

Começo por duas estrofes do Canto IV d’O Almada:

 

XIII

 

Assim falou Almada, e toda a mesa

Lhe aprovou o discurso. O Vilalobos,

Em quem os olhos fita o grão prelado,

Algum tempo medita um bom alvitre,

E ia já começar a sua arenga

Quando o astuto Veloso a vez lhe toma:

“Minha ideia, senhor, é que esse infame

Nem alma, nem vigor, nem bizarria

Houve do céu e que abater-lhe a proa

O mesmo vale que esmagar brincando

Uma pulga, um mosquito, uma formiga.

Mas porque seja bom tapar a boca

Aos vadios da terra, e porque vale,

Em certos casos, afetar nas formas

Tal ou qual mansidão, que não existe,

Cuido que em lhe mandando uma embaixada

A exigir-lhe a devassa...”

 

XIV

 

“Nunca! Nunca!

(Interrompe o vigário). Uma embaixada!

E tal cousa, senhor, nascer-lhe pode

Tratar de igual a igual a um bigorrilhas!

No claro entendimento: Todo o lustre,

Valor e autoridade a igreja perde

Se não falar de cima ao tal pedante,

Com desprezo, com asco. Em boa regra,

Cortesia demanda cortesia;

Mas um vilão que a processar se atreve

Os prelados da casa do prelado,

Em vez de uma embaixada, merecia

Nas costas uma dose de cacete.

[...]

 

Recorto agora fragmentos de duas estrofes do Canto XIX d’A Divina Epopeia:

 

Então Pilatos a Jesus tomando,

O mandou açoitar. E já de espinhos

Fazendo-lhe os soldados uma coroa,

Sobre a sua cabeça a colocaram;

E puseram-lhe um manto cor de púrpura.

Depois vinham dizer-lhe: “Deus te salve,

Rei dos judeus!” E bofetadas davam-lhe.

[...]

 

Os príncipes dos padres e o seu povo,

Ao vê-lo assim bradaram:

— “Crucifica-o!

Crucifica-o!” E disse-lhes Pilatos:

— “Tomai-o vós então, crucificai-o;

Porque crime nenhum eu nele encontro.”

 

Crucificado e martirizado, Jesus retorna à vida dias depois, para nos provar que o bem sempre vencerá o mal. E, ao partir definitivamente para o reino divino, deixa-nos a certeza de que, ainda que nos matem o corpo, o espírito sobreviverá, pois somos imortais, e a Terra é local de expiações e provas.

Termino com estes versos, do grande Cruz e Sousa, dedicados aos meus queridos seguidores e leitores:

 

Mas as almas irmãs, almas eleitas,

Hão de trocar, nas regiões perfeitas,

Largos, profundos, imortais abraços!

 

(Sousa, Cruz e. Longe de tudo. In: Cruz e Sousa: poesia. Rio de Janeiro: Agir, 1982 (Nossos clássicos; 4).

 

Acesse o blog: www.jojorgeleite.blogspot.com

 

 

 

 

 

 

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