Revista Espírita de 1866
Allan Kardec
Parte 2
Prosseguimos nesta edição o estudo metódico e sequencial da Revista Espírita do ano de 1866, periódico editado e dirigido por Allan Kardec. O estudo será baseado na tradução feita por Júlio Abreu Filho publicada pela EDICEL.
A coleção do
ano de 1866 pertence a uma série iniciada em janeiro de 1858 por Allan Kardec,
que a dirigiu até 31 de março de 1869, quando desencarnou.
Cada parte do estudo,
que é apresentado às quartas-feiras, compõe-se de:
a) questões
preliminares;
b) texto para
leitura.
As respostas às
questões propostas encontram-se no final do texto abaixo.
Questões preliminares
A. Como
explicar as visões da jovem Luísa B... quando em sono cataléptico?
B. A
emancipação da alma não se dá apenas durante o sono corpóreo?
C. Como o
Espiritismo era visto na Bélgica, no final de 1865?
Texto para leitura
14. A Revista
transcreve carta do Sr. T. Jaubert, vice-presidente do Tribunal de Carcassone,
em que o missivista destaca as inúmeras realizações que o ano de 1865 havia
trazido ao Espiritismo. Quatro livros foram então mencionados pelo Sr. Jaubert:
Pluralidade dos mundos habitados, de Camille Flammarion; Pluralidade das
existências da alma, de André Pezzani; O Céu e o Inferno, de Kardec, e a novela
Espírita, de Théophile Gautier. (Págs.
14 a 16.)
15. Jaubert
refere-se também em sua carta ao caso Davenport, que ele considerava menos
causa do que pretexto para a cruzada instaurada naquele ano contra a doutrina
espírita e os espiritistas. E apoia, por fim, a definição posta por Kardec no
último número da Revista: “Quem quer que creia na existência e na sobrevivência
das almas, e na possibilidade de relação entre os homens e o mundo espiritual,
é espírita”. (Pág. 16.)
16. Com
dezesseis anos e meio, Luísa B... morava com seus pais no lugar chamado le
Bondru (Seine-et-Marne). Em consequência de violento pesar causado pela morte
de uma irmã, Luísa caíra num sono letárgico, que durara 56 horas, após o que
despertou para uma existência estranha. Durante o dia inteiro, ela ficava
imóvel numa cadeira. Chegada a noite, entrava num estado cataléptico,
caracterizado pela rigidez dos membros e pela fixidez do olhar. A jovem
adquiria então o dom da segunda vista e o da segunda audição, ouvindo palavras
proferidas perto ou longe dela. (Pág. 17.)
17. Nas mãos da
cataléptica cada objeto apresentava para ela uma imagem dupla. Ela podia ver,
assim, não apenas o exterior, mas a representação de seu interior. Transportada
a um cemitério, Luísa via e descrevia as pessoas cujos despojos tinham sido ali
sepultados. (Págs. 17 a 20.)
18. Comentando
o fato, Kardec diz que nada nele existe de excepcional. Trata-se de um fenômeno
bastante comum e explicável pelos atributos da alma, em que se encontra a sede
de todas as percepções e de todas as sensações. Durante a sua união com o
corpo, a alma percebe por meio dos sentidos e transmite o pensamento com a
ajuda do cérebro. Separada do corpo, ela percebe diretamente e pensa
livremente. (Págs. 20 e 21.)
19. Esse
estado, que chamamos emancipação da alma, ocorre normal e periodicamente
durante o sono, quando o corpo repousa, para recuperar as perdas materiais. Mas
pode ocorrer também todas as vezes que uma causa patológica ou simplesmente
fisiológica produz a inatividade total ou parcial dos órgãos da sensação ou da locomoção,
como se dá na catalepsia, na letargia e no sonambulismo. (Pág. 22.)
20. O
desprendimento da alma é tanto maior quanto mais absoluta a inércia do corpo.
Nesse estado, a alma não mais percebe pelos sentidos materiais, mas, se assim
podemos dizer, pelo sentido psíquico; eis por que suas percepções ultrapassam
nesses casos os limites ordinários. Essa é a causa da segunda vista, da visão a
distância, da lucidez sonambúlica etc. A forma corpórea que Luísa via nas
pessoas mortas é o que na doutrina espírita se chama perispírito, envoltório
fluídico que reveste a alma de todos os seres humanos. (Págs. 22 e 23.)
21. Concluindo
suas explicações, Kardec adverte que casos como o da jovem Luísa B... exigem
muito tato e prudência, pois, nesse estado de excessiva suscetibilidade, a
menor comoção pode ser funesta. É que a alma, feliz por estar desprendida do
corpo, a este se liga por um fio, que um nada pode romper irremediavelmente.
“Em casos semelhantes – assevera Kardec –, experiências feitas sem cuidado podem
matar.” (Pág. 23.)
22. De Alfred
de Musset (Espírito) a Revista transcreve dois poemas, que a crítica considerou
dignos de um poeta de primeira ordem, como o indigitado autor espiritual. “É a
maneira de Musset, sua linguagem encantadora, sua desenvoltura de cavalheiro,
seu encanto e sua graciosa atitude”, escreveu um dos redatores do jornal Monde
Illustré, Sr. Júnior, que não era espírita. (Págs. 24 a 28.)
23. A Revista
comenta o surgimento em Paris do Novo Dicionário Universal, uma nova
enciclopédia ilustrada por Maurice Lachâtre, que contava com o concurso de
cientistas, artistas e escritores, encabeçados por Allan Kardec. Segundo o
prospecto de divulgação da enciclopédia, esta era fruto da análise de mais de
400.000 obras e podia ser considerada como o mais vasto repertório de
conhecimentos humanos até então publicado. Todos os termos especiais do
vocabulário espírita, refere Kardec, ali se achavam, não com uma simples
definição, mas com todos os desenvolvimentos que comportam. A transcrição do
texto pertinente ao verbete ALMA – feita pela Revista – dá uma boa mostra da
profundeza da publicação e do respeito que seus editores revelavam pela
doutrina espírita, que conquistava desse modo relevante posição entre as
doutrinas filosóficas da época. (Págs. 28 a 32.)
24. Sob o
título “O Espiritismo segundo os espíritas”, o semanário La Discussion,
impresso em Bruxelas, edição de 31/12/1865, publicou um artigo em que o autor
diz que os vocábulos Espíritas e Espiritismo se tornaram muito conhecidos e
estavam sendo frequentemente empregados, embora muitas pessoas não soubessem o
que eles exatamente significavam. O articulista transcreve, então, diversas
referências colhidas junto a um amigo seu, partidário das ideias espíritas,
adiante resumidas: I – O Espiritismo é uma ciência ou, melhor dito, uma
filosofia espiritualista, que ensina a moral. II – Os médiuns são dotados de
uma faculdade natural que os torna aptos a servir de intermediários aos
Espíritos e a produzir com eles os fenômenos que passam por milagres ou por
prestidigitação aos olhos de quem ignore a sua explicação. III – Os Espíritos
não se comunicam com o único objetivo de provar aos vivos a sua existência:
eles ditaram e desenvolvem diariamente a filosofia espiritualista. IV – É assim
que o Espiritismo demonstra, entre outras coisas, a natureza da alma, seu
destino, a causa de nossa existência aqui, e desvenda o mistério da morte e o
porquê dos vícios e das virtudes do homem. V – Esse sistema repousa em provas
lógicas e irrefutáveis, que têm como base fatos palpáveis e a mais pura razão.
VI – Em todas as teorias que expõe, ele age como a ciência e não adianta um
ponto senão quando o precedente esteja completamente certificado. VII – O
ensinamento moral que prega não é senão a moral cristã, a moral que está
escrita no coração de todo ser humano. VIII – A moral espírita ensina-nos a
suportar a desgraça sem a desprezar, a gozar a felicidade sem a ela nos
apegarmos, e nos explica que todas as vantagens com que somos favorecidos são
outras tantas forças que nos são confiadas e de que deveremos prestar contas.
(Págs. 33 a 36.)
25. A 28 de
janeiro de 1866, o semanário – que não é especializado em assuntos filosóficos
ou religiosos, mas políticos e financeiros – voltou ao assunto para dizer que o
artigo precedente havia provocado numerosas perguntas e ilações descabidas,
como a que sugeriu tivesse o periódico se transformado em um órgão espírita. Em
face disso, seu editor tornou bem claro que o jornal estava aberto a todas as
ideias progressivas, o que é coisa diferente de assumir a paternidade dessa ou
daquela doutrina. “Pomos a ideia em evidência em toda a sua verdade. Se for
boa, fará o seu caminho e nós lhe teremos aberto a porta; se for má, teremos
fornecido o meio de ser julgada com conhecimento de causa”, explicou o editor.
(Pág. 37.)
26. Na
sequência, ele foi taxativo: “É assim que procederemos em relação ao
Espiritismo. Seja qual for a maneira de ver a seu respeito, ninguém pode
dissimular a extensão que tomou em poucos anos. Pelo número e pela qualidade de
seus partidários, conquistou uma posição entre as opiniões aceitas”.
Concluindo, após explicar que as questões sobre Espiritismo seriam ali tratadas
por espíritas, o editor afirmou: “Em suma, La Discussion não se
apresenta como órgão nem apóstolo do Espiritismo; abre-lhe as suas colunas,
como a todas as ideias novas, sem pretender impor essa opinião aos seus
leitores, sempre livres de a controlar, de a aceitar ou de a rejeitar”. (Págs.
37 e 38.)
Respostas às questões propostas
A. Como
explicar as visões da jovem Luísa B... quando em sono cataléptico?
Nesse estado, a
jovem adquiria o dom da segunda vista e o da segunda audição, ouvindo palavras
proferidas perto ou longe dela. Cada objeto apresentava para ela uma imagem
dupla. Ela podia ver, assim, não apenas o exterior, mas a representação de seu
interior. Transportada a um cemitério, Luísa via e descrevia as pessoas cujos
despojos tinham sido ali sepultados. Comentando o fato, Kardec disse que nada
nele existia de excepcional. Tratava-se de um fenômeno bastante comum e
explicável pelos atributos da alma, em que se encontra a sede de todas as
percepções e de todas as sensações. Durante a sua união com o corpo, a alma
percebe por meio dos sentidos e transmite o pensamento com a ajuda do cérebro.
Separada do corpo, ela percebe diretamente e pensa livremente. (Revista Espírita
de 1866, pp. 17 a 21.)
B. A
emancipação da alma não se dá apenas durante o sono corpóreo?
Não. A
emancipação da alma ocorre normal e periodicamente durante o sono, quando o
corpo repousa, para recuperar as perdas materiais, mas pode ocorrer também
todas as vezes que uma causa patológica ou simplesmente fisiológica produz a
inatividade total ou parcial dos órgãos da sensação ou da locomoção, como se dá
na catalepsia, na letargia e no sonambulismo. O desprendimento da alma é tanto
maior quanto mais absoluta a inércia do corpo. Nesse estado, a alma não mais
percebe pelos sentidos materiais, mas, se assim podemos dizer, pelo sentido
psíquico; eis por que suas percepções ultrapassam nesses casos os limites
ordinários. Essa é a causa da segunda vista, da visão a distância e da lucidez
sonambúlica. (Obra citada, pp. 22 e 23.)
C. Como o
Espiritismo era visto na Bélgica, no final de 1865?
Segundo o
semanário La Discussion, impresso em Bruxelas, edição de 31/12/1865, os
vocábulos Espírita e Espiritismo se tornaram muito conhecidos e estavam sendo
frequentemente empregados, embora muitas pessoas não soubessem o que eles
exatamente significavam. O articulista transcreve, então, diversas referências
colhidas junto a um amigo seu, partidário das ideias espíritas, iniciando por
definir o Espiritismo como sendo uma ciência ou, melhor dito, uma filosofia
espiritualista, que ensina a moral. O ensinamento moral que prega – diz o
artigo – não é senão a moral cristã, a moral que está escrita no coração de
todo ser humano. (Obra citada, pp. 33 a 36.)
Observação:
Para
acessar a 1ª Parte deste estudo, publicada na semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2024/07/revista-espirita-de-1866-allan-kardec.html
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