CÍNTHIA CORTEGOSO
cinthiacortegoso@hotmail.com
De Londrina-PR
Dezembro se iniciara, mas Onofre,
pai de duas meninas, gêmeas, sabia que mais um ano teria dificuldades para
comprar os presentes, mesmo simples, das filhas. Elas já contavam com oito anos
e entendiam um pouco sobre as privações existentes para a família.
Eles moravam num bairro afastado
do centro da cidade; o local era composto de casas de muita modéstia e pobreza,
ou seja, casebres. E a vida daquelas outras famílias não era muito diferente
quanto à ordem financeira, o que se distinguia era a convivência em cada casa.
De família religiosa, Onofre
passou para a esposa, Leocádia, e as filhas, a seriedade, a fé e o amor tão
necessários referentes ao sagrado, a Deus, criador de tudo; também lhes passou
a importância da oração. E era muito natural vê-los em prece pela manhã e ao se
deitarem, no entanto, sabiam que o intercâmbio entre a Terra e o Céu é em tempo
integral.
Era encantador observar as
meninas em seu recolhimento, tanta fé e pureza. Havia também Niña, uma
cachorrinha vira-lata que aparecera, pequenina, e por lá ficou. O animalzinho era
muito amado e respeitado e retribuía com grande carinho tudo o que recebia.
Enquanto as irmãs faziam a prece
matutina, a cachorrinha, graciosamente, parecia entender e também se colocava
com a cabecinha baixa e em profunda concentração. Era docemente querida.
Onofre e a esposa trabalhavam
fora. Como mãe e companheira, atenciosa, depois que chegava do trabalho
exaustivo como doméstica, ela preparava a comida e tudo o que precisassem. E o
casal se preocupava com o presente das filhas, embora soubesse que não era o
mais importante, no entanto, principalmente, criança, em todo lugar e situação,
sempre aguarda algo, pelo menos nesta data.
Os pais não comentaram sobre a
possibilidade de presenteá-las para, assim, não criarem esperanças, pois as
condições eram ainda mais favoráveis a nenhum presente.
Consequentemente, as filhas
também não cogitavam sobre o assunto, não queriam ver os pais, tristes e
impossibilitados, diante dessa situação corriqueira de fim de ano.
E com o andamento dos dias, a
certeza se efetivou: os pais não teriam o presente para as filhas. Frente a um
reparo necessário e imprevisto na casa simples, o pouco dinheiro que tentavam
separar para o grande objetivo de presentearem as filhas havia sido,
forçosamente, redirecionado à necessidade primária.
O olhar do pai e da mãe estava
sem brilho, pois viram a tristeza tentando, a todo custo, se disfarçar nos
olhinhos das meninas. Até mesmo Niña parecia perceber e, para compensar um
pouquinho, pelo menos, fazia gracinhas novas para divertir as pequeninas irmãs.
Mais um dia e uma noite se
passaram com a sensação de algo a se concretizar, entretanto, sem possibilidade
para isso. Até que o pai, sensibilizado e mais triste ainda que as filhas,
chamou-as e conversou com elas sobre a realidade por qual passavam; embora
crianças, as meninas muito compreendiam. E o carinho foi a maior ternura
recebida junto com as explicativas palavras.
– Compreendemos, papai. Tudo bem
– uma das gêmeas falou representando ambas.
Logo, as três meninas saíram
para brincar no quintal de terra batida. Quanto às três, Niña também foi
incluída.
E envolvidas pela energia tão
maravilhosa de criança brincando, elas não perceberam a aproximação de uma
jovem mulher de pele clara e cabelos longos e ondulados dourados.
Após alguns segundos, uma das
irmãs notou a presença e, surpresa, falou:
– Oi, moça, não te vi chegar.
– Vim devagar – a jovem
respondeu.
– E não te conheço. De onde você
é? – a menina tornou a perguntar.
Enquanto isso a outra irmã e
Niña também, surpresas, observavam-na.
– Sou de um lugar próximo e vim
para lhes deixar uma encomenda, antecipada, para o Natal – simplesmente
respondeu.
– Quem mandou? – a outra menina,
curiosa, perguntou se aproximando.
– Apenas entrego.
– Para quem você trabalha?
E as perguntas eram infindáveis;
crianças possuem o gene natural da curiosidade.
Sorrindo, por achar graça das
meninas e do pequeno animalzinho também tão curioso, a jovem, com dois pacotes
nas mãos, deu um para cada criança.
As meninas não compreendiam, mas
encantadas estavam. E receberam-nos, embora curiosas, com muita delicadeza e
felicidade. Começaram a desembrulhar. E nesse tempo do ocorrido, nenhuma pessoa
passou por perto, nem mesmo os pais; estavam apenas as quatro criaturas
compartilhando do momento.
Alegria. Foi o que dois semblantes
pueris demonstraram tão sinceramente.
– A boneca que eu tanto queria –
uma das meninas falou extasiada.
– Nossa! A boneca que tanto
sonhava em ter – a outra também se surpreendeu.
E com toda aquela leveza
maravilhosa e felicidade, as “três” meninas, entretidas com os presentes, não
repararam a ausência da jovem mulher de pele clara e cabelos longos dourados.
Da mesma forma que apareceu, com a luz das grandes realizações, assim, também,
a jovem partiu.
Nem sempre há respostas e
nítidas explicações no plano material; porém, no espiritual, para tudo há a
clareza de por que ser. A vida, pelo ângulo sutil, é observada como se fora uma
casa sem teto, ou seja, inteiramente vista de cima.
Presentes sempre chegarão à vida
por meio do esforço e merecimento. Para que uma ação se concretize, incontáveis
outras já terão ocorrido. Por isso, tudo é chegado no tempo exato, nem antes
nem depois, com a avaliação do curso natural.
Se luzes chegam para suavizar a
caminhada, logo, agradeça-as, e quando houver oportunidade de ser luz na vida
do outro, que a mão esquerda não saiba o que a direita doou.
E as gêmeas, sentadinhas num
banco no quintal de terra batida, nos fundos da casa, estavam radiosas por
tamanha alegria recebida, e sem compreenderem como se dera todo aquele evento,
ainda assim, em seu íntimo, agradeceram a tão maravilhosa luz de felicidade.
Então, as três meninas se
sentiam com a melhor sensação até agora vivida: a do recebimento de algo muito
desejado, assim, como para o espírito, o desejo pelo progresso.
Até Niña parecia sorrir como as
irmãs.
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