Revista Espírita de 1866
Allan Kardec
Parte 15
Prosseguimos nesta edição o estudo metódico e sequencial da Revista Espírita do ano de 1866, periódico editado e dirigido por Allan Kardec. O estudo baseia-se na tradução feita por Júlio Abreu Filho publicada pela EDICEL.
A coleção do
ano de 1866 pertence a uma série iniciada em janeiro de 1858 por Allan Kardec,
que a dirigiu até 31 de março de 1869, quando desencarnou.
Cada parte do
estudo, que é apresentado às quartas-feiras, compõe-se de:
a) questões
preliminares;
b) texto para
leitura.
As respostas às
questões propostas encontram-se no final do texto abaixo.
Questões preliminares
A. Como Kardec
se referiu ao fenômeno de sonambulismo espontâneo?
B. Há casos em
que a ação fluídica é impotente para promover a cura?
C. O orgulho e
a vaidade podem prejudicar o médium devotado à cura?
Texto para leitura
178. Tais
fatos, observa Kardec, confirmavam as previsões dos Espíritos concernentes às
novas formas que não tardaria a tomar a mediunidade. “O estado de sonambulismo
espontâneo, no qual se desenvolve, ao mesmo tempo, a mediunidade falante e a
vidente, é, com efeito, uma faculdade nova”, acrescenta o codificador. Era,
porém, uma modalidade de fenômeno que exigia, para desenvolver-se em todo o seu
brilho, um ambiente favorável, visto que uma corrente fluídica contrária
bastaria para a alterar. (Pág. 342.)
179. Assim,
essas espécies de fenômenos não se prestam absolutamente a exibições públicas,
em que a curiosidade é o sentimento dominante, quando não o da malevolência.
Por isso mesmo, requerem da parte dos assistentes uma excessiva prudência,
porquanto nesses momentos a alma se liga ao corpo apenas por um fio frágil.
(Pág. 342.)
180. Kardec
examina, no mesmo artigo, os fenômenos de êxtase, que, constituindo o mais alto
grau de emancipação da alma, exige maiores precauções do que no estado de
sonambulismo. O codificador adverte que o desprendimento proporcionado pelo
êxtase é um estado fisiológico sujeito a erros. Não se deve, pois, crer que as
visões e as revelações do êxtase sejam sempre a expressão da verdade. (Págs.
343 a 346.)
181. A Revista
volta a tratar das curas realizadas pelo Sr. Jacob, retificando alguns dados
constantes do artigo anteriormente publicado sobre o zuavo curador. O
codificador aproveita o ensejo para explicar que existe uma diferença radical
entre os médiuns curadores e os receitistas. Os primeiros curam apenas pela
ação fluídica, em mais ou menos tempo, às vezes instantaneamente, sem o emprego
de qualquer remédio. O poder curativo está todo no fluido depurado a que servem
de condutores. A aptidão para curar é inerente ao médium, mas o exercício da
faculdade só se dá com o concurso dos Espíritos, de onde se segue que, se os
Espíritos não querem, o médium é como um instrumento sem músico e nada obtém.
Ele pode, pois, perder instantaneamente a sua faculdade, o que exclui a
possibilidade de transformá-la em profissão. (Págs. 347 e 348.)
182. Kardec
relaciona, a seguir, os casos em que a ação fluídica é impotente para promover
a cura. Compreende-se, diz o codificador, que a ação fluídica possa dar
sensibilidade a um órgão, fazer dissolver e desaparecer um obstáculo ao
movimento e à percepção, cicatrizar uma ferida, porque nesses casos o fluido
torna-se um verdadeiro agente terapêutico; mas é evidente que não pode remediar
a ausência ou a destruição de um órgão, o que seria um verdadeiro milagre.
Assim, a vista poderá ser restaurada a um cego por amaurose, oftalmia, belida
ou catarata, mas não a quem tivesse os olhos estalados. Existem, pois, doenças
fundamentalmente incuráveis e seria ilusão crer que a mediunidade curadora vá
livrar a Humanidade de todas as suas enfermidades. (Págs. 348 e 349.)
183. Opera-se
com a ação fluídica uma verdadeira reação química, análoga à produzida por
certos medicamentos. Atuando o fluido como agente terapêutico, sua ação varia
conforme as propriedades que recebe das qualidades do fluido pessoal do médium.
Essa ação pode ser enérgica e poderosa em certos casos e nula em outros. É por
isso que os médiuns curadores podem ter especialidades: este curará as dores,
ou endireitará um membro, mas não restituirá a vista a um cego, e
reciprocamente. (Pág. 349.)
184. A faculdade
é completamente diferente na obsessão, e a faculdade de curar não implica a de
libertar os obsidiados. O fluido curador age materialmente sobre os órgãos
afetados, ao passo que na obsessão é preciso agir moralmente sobre o Espírito
obsessor; necessário ter autoridade sobre ele, para o fazer largar a presa. São
duas aptidões distintas que nem sempre se encontram na mesma pessoa. O concurso
do fluido curador torna-se necessário quando, o que é bastante frequente, a
obsessão se complica com afecções orgânicas. (Pág. 349.)
185. A
mediunidade curadora não vem suplantar a medicina e os médicos; vem
simplesmente provar a estes que há coisas que eles não sabem e convidá-los a
estudá-las, porquanto o elemento espiritual, que ignoram, não é uma quimera e,
bem considerado, pode abrir novos horizontes à ciência. (Págs. 349 e 350.)
186. Dependendo
a mediunidade de cura de uma disposição orgânica, muitas pessoas a possuem, ao
menos em germe. Se todos os que desejam possuí-la a pedissem com fervor e
perseverança pela prece, e com um objetivo exclusivamente humanitário, é
provável que desse concurso sairia mais de um verdadeiro médium curador. Mas,
pela natureza de seus efeitos, a mediunidade de cura exige imperiosamente o
concurso de Espíritos depurados, que não poderiam ser substituídos por
Espíritos inferiores. (Pág. 351.)
187. Há, pois,
para o médium de cura a necessidade absoluta de se conciliar o concurso dos
Espíritos superiores, senão, em vez de crescer, sua faculdade declina e
desaparece pelo afastamento dos bons Espíritos. A primeira condição para isto é
trabalhar em sua própria depuração, a fim de não alterar os fluidos salutares
que está encarregado de transmitir. Essa condição não pode ser executada sem o
mais completo desinteresse material e moral. O primeiro é mais fácil; o segundo
é mais raro. (Pág. 352.)
188. Muitos
médiuns têm caído em razão de se deixarem dominar pelo orgulho e pela vaidade.
Os Espíritos explicaram a Kardec por que tais sentimentos impedem o crescimento
dessa faculdade e prejudicam o seu exercício. A razão é simples: o poder de
curar independe da vontade do médium, mas dependem do médium as qualidades que
podem tornar esse poder frutuoso e durável. Essas qualidades são, sobretudo, o
devotamento, a abnegação e a humildade, enquanto que o egoísmo, o orgulho e a
cupidez opõem obstáculos às mais belas faculdades. (Pág. 353.)
189. O
verdadeiro médium curador é movido pelo único desejo do bem. É humilde de
coração, não inveja ninguém e não tem a pretensão de se julgar infalível. À
influência material junta a influência moral, auxiliar poderoso, que dobra a
sua força. Por sua palavra benevolente, encoraja, levanta o moral, faz nascer a
esperança e a confiança em Deus. Assim é o médium curador amado pelos bons
Espíritos, que só se ligam aos que se mostram dignos de sua proteção. (Págs.
354 e 355.)
190. O número
de novembro encerra-se com uma nota sobre a campanha em favor dos inundados
iniciada em outubro pela Sociedade Espírita de Paris. As subscrições, que
deveriam ser feitas no escritório da Revista, foram abertas com uma doação de
300 francos. (Pág. 355.)
191. A Revista
de dezembro de 1866 apresenta os pormenores do curioso caso ocorrido em 1816, à
época de Luís XVIII, envolvendo o médium Thomas-Ignace Martin, um pequeno
trabalhador do burgo de Gallardon, situado a quatro léguas de Chartres. Nascido
em 1783, Martin tinha 33 anos quando se deram os acontecimentos. (Págs. 357 e
358.)
192. O caso
pode ser assim resumido: A 15 de janeiro de 1816, estando o médium ocupado em
apagar uma queimada num campo nas proximidades de Gallardon, apareceu-lhe um
vulto que, mais tarde, se identificou como sendo o anjo Rafael. Esse Espírito
iria aparecer e desaparecer diversas vezes, até que Martin atendesse ao seu
pedido: levar ao rei um recado cujo teor ele somente saberia no momento da
visita. O cura de Gallardon, cientificado das aparições, julgou dever
dirigir-se ao seu bispo em Versalhes, o que fez com que as autoridades
francesas se inteirassem da história, que parecia não ter qualquer nexo. Com a
evolução do caso, o arcebispo de Reims se interessou pelo assunto e foi ele
quem propôs ao rei receber Martin. A 2 de abril o médium foi levado à presença
real e realizou-se então o encontro tão insistentemente proposto pelo anjo
Rafael. O que se disse ali não vem ao caso, exceto que as palavras proferidas
por Martin, sob a influência do notável mensageiro espiritual, comoveram o rei
a ponto de o fazer chorar muito, porque ele próprio declarou mais tarde que as
coisas que lhe tinham sido reveladas só eram conhecidas por ele (Luís XVIII) e
por Deus. Logo que Martin terminou sua fala, o rei lhe disse que o anjo Rafael
era o mesmo que conduziu o jovem Tobias a Rages. Depois perguntou-lhe qual das
mãos o anjo havia apertado. Martin respondeu: “Esta”, mostrando a direita. O
rei da França a segurou, dizendo: “Que eu toque a mão que o anjo apertou. Ore
sempre por mim”. (Págs. 358 a 368.)
193. Depois da
conversa com Luís XVIII, a qual durou ao menos 55 minutos, o médium não mais
viu o Espírito de Rafael, mas desenvolveu outra faculdade: tornou-se auditivo.
A Revista refere fragmentos de três cartas por ele escritas ao cura de
Gallardon, revelando alguns fatos de audição mediúnica, conquanto Martin não
tivesse visto ninguém nem soubesse dizer quem lhe falara. (Págs. 368 e 369.)
Respostas às questões propostas
A. Como Kardec
se referiu ao fenômeno de sonambulismo espontâneo?
Primeiro,
Kardec disse que tais fatos confirmavam as previsões dos Espíritos concernentes
às novas formas que não tardaria a tomar a mediunidade. “O estado de
sonambulismo espontâneo, no qual se desenvolve, ao mesmo tempo, a mediunidade
falante e a vidente, é, com efeito, uma faculdade nova”, disse o codificador.
Era, porém, uma modalidade de fenômeno que exigia, para desenvolver-se em todo
o seu brilho, um ambiente favorável, visto que uma corrente fluídica contrária
bastaria para a alterar. Assim, essas espécies de fenômenos não se prestam absolutamente
a exibições públicas, em que a curiosidade é o sentimento dominante, quando não
o da malevolência. Por isso mesmo, requerem da parte dos assistentes uma
excessiva prudência, porquanto nesses momentos a alma se liga ao corpo apenas
por um fio frágil. (Revista Espírita de 1866, p. 342.)
B. Há casos em
que a ação fluídica é impotente para promover a cura?
Sim. E Kardec
relacionou alguns desses casos. Compreende-se, disse ele, que a ação fluídica
possa dar sensibilidade a um órgão, fazer dissolver e desaparecer um obstáculo
ao movimento e à percepção, cicatrizar uma ferida, porque nesses casos o fluido
torna-se um verdadeiro agente terapêutico; mas é evidente que não pode remediar
a ausência ou a destruição de um órgão, o que seria um verdadeiro milagre.
Assim, a vista poderá ser restaurada a um cego por amaurose, oftalmia, belida
ou catarata, mas não a quem tivesse os olhos estalados. Existem, pois, doenças
fundamentalmente incuráveis e seria ilusão crer que a mediunidade curadora vá
livrar a Humanidade de todas as suas enfermidades. (Obra citada, pp. 348 e
349.)
C. O orgulho e a vaidade podem prejudicar o médium devotado à
cura?
Sim. Diz Kardec que muitos médiuns têm caído em
razão de se deixarem dominar pelo orgulho e pela vaidade. Os Espíritos explicaram
a Kardec por que tais sentimentos impedem o crescimento dessa faculdade e
prejudicam o seu exercício. A razão é simples: o poder de curar
independe da vontade do médium, mas dependem do médium as qualidades que podem
tornar esse poder frutuoso e durável. Essas qualidades são, sobretudo, o
devotamento, a abnegação e a humildade, enquanto que o egoísmo, o orgulho e a
cupidez opõem obstáculos às mais belas faculdades. (Obra citada, pp. 353 a
355.)
Observação:
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