quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

 


Revista Espírita de 1867

 

Allan Kardec

 

Parte 14 e final

 

Concluímos hoje o estudo metódico e sequencial da Revista Espírita do ano de 1867, periódico editado e dirigido por Allan Kardec. O estudo foi baseado na tradução feita por Júlio Abreu Filho publicada pela EDICEL.

A coleção do ano de 1867 pertence a uma série iniciada em janeiro de 1858 por Allan Kardec, que a dirigiu até 31 de março de 1869, quando desencarnou.

Cada parte do estudo, que foi apresentado às quartas-feiras, compôs-se de:

a) questões preliminares;

b) texto para leitura.

As respostas às questões propostas encontram-se no final do texto abaixo. 

 

Questões preliminares

 

A. Benjamin Franklin acreditava realmente na reencarnação?

B. Que observações fez Kardec a respeito de Joana d´Arc?

C. Quando e por quem foi canonizada a heroína e médium francesa?

 

Texto para leitura

 

180. Parte de uma carta escrita por Benjamin Franklin a Mrs. Jone Mecone em dezembro de 1770 revela que Franklin acreditava realmente na preexistência da alma e na reencarnação, crença que seria por ele imortalizada no famoso epitáfio de sua autoria, que a Revista novamente transcreveu. Publicado inicialmente na Revista de agosto de 1865, o epitáfio de Franklin, composto por ele mesmo, foi assim redigido: "Aqui repousa, entregue aos vermes, o corpo de Benjamin Franklin, impressor, como a cobertura de um velho livro cujas folhas são arrancadas, e o título e a douradura apagados; mas, por isto a obra não estará perdida, porque ele reaparecerá, como o acreditava, numa nova e melhor edição, revista e corrigida pelo autor." (Pág. 367.)

181. De Jean Reynaud, extraído de Pensées genevoises, por François Roget, a Revista transcreve um pequeno artigo em que seu autor afirma que a alma humana reúne e guarda em seu tesouro as impressões, as percepções e os desejos que esquecemos e que pareciam perdidos para sempre; então o resumo de todo o passado, tomando vida de uma vez, reconhecer-se-á realmente. (Pág. 368.)

182. Em um longo artigo sobre Joana d’Arc, em que Kardec arrola o que vários analistas disseram sobre a heroína e mártir francesa, o Codificador diz que Joana não foi apenas uma das grandes figuras da França, mas um imenso problema e, ao mesmo tempo, um protesto vivo contra a incredulidade. (Págs. 368 e 369.)

183. Joana d’Arc só não constitui problema nem mistério para os espíritas, que entendem muito bem que ela foi um exemplo eminente de pessoa dotada de quase todas as faculdades mediúnicas, cujos efeitos, como uma porção de outros fenômenos, se explicam pelos princípios da doutrina, sem necessidade de se recorrer ao sobrenatural. (Pág. 369.)

184. Segundo o artigo reproduzido pela Revista, assinado pelo Sr. N. de Wailly e publicado inicialmente no Propegateur de Lille de 17/8/1867, a mais importante particularidade, a que domina todas as outras no caso Joana d’Arc, são as vozes que ela escutava várias vezes por dia, que a interpelavam ou lhe respondiam, cujas entonações ela distinguia, referindo-as sobretudo a São Miguel, a Santa Catarina e a Santa Margarida. Ao mesmo tempo em que isso ocorria, manifestava-se uma viva luz na qual ela percebia a figura de seus interlocutores. “Eu os vejo com os olhos de meu corpo – disse Joana d’Arc aos seus juízes – tão bem quanto vos vejo.” (Pág. 371.)

185. O correspondente da Revista em Antuérpia, que enviou a Kardec o artigo mencionado, juntou a ele uma nota, fruto de suas pesquisas sobre o processo de Joana d’Arc, que diz o seguinte: “Pierre Cauchon, bispo de Beauvais e um inquisidor chamado Lemaire, assistidos por 60 assessores, foram os juízes de Jeanne. Seu processo foi instruído segundo as formas misteriosas e bárbaras da Inquisição, que havia jurado a sua perda. Ela quis louvar-se no julgamento do Papa e do Concílio de Bâle, mas o bispo se opôs. Um sacerdote, L’Oyseleur, a enganou, abusando da confissão, e lhe deu funestos conselhos. Por força de intrigas de toda sorte, ela foi condenada em 1431 a ser queimada viva, ‘como mentirosa, perniciosa, enganadora do povo, adivinha, blasfemadora de Deus, descrente na fé de Jesus Cristo, gabola, idólatra, cruel, dissoluta, invocadora dos diabos, sistemática e herética’. O Papa Calixto III, em 1456, por uma comissão eclesiástica, fez pronunciar a reabilitação de Jeanne e, por uma sentença solene, foi declarado que Jeanne morreu mártir para a defesa de sua religião, de sua pátria e de seu rei. O Papa quis mesmo canonizá-la, mas sua coragem não foi tão longe. Pierre Cauchon morreu subitamente em 1443, fazendo a barba. Foi excomungado, seu corpo foi desenterrado e atirado num monturo”. (Págs. 375 e 376.)

186. Um dos correspondentes da Revista em Oloron, Basses-Pyrénnées, enviou a Kardec um curioso relato sobre a aparição de um Espírito à jovem Marianne Courbet, uma camponesa de 24 anos. O fato se deu no final de dezembro de 1866. A aparição, em forma de um velho de estatura média, vestido à camponesa, além de conversar com Marianne, deu-lhe um par de óculos e um livro de orações, após o que desapareceu. O teor da conversa com aquele vulto, que lhe falou de sua mãe e de uma irmã falecidas há algum tempo, impressionou vivamente a jovem, que se apressou em relatar o fato ao cura de Monin. Este lhe disse que pensava que houvesse algo extraordinário naquele episódio e aconselhou-a a guardar o livro com cuidado. (Págs. 376 a 378.)

187. Como a notícia logo se espalhou, uma multidão passou a visitar a casa da vidente, a ponto de o cura de Monin, que a princípio achara a coisa muito extraordinária, ter de dissuadir os paroquianos de ir visitar a camponesa. Em Monin e em Oloron – informou o correspondente da Revista – as opiniões estavam divididas. Uns acreditavam em Marianne, outros não. Entre os crentes, acrescentou o informante, a opinião geral era de que o vulto teria sido São José, embora ele não visse ali senão uma manifestação espírita cujo fim era chamar a atenção sobre a filosofia espírita, numa região dominada por influências contrárias. (Pág. 378.)

188. A Revista transcreve artigo publicado pelo jornal L’Exposition populaire illustrée em que a redação deste refuta crítica que lhe fora feita por Kardec por ocasião de seus comentários sobre as curas do Sr. Gassner. A discussão central girou em torno dos vocábulos taumaturgo e milagre, que Kardec não aceita quando aplicados aos médiuns curadores e às suas curas. A resposta de Kardec foi publicada em seguida ao artigo. A questão dos milagres, disse o Codificador, já fora tratada inúmeras vezes em suas obras, bem como no número de maio de 1867 da Revista, do qual transcreveu breve trecho. (Págs. 378 a 384.)

189. Concluindo suas explicações, diz Kardec: “Se o autor se der ao trabalho de estudar o Espiritismo, contra o qual constatamos com prazer que ele não tem uma preconcebida ideia de negação, nele encontrará a resposta às dúvidas que parecem exprimir algumas partes de seu artigo, referentes à maneira de encarar certas coisas, salvo, contudo, no que concerne à ciência das concordâncias numéricas, da qual jamais nos ocupamos, e sobre a qual, por conseguinte, não poderíamos ter opinião formada”. (Pág. 384.)

190. O Espírito daquele que foi conhecido na Terra como o Abade de Saint-Pierre, que faleceu em 1743 e a cujo nome ficará sempre ligada a lembrança do seu projeto de paz perpétua, comunicou-se a 17 de maio na Sociedade Espírita de Paris. De referida comunicação extraímos os pontos que se seguem: I – Em todas as épocas Espíritos têm vindo encarnar-se na Terra, para ajudar o avanço de seus irmãos. II – Tendo sido um desses Espíritos, coube-lhe o dever de procurar persuadir os homens de que virá uma época em que as paixões que engendram a guerra darão lugar à concórdia. III – Não há um só espírita que duvide que aquilo que se chama uma utopia, um sonho do Abade de Saint-Pierre, mais tarde não se tornará uma realidade. IV – Ficai bem persuadidos que esta paz descerá, sim, sobre a Terra, embora antes disso graves acontecimentos devam realizar-se neste mundo. (Págs. 384 a 386.)

191. O número de dezembro de 1867 se encerra com duas comunicações espíritas recebidas em Paris e assinadas, respectivamente, por François Arago e Moki. (Págs. 386 a 390.)

192. Na primeira, intitulada Erros científicos, o Espírito de Arago diz que, do mesmo modo que o corpo tem os seus órgãos de locomoção, de nutrição e de respiração, o Espírito tem faculdades variadas, que se relacionam respectivamente com cada situação particular de seu ser. Se o corpo tem a sua infância, o Espírito possui faculdades que devem, como tudo o que existe, passar da infância à juventude e da juventude à idade madura. Aos que negam o Espírito, como outrora negavam o movimento da Terra, digamos: o que é não pode ficar eternamente oculto; a luz não pode tornar-se sombra; a verdade não pode tornar-se erro; as trevas se desfazem ante a aurora. (Pág. 386 a 388.)

193. Na derradeira mensagem de 1867, o Espírito de Moki diz que o mundo está em crise, a inquietude faz morada nos corações humanos. Assevera o instrutor espiritual: “O que falta às populações inquietas, às inteligências em apuro, é o senso moral, atacado, macerado, semidestruído pela incredulidade, pelo positivismo, pelo materialismo. Acreditam no nada, mas o temem; sentem-se no pórtico deste nada, mas tremem!...” (Págs. 388 e 389.)

194. Moki, então, propõe: “Os demolidores fizeram a sua obra, o terreno está limpo. Construí, então, com rapidez, para que a geração atual não fique mais tempo sem abrigo!”. “À obra, pois. Construí cada vez mais depressa. Acolhei o viajante que vem a vós, mas ide também procurar e tentai trazer a vós aquele que se afasta sem bater à vossa porta, porque Deus sabe a quantos sofrimentos ele estaria exposto antes de encontrar o menor retiro capaz de o preservar do alcance do flagelo.” (Págs. 389 e 390.)

 

Respostas às questões propostas

 

A. Benjamin Franklin acreditava realmente na reencarnação?

Sim. Em carta escrita a Mrs. Jone Mecone em dezembro de 1770, Franklin atesta sua crença na preexistência da alma e na reencarnação, crença que seria por ele imortalizada no famoso epitáfio de sua autoria, que a Revista novamente transcreveu. Publicado inicialmente na Revista de agosto de 1865, o epitáfio de Franklin é uma prova indiscutível de sua convicção acerca da pluralidade das existências. (Revista Espírita de 1867, pág. 367.)

B. Que observações fez Kardec a respeito de Joana d´Arc?

Kardec disse que Joana não foi apenas uma das grandes figuras da França, mas um imenso problema e, ao mesmo tempo, um protesto vivo contra a incredulidade. Ela só não constitui problema nem mistério para os espíritas, que entendem muito bem que ela foi um exemplo eminente de pessoa dotada de quase todas as faculdades mediúnicas, cujos efeitos, como uma porção de outros fenômenos, se explicam pelos princípios da doutrina, sem necessidade de se recorrer ao sobrenatural. (Obra citada, pp. 368 e 369.)

C. Quando e por quem foi canonizada a heroína e médium francesa?

Condenada à morte em 1431, como “mentirosa, perniciosa, enganadora do povo, adivinha, blasfemadora de Deus, descrente na fé de Jesus Cristo, gabola, idólatra, cruel, dissoluta, invocadora dos diabos, sistemática e herética”, Joana d´Arc foi reabilitada em 1456 pelo papa Calixto III, quando, por meio de uma sentença solene, foi declarado que ela morreu mártir para a defesa de sua religião, de sua pátria e de seu rei. A canonização não veio nessa ocasião, embora o papa o quisesse; sua coragem não foi tão longe. Pierre Cauchon, bispo de Beauvais, um dos juízes de Joana, morreu subitamente em 1443, fazendo a barba, e foi excomungado, sendo seu corpo atirado num monturo. (Obra citada, pp. 375 e 376.)

 

 

Observação:

Para acessar a Parte 13 deste estudo, publicada na semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2025/02/revista-espirita-de-1867-allan-kardec_0705267873.html

 

 

 

 

 

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terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

 



O grande encontro

 

CÍNTHIA CORTEGOSO

cinthiacortegoso@gmail.com

 

Talvez não nos damos conta de que o encontro desejado deva ser conosco, a busca incessante simplesmente é a por nós mesmos. Conhecermo-nos e, então, compreenderemos melhor a vida, pois somos seres universais e não simples quimeras. Somos centelhas divinas e tudo está em nós também. Não há motivo para procurar fora o que já existe dentro, basta apenas o autoencontro para começar a sentir o início da verdadeira felicidade. Quando se cuida demais só do quintal e se relaxa com o interior, a casa deixa de ser lar.

E conhecendo os próprios gostos, ouvindo a própria voz, observando os pensamentos e sentimentos, e esforçando-nos para o crescimento, sem dúvida, seremos apresentados a nós mesmos com predicativos muito interessantes, e pensarmos que sempre existimos, era necessária apenas a nossa autoconsideração. Somos tão ricos em infinitos quesitos, podemos realizar ações maravilhosas e bondosas, ou não. Dependerá o tempo todo de nossas escolhas. Em vez de admirarmos somente o externo, tão mais apropriado e valoroso passarmos a considerar antes o nosso interior e conheceremos a pessoa a qual desejamos encontrar.

Se Deus nos criou, já é prova bastante contundente de que somos algo a mais... eternos. E a busca por alguém ou algo que nos complete deixará de ser enfatizada e precisa, pois somos a conexão direta com o Criador. E se, mesmo assim, insistirmos em procurar que seja apenas para encontrar, antes de tudo, a luz divina, se caso ainda não nos reconhecemos como filhos de Deus.

Somos extensão da beleza e da bondade, da perfeição e da eternidade, depende sempre de nós. À medida que compreendemos o nosso valor, a vida se aclara e o caminho se torna mais bonito e apaziguador, olhamos mais para o céu e percebemos, com alegria, o voo dos lindos pássaros, o azul, o branco calmo das nuvens, sentimos o vento, e compreendemos o início do sentido de viver.

Podemos procurar em lugares inusitados, em situações inimagináveis, em todos os momentos, no entanto fora não haverá nada que nos preencherá; tudo do que precisamos já está em nós. E quanto mais buscamos externamente, mais vazio o nosso coração se sentirá.

Quando nos encontrarmos, a luz iluminará os nossos dias em todo lugar, porque somos os nossos próprios eternos e inseparáveis companheiros. E tudo terá mais graça e brilho.

O grande encontro é aceitar-se, amar-se e reconhecer tudo o que já viveu e o que ainda viverá e poderá conquistar com a renovação do olhar para a vida.

 

Visite o blog Conto, crônica, poesia… minha literatura: http://contoecronica.wordpress.com/

 

 

 

 


 

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segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

 



Lição paternal

 

Irmão X (Espírito)

 

Questionávamos, em torno da fatalidade e do livre-arbítrio, quando o velho Samuel tomou a palavra e contou, sereno:

– Hanina ben Hazan, um israelita imensamente rico, vivia em Jope, cercado de consideração pela nobreza de sua conduta. Embora senhoreasse extensos pomares e não obstante a enorme riqueza que granjeara no mercado de peles, caracterizava-se pela extrema simplicidade com que pautava todos os atos da vida. Estimado na posição de filósofo, reunia, no próprio lar, semanalmente, todos os estudiosos dos Escritos Sagrados que se propusessem debater os problemas do povo, a fim de auxiliar os concidadãos com mais segurança.

Certa noite, laboriosa contenda irrompeu no recinto doméstico. O rabi Johanan, visitante ilustre, declarara que, diante do Todo-Poderoso, todas as consciências são livres, ao que Boaz, filho único de Hanina, replicara, desabrido, que todas as criaturas são obrigadas a executar, matematicamente, a vontade de Deus.

Azedou-se a polêmica. A assembleia dividida mostrava maioria absoluta, ao lado de Johanan, enquanto Boaz, no ímpeto da força juvenil, após justificar-se, furioso, apresentou a dúvida ao exame paterno.

O anfitrião, porém, conhecido pela grande prudência, conquanto lastimasse o desrespeito do filho para com o sábio que hospedava, pediu com delicadeza fosse a questão adiada para o mês seguinte, de vez que desejava educar o herdeiro querido sem violência, e o conselho familiar foi encerrado em amistosas manifestações de alegria.

No dia imediato, Hanina chamou o filho que atingira a maioridade e confiou-lhe duas bolsas recheadas de ouro para entregar em Jerusalém, com vistas à realização de certo negócio. Boaz deveria obedecer, implicitamente, todas as instruções e, ainda mesmo que tivesse qualquer plano, suposto favorável ao empreendimento, caber-lhe-ia silenciar ante os mercadores a quem o dinheiro se destinava.

O moço partiu com agenda rigorosa. Dia da saída e dia de chegada. Horários para reger-se na Cidade Santa. Moedas que poderia gastar em proveito próprio.

O jovem cumpriu as determinações e retornou, desenxabido, mas o genitor, articulando tarefa diferente, incumbiu-o de vender larga partida de lã a diversos comerciantes que se dirigiam para Haifa, marcando, porém, os preços que lhe pareciam convenientes e proibindo-lhe qualquer ingerência no assunto.

Depois de satisfazer as ordenações, o rapaz regressou, patenteando indisfarçável desalento.

Hanina, entretanto, buscou-lhe os préstimos na consecução de outra empresa.

Dessa vez, doava-lhe expressivo tesouro em peças de prata, que passariam a pertencer-lhe, sob a condição de sujeitá-las ao governo de poderoso usurário seu amigo, em cuja guarda semelhantes recursos permaneceriam pelo prazo de dez anos, findo o qual as preciosidades seriam restituídas, acompanhadas de rendimento compensador.

O filho obedeceu, evidentemente contrariado, e, ao voltar, o pai cedeu-lhe um campo de vastas dimensões, com a ordem expressa de cultivar o trigo, estabelecendo prévias normas para os serviços da sementeira e da colheita, com instruções que ao jovem competia observar, rigidamente.

Abraçando, contudo, as novas obrigações, o rapaz clamou, triste:

– Oh! Meu pai, há muito que vos sirvo, colocando empenho e sinceridade em tudo o que a vossa bondade me ordena fazer; entretanto, agora que me sinto homem feito, rogo permissão para considerar que a vossa autoridade, apesar de generosa, me impede a edificação do próprio destino, conforme a visão que o mundo me oferta. Algemado aos vossos desígnios, por três vezes nos últimos vinte dias, vi afastarem-se de mim valiosas oportunidades de melhorar a própria sorte. Sem qualquer tentativa de furto, eu poderia ter sugerido algumas alterações aos vossos representantes em Jerusalém, conseguindo excelente margem de lucro para os nossos negócios; no entanto, os vossos avisos eram irrevogáveis e não tive outro recurso senão inclinar-me à submissão. Nos barcos que demandavam os armazéns de Haifa, teria facilmente obtido pequena fortuna, sem dilapidar os interesses do próximo, ao fornecer a lã que me confiastes; todavia, era imperioso satisfazer-vos as injunções. Anteontem, passastes às minhas mãos substancioso patrimônio que poderia claramente favorecer-me a segurança porvindoura; contudo, ao invés de exercitar-me as faculdades no trabalho de minha própria manutenção, exigistes que a dádiva fosse depositada em meu nome, para somente beneficiar-me daqui a dez anos, quando não sei se viverei neste mundo até amanhã!... Hoje, mandais que eu lance o trigo numa terra que julgo mais adequada ao sustento da vinha. Ah! Meu pai, por que sonegais ao vosso filho o direito das próprias decisões?

O velho Hanina, porém, satisfeito e comovido, enlaçou-o, ternamente, e ponderou:

– Tens razão, filho meu... Compreendes, agora, a nossa liberdade, à frente do Pai Justo? O Criador concede às criaturas todos os bens da Criação, sem constranger-lhes o exercício da livre escolha...

E, fitando o moço tomado de júbilo, concluiu:

– Cada homem é independente, na própria alma, a fim de eleger o próprio caminho.

O velho Samuel fixou em nós outros o olhar penetrante e calmo e rematou:

– O tema não comporta discussões. Deus nos concede a todos a fazenda valiosa da vida; entretanto, cada um de nós é responsável pela sua própria consciência, no que sente, pensa, fala e realiza, perante a Lei.

E, abençoando-nos com ameno gesto de despedida, o sábio deixou-nos mergulhados em fundo silêncio, com a significativa história para remoer e pensar.

 

Do livro Relatos da Vida, obra psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.

 

 

 

 

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domingo, 16 de fevereiro de 2025

 



   Com que aparência as pessoas se apresentam após a morte?

 

ASTOLFO O. DE OLIVEIRA FILHO

aoofilho@gmail.com

 

A pedido de um leitor, examinaremos hoje o que os ensinamentos espíritas nos informam a respeito da morfologia do corpo espiritual, com relação à aparência com que os Espíritos, após a desencarnação, se apresentam.

Duas obras espíritas que todos respeitamos trazem informações específicas sobre o assunto.

A primeira é o clássico A Reencarnação, conforme tradução feita por Carlos Imbassahy, publicada pela FEB. Nele, Gabriel Delanne, que o escreveu, fornece-nos sobre o tema as seguintes informações:

1) Nota-se pelas fotografias dos fantasmas – ou seja, dos Espíritos libertos do corpo físico – que eles têm formas reais e possuem, durante a materialização, todos os caracteres dos seres vivos.

2) William Crookes, referindo-se às materializações de Katie King, afirma que a aparição possui coração e pulmões, embora o mecanismo fisiológico de Katie King fosse diferente do da médium, Srta. Florence Cook.

3) Charles Richet comprovou que a forma materializada possui circulação, calor próprio e músculos, e exala ácido carbônico.

4) O corpo fluídico é semelhante, em todos os pontos, e mesmo anatomicamente, idêntico ao corpo físico. É um ser de três dimensões, com morfologia terrestre. (A Reencarnação, págs. 44 a 55.)

A outra obra, de confecção mais recente, é Evolução em dois Mundos, de André Luiz, psicografada pelos médiuns Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira. No cap. IV da 2ª parte dessa obra, André Luiz oferece-nos as informações adiante resumidas:

1) As linhas morfológicas das entidades desencarnadas, no conjunto social a que se integram, são comumente aquelas que trouxeram do mundo, a evoluírem, contudo, constantemente para melhor apresentação, toda vez que esse conjunto social se demore em esfera de sentimentos elevados.

2) A forma individual em si obedece ao reflexo mental dominante, notadamente no que se reporta ao sexo, mantendo-se a criatura com os distintivos psicossomáticos de homem ou de mulher, segundo a vida íntima, através da qual se mostra com qualidades espirituais acentuadamente ativas ou passivas.

3) Fácil observar, pois, que a desencarnação libera todos os Espíritos de feição masculina ou feminina que estejam na reencarnação em condição inversiva atendendo a provação necessária ou a tarefa específica, porquanto, fora do arcabouço físico, a mente se exterioriza no veículo espiritual com admirável precisão de controle espontâneo sobre as células sutis que o constituem.

4) Se o progresso mental não é positivamente acentuado, mantém o Espírito, nos planos inferiores, por tempo indefinível, a plástica que lhe era própria entre os homens, sendo certo que, nos planos relativamente superiores, sofre processos de metamorfose, mais lentos ou mais rápidos, conforme suas disposições íntimas. (Evolução em dois Mundos, 2ª parte, cap. IV, pp. 176 e 177.)

Concluindo, é bom lembrar que o assunto não foi estranho a Allan Kardec, conforme podemos conferir no artigo intitulado “As mulheres têm alma?”, publicado na Revista Espírita de janeiro de 1866.

Segundo o codificador da doutrina espírita, a influência que o Espírito encarnado sofre do organismo não se apaga imediatamente após a destruição do invólucro material, assim como não perdemos instantaneamente os gostos e hábitos terrenos.

Pode acontecer que determinado Espírito percorra uma série de existências no mesmo sexo, o que faz que durante muito tempo possa conservar na erraticidade – ou seja, no plano espiritual – o caráter de homem ou de mulher, cuja marca nele ficou impressa.

Se essa influência se repercute da vida corporal à vida espiritual, o fato se dá também quando o Espírito passa da vida espiritual para a corporal.

Em uma nova encarnação trará, portanto, o caráter e as inclinações que tinha como Espírito. Mudando de sexo na nova existência corpórea que deverá cumprir, poderá conservar os gostos, as inclinações e o caráter inerente ao sexo que acabou de deixar.

Assim se explicam certas anomalias aparentes, notadas no caráter de certos homens e de certas mulheres.

 


 

 

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