quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Pérolas literárias (171)



Filho que não nasceu

 José Guedes

Fui trazido ao teu colo e sussurro, baixinho:
– “Mãe, eu serei na carne o sonho de teu sonho!...”
Depois, em prece ardente, em ti meus olhos ponho,
Pássaro fatigado ante a úsnea do ninho.(1)

Abraço-te. És comigo a esperança e o caminho...
Em seguida – oh! irrisão! –, eis que, num caos medonho,
Expulsas-me a veneno, e, bruto, me empeçonho,
Serpe oculta a ferir-te em silêncio escarninho.

Já me dispunha a dar o golpe extremo, quando
Surge alguém que me obriga a deixar-te dançando
Em formoso salão onde o prazer fulgura.

Passa o tempo. Hoje volto... É o amor que em mim arde.
Mas encontro-te, oh! mãe, a gemer, triste e tarde,
Sombra que foi mulher, enjaulada à loucura...


(1) Úsnea: gênero de liquens da família das usneáceas, dotadas de talos livremente ramificados; qualquer espécie desse gênero, como, p. ex., a Usnea barbata, popularmente denominada barba-de-velho, que cresce em árvores. 


Do livro Antologia dos Imortais, obra psicografada pelos médiuns Waldo Vieira e Francisco Cândido Xavier.



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