terça-feira, 2 de julho de 2013

Uma história para minhas netas

ARTHUR BERNARDES DE OLIVEIRA
tucabernardes@gmail.com
De Guarani, MG

Meu pai ficou viúvo aos quarenta e dois anos de idade. Isso, no dia 8 de maio de 1950. Minha mãe, ao partir, levava no ventre aquela que seria sua sétima filha, e deixava onze filhos para meu pai, sozinho, acabar de criar.
Não foi difícil, no entanto. A primogênita, Lila, vinte e dois anos, já estava casada.  O primeiro filho homem, Amauri, vinte e um anos, profissional, cruzava, de caminhão,  as estradas desse imenso país. Eu, dezenove, tentava concluir o curso clássico, internado no Colégio de Cataguases. Edna, 17, e Marli, 15, assumiam as tarefas da casa, ajudadas pelas irmãs menores (Anita, Eunice e Icléa) que começavam a aprender como arrumar uma casa. Ayres, 12 anos, estava começando seus estudos em Cataguases. Astolfo Filho, 5 anos, e Ali, 3 anos, só queriam saber de brincar.
Em Astolfo Dutra, onde nascemos e nos criamos, não havia ginásio nem escola normal. Quem quisesse ou pudesse ir à frente tinha que buscar Ubá, Cataguases ou Leopoldina. Em 1939 ou 1940 apareceu por lá um  tal tenente Enoch que montou uma escolinha para dar noções de contabilidade a jovens que quisessem crescer. Essa escolinha teve papel importante na vida da cidade. Embora não reconhecida pela legislação que regulamentava o ensino público e privado no País, preparou muito bem alguns jovens filhos da terra que vieram a se tornar personalidades importantes na administração pública brasileira.
Minhas irmãs, por isso mesmo, não conseguiram fazer nenhum curso. Somente mais tarde, mas muito mais tarde mesmo, é que algumas conseguiram diploma universitário. Os homens também. Muito tempo depois é que alguns deles conseguiram, como as irmãs, passar por alguma universidade e concluir algum curso.
Minhas irmãs não aprenderam na escola. Mas aprenderam na vida. Desde cedo assimilaram a arte da tesoura, da agulha e do fogão. A mãe, em sua curta passagem por aqui, ensinou às mais velhas e essas repassaram o que aprenderam às mais novas. E como tem valido a todas a experiência que colheram!
Apenas um exemplo: Anita, a irmã do meio, casou-se muito bem com um rapaz muito sério e muito trabalhador. Ele, comerciante respeitado e dinâmico, acumulava sucessos na carreira que escolhera. Tiveram filhos. Cinco: três homens e duas mulheres. Mas o comércio costuma preparar surpresas. E o marido da Anita foi colhido por uma dessas surpresas. Quebrou. Perdeu tudo: a casa, o nome, a iniciativa, a vontade de viver.  Eis que Anita assume o seu papel.  E vai ao fogão. E faz salgados pra fora. E assume compromissos nessa área. Responde por bufês em festas de casamento, batizados, formaturas. A freguesia se multiplica. E Anita recupera a casa, o crédito, a disposição do marido. E patrocina o estudo dos filhos. E todos se formam. E todos a ajudam nas tarefas da cozinha. E o marido se incorpora à tarefa. E a vida se renova!
Claro! Eu espero que nenhuma de vocês tenha que passar pelos problemas que a minha irmã enfrentou. Peço todos os dias a Deus que lhes dê um futuro sempre risonho. Saúde, bem-estar, boa situação financeira e muita disposição para o amor. Mas peço também que, mesmo que vocês dele nunca venham a precisar, Deus lhes conceda o dom do conhecimento, sobretudo o conhecimento das coisas simples da vida, para que vocês, em qualquer tempo, sejam quais forem as condições que a vida lhes apresentar, estejam preparadas para vencer. São os votos de quem ama, com paixão, todas vocês. 

Este texto foi escrito pelo autor – meu irmão – quando suas netas eram ainda crianças, mas seu conteúdo é atemporal e constitui um belo registro de coisas importantes na vida de todos nós que nele figuramos. (Astolfo O. de Oliveira Filho)
            

           

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