Um leitor pergunta-nos como a doutrina espírita vê o episódio que,
segundo o relato bíblico, teria causado a expulsão de Adão e Eva do paraíso e a
punição de todos os seus descendentes.
Com efeito, se a falta
cometida pelo casal consistiu realmente em ter comido um simples fruto, não
poderia, dada a sua natureza quase pueril, justificar o rigor com que foi
punida.
Em sua
última obra – A Gênese, cap. XII – Allan Kardec analisou essa questão
que é, sem dúvida, em face de suas consequências, muito importante para os
seguidores do Cristianismo. O que veremos nestas explicações é baseado, em
linhas gerais, no texto escrito pelo Codificador do Espiritismo.
Em
primeiro lugar, registre-se que nem o crime cometido por Caim foi tratado tão
severamente pelo Criador, o que dá ao episódio uma gravidade bem maior que, no
entanto, nenhum teólogo até hoje foi capaz de explicar, porquanto, apegados à
letra, os estudiosos da Bíblia têm girado dentro de um mesmo círculo vicioso.
Segundo
os ensinos trazidos pelo Espiritismo, sabe-se hoje que a falta de Adão e Eva
não foi um ato isolado, pessoal, de um indivíduo, mas exprime, sob um único
fato alegórico, o conjunto das prevaricações de que a Humanidade da Terra,
ainda imperfeita, pode tornar-se culpada, as quais se resumem nisto: infração
da lei de Deus. A falta do primeiro homem, simbolizando este a Humanidade, tem,
assim, por símbolo um ato de desobediência.
Ressalte-se,
porém, que se as almas de Adão e Eva tivessem vindo do nada, como ensina a teologia
católica, haviam eles de ser bisonhos em todas as coisas e, portanto,
ignorariam o que é morrer, porque jamais haviam assistido à morte de uma
pessoa, e não entenderiam o que significava “parir com dor”, visto que, tendo
acabado de surgir para a vida, Eva jamais tivera filhos.
Contudo,
o que constitui para a Teologia um beco sem saída o Espiritismo explica sem
dificuldade, e de maneira racional, pela anterioridade da alma e pela
pluralidade das existências, lei sem a qual tudo é mistério e anomalia na vida
do homem.
Admitamos,
pois, que Adão e Eva já tivessem vivido e tudo se justifica: Deus não lhes fala
como a crianças, mas como a seres em condições de o compreender e que, de fato,
o compreendem, prova evidente de que ambos traziam aquisições anteriormente
realizadas. Não nos esqueçamos de que, segundo a Bíblia, Abel e Caim
tinham habilidades especiais, tanto que, ao sair do convívio dos pais, Caim
casou-se e construiu uma cidade, em homenagem a seu primeiro filho.
Consideremos,
ainda, que Adão e Eva tenham vivido em um mundo mais adiantado e menos material
do que o nosso, onde o trabalho do Espírito substituía o do corpo; que, por se
haverem rebelado contra a lei de Deus, figurada na desobediência, tenham sido
afastados de lá e exilados, por punição, para a Terra, onde o homem, pela
natureza do globo, é constrangido a um trabalho corporal, e reconheceremos que
a Deus assistia razão para lhes dizer: «No mundo onde, daqui em diante, ides
viver, cultivareis a terra e dela tirareis o alimento com o suor da vossa
fronte» e, à mulher: «Parirás com dor», porque tal é a condição do mundo em que
eles teriam agora de viver.
O
paraíso terrestre, cujos vestígios têm sido inutilmente procurados na Terra,
era, por conseguinte, a figura do mundo ditoso, onde vivera Adão, ou, antes, o
grupo de Espíritos que ele personifica. A expulsão do paraíso marca o momento
em que esses Espíritos vieram reencarnar entre os habitantes do mundo
terráqueo, um fato que anos depois seria explicado, em minúcias, por Emmanuel
na obra A Caminho da Luz, psicografada pelo médium Chico Xavier.
A obra A Caminho da Luz foi objeto de estudo
metódico e sequencial nas edições 194
a 207 da revista O
Consolador. Eis o link que
permite ao leitor acessar a primeira parte do mencionado estudo, publicada na
edição 194: http://www.oconsolador.com.br/ano4/194/classicosdoespiritismo.html
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