Comunicações
mediúnicas entre vivos
Ernesto Bozzano
Parte 11
Damos prosseguimento ao estudo do clássico Comunicações mediúnicas entre vivos, de autoria de Ernesto Bozzano, traduzido
para o idioma português por J. Herculano Pires e publicado pela Edicel.
Esperamos que este estudo sirva para o leitor como uma
forma de iniciação aos chamados Clássicos do Espiritismo.
Cada parte do estudo compõe-se de:
a) questões preliminares;
b) texto para leitura.
As respostas às questões propostas encontram-se no final do
texto indicado para leitura.
Este estudo será publicado sempre às sextas-feiras.
Questões preliminares
A. Nas comunicações mediúnicas que manteve com indivíduos
encarnados, os chamados vivos, qual o fato que mais surpreendeu William
Stead?
B. O estado de vigília, nesse tipo de fenômeno, é um
empecilho à comunicação entre vivos?
C. Qual é a outra conclusão, a respeito de como ocorre o
fenômeno, fortalecida pelos fatos ocorridos com William Stead?
Texto para leitura
153. Atendendo à sugestão de Júlia, William Stead pôs sua
mão ao dispor de amigos que residiam a diversas distâncias e notou que quase
todos eles se achavam em condições de se comunicarem, embora variasse muito a
capacidade de manifestação. Alguns escreviam logo correntemente, com as suas
próprias características de estilo, de forma, de caligrafia, desde as primeiras
palavras, e prosseguiam desembaraçadamente como se estivessem escrevendo uma
carta normal. Confiavam-lhe seus pensamentos, informavam-no que tinham intenção
de virem consultá-lo ou diziam como haviam passado o dia. (2ª Categoria:
Mensagens mediúnicas entre vivos e à distância. Subgrupo C)
154. Em tais conversações, já por si mesmas tão
assombrosas, o que mais surpreendeu Stead foi a inconcebível franqueza de
alguns amigos seus, dos quais ele conhecia a sensibilidade, a moderação e a
reserva de que eram dotados. Ele estava bem certo de que nunca lhe teriam
confiado certos segredos ou certas dificuldades financeiras e, entretanto, lhe
declaravam, com toda a sinceridade, que se achavam em aperturas econômicas ou
confessavam, sem disfarces ou reservas, outras coisas íntimas, de várias
naturezas. (2ª Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à distância.
Subgrupo C)
155. Tal circunstância lhe pareceu tão séria, do ponto de
vista da convivência social, que um dia pediu explicações a Júlia, nos
seguintes termos: “Os resultados que estou obtendo no meu novo campo de
investigações estão me preocupando seriamente, pois me parece que não haveria
mais segredos neste mundo se os outros procedessem como eu”, ao que ela
respondeu: “Oh, não! Estás exagerando”, pelo que ele objetou: “Então como se
explica que, por meio de minha mão, um amigo me revela segredos que pelas vias
normais nunca confessaria?” (2ª Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à
distância. Subgrupo C)
156. Ela deu-lhe uma explicação em que nunca ele havia
pensado. Disse ela: “Vossa personalidade real, ou espiritual, não confiará
nunca a ninguém, por via mediúnica, coisas que considera dever conservar
secretas e, se algumas vezes confia incidentes mais ou menos íntimos, faz isto
em plena consciência. A diferença é que a vossa personalidade real, ou
espiritual, pensa e julga, com relação ao valor intrínseco de um fato, de modo
muito diferente de vossa personalidade normal”. (2ª Categoria: Mensagens
mediúnicas entre vivos e à distância. Subgrupo C)
157. Stead perguntou-lhe: “Que queres dizer com a expressão
personalidade real, ou espiritual?” Respondeu: “Vossa personalidade real, ou
espiritual, o que chamais o vosso eu, inspeciona tanto a vossa mente consciente
quanto a subconsciente, empregando a seu gosto uma e outra. Vossa mente
consciente serve-se das faculdades sensoriais para se comunicar com os seus
semelhantes quando estes se acham ao alcance das mesmas faculdades, que,
portanto, são muito rudimentares em sua potencialidade. Não se dá o mesmo com
as faculdades sensoriais da mente subconsciente, que são já um instrumento de
comunicação muito mais sutil, refinado e eficaz, porquanto permanecem sempre
como instrumento a serviço de vossa personalidade espiritual, que, quando
deseja comunicar-se com alguma pessoa a distância, serve-se da mente
subconsciente. Esta, porém, não se dá à tarefa absurda de revelar a outrem o
que realmente deve ser mantido em segredo, tanto como não o faria, normalmente,
pela conversação. Em suma, vossa personalidade real, ou espiritual, é senhora
absoluta de seus instrumentos de comunicação.” (2ª Categoria: Mensagens
mediúnicas entre vivos e à distância. Subgrupo C)
158. Stead indagou então: “Como tais comunicações são
produzidas?” Ela assim respondeu: “Como? Os Espíritos do universo inteiro
acham-se em contato entre si, de modo que podeis falar com a personalidade
espiritual de qualquer pessoa no mundo, sem limite algum de distância, com a
condição única de tê-la conhecido pessoalmente. Se podeis falar com uma pessoa
que encontrardes na rua, pelo fato de lá a conhecerdes, podereis, pela mesma
razão, conversar com ela em qualquer parte do mundo em que ela se achar,
convidando-a a escrever pela vossa mão.” (2ª Categoria: Mensagens mediúnicas
entre vivos e à distância. Subgrupo C)
159. Apesar dessa explicação, William Stead disse que não
conseguia entrar em relações mediúnicas com todos os seus amigos e encontrava
grande diferença no valor intrínseco de suas comunicações. Assim, por exemplo,
há alguns que lhe davam informações pessoais tão extraordinariamente exatas
que, em cem afirmativas, só encontrava uma única inexata. Há outros, ao
contrário, que se manifestam com as suas características pessoais e firmam as
mensagens com o seu nome e, todavia, transmitem informações completamente falsas.
(2ª Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à distância. Subgrupo C)
160. De qualquer modo, a maioria deles demonstra a máxima
exatidão ao transmitir as suas notícias. Em se tratando de notícias, nota-se um
fato curioso: se ele pedia a um amigo de Glasgow notícias de sua defluxão(1)
facial, respondia ele com escrupulosa exatidão, ou que está piorando, ou que os
tumores estão abertos, e que seu rosto está coberto com um cataplasma, e
subscreve as mensagens com a sua própria assinatura. Mas quando encontra tal
amigo em carne e osso e lhe mostra a sua escrita, ele absolutamente não se
recorda de ter conversado com Stead. (2ª Categoria: Mensagens mediúnicas entre
vivos e à distância. Subgrupo C)
161. Pediu a Júlia esclarecimentos nesse sentido, formulando
nos seguintes termos a pergunta: “Como se explica que, quando pergunto ao meu
amigo sobre a sua doença facial, ele responde dando informação exata a respeito
do seu estado e, contudo, não se lembra de ter-se comunicado comigo? Se a nossa
personalidade espiritual não transmitisse nunca informações em plena
consciência de o fazer, como se explica que os amigos me fornecem informações
que ignoram ter fornecido?” Respondeu-me ela: “Quando vos dirigis
mediunicamente a um vosso amigo, a sua personalidade espiritual responde,
empregando as faculdades mentais subconscientes e não as faculdades conscientes
ou cerebrais e, naturalmente, não toma o cuidado de comunicar à mente
consciente ou cerebral que deu essa informação servindo-se, para isso, das
faculdades mentais subconscientes porque, absolutamente, não é necessário
fazê-lo. Se achasse útil, então o amigo se recordaria.” (Light), 1893, págs.
134-143). (2ª Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à distância.
Subgrupo C)
162. Após as informações extraídas da interessante
conferência de William Stead, Bozzano relata, no item seguinte, um incidente
ocorrido com William Stead no começo das suas novas experiências. (2ª
Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à distância. Subgrupo C)
163. O distante paciente escolhido foi uma distinta
escritora que colabora na Review of Reviews e que em pouco tempo se
tornou um dos melhores “correspondentes espirituais” de Stead. Ela correspondia
imediatamente aos convites espirituais deste último, em qualquer lugar em que
se achasse, iniciando conversações interessantíssimas, porque exuberantes em
provas de identificação pessoal:
[Como permanecesse eu um tanto incrédulo, comecei a fazer
experiências pensando numa moça de Londres, que escolhi porque existiam entre mim
e ela laços de simpatia recíproca, e a prova produziu maravilhosos resultados.
Minha amiga não encontrava dificuldade alguma em servir-se da minha mão para
dar as suas notícias, expressando-se com o seu humor do momento.
Uma vez, enquanto a minha amiga, que aqui chamarei de Srta.
Summers, estava ditando uma mensagem, eu a interrompi bruscamente,
perguntando-lhe: “É você mesma que está escrevendo com a minha mão, ou sou eu
que estou conversando com a minha subconsciência?” Minha mão escreveu:
“Provar-lhe-ei que sou eu realmente quem está escrevendo. Neste momento estou
sentada diante da mesa e tenho nas mãos um objeto que amanhã levarei ao seu
escritório. Será um pequeno presente que você terá de aceitar de mim. É a
imagem de um velho cardo.” Interrompi: “Como é mesmo? Um velho cardo?” – “Sim,
exatamente um velho cardo. Representa uma grata recordação de minha vida e é
por isso mesmo que tenho muito carinho por ele. Amanhã eu o levarei à sua casa
e lhe explicarei tudo melhor, de viva voz. Tenho a pretensão de pensar que o
aceitará.”
No dia seguinte, minha amiga veio ao meu escritório e eu
lhe perguntei logo se me havia trazido um pequeno presente. Respondeu que não,
que havia pensado em trazer, mas havia acabado por deixá-lo em casa.
Perguntei-lhe em que consistia e ela respondeu que se tratava de um presente
tão absurdo que não desejava nomeá-lo. Eu insisti e finalmente ela explicou que
se tratava de um pedaço de sabão! Fiquei profundamente decepcionado com o
aparente insucesso e lho confessei. Ela, porém, replicou com surpresa: “É
deveras extraordinário! Tudo sucedeu como está escrito nesta folha de papel e
trata-se mesmo de um cardo, e mais, de um cardo velho, que está impresso,
porém, num pedaço de papel. Amanhã o trarei. O cardo representa algo importante
nas recordações de minha vida.” E então narrou o incidente pessoal relativo ao
cardo. No dia seguinte levou-me o pedaço de sabão sobre o qual se distinguia,
efetivamente impressa, a imagem de um velho cardo.] (Vol. IX, pág. 53, dos Proceedings
of the S. P. R.) (2ª Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à
distância. Subgrupo C)
164. O prof. Myers confirma o episódio nos seguintes
termos: “Foi-me narrado o incidente pessoal ligado à imagem do velho cardo,
cuja significação completa estava na imagem sobre o pedaço de sabão. A Srta.
Summers havia pensado em levá-lo ao Sr. Stead antes que a mão deste último
houvesse escrito o informe e, provavelmente, pensou o mesmo no momento preciso
em que Stead escrevia”. (2ª Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à
distância. Subgrupo C)
165. No caso exposto, o incidente da identificação pessoal
destinado a provar a Stead que não se tratava de uma mistificação da
subconsciência dele, e sim de uma conversa real com a personalidade espiritual
da Srta. Summers, alcançou bem a sua finalidade, visto que o presente prometido
a título de prova em tal sentido consistia numa coisa de natureza tão
excepcional, que não pode ser explicada pela hipótese das coincidências
fortuitas. É, de fato, claro, que uma imagem de “cardo velho” não é objeto que
se costuma dar de presente. (2ª Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à
distância. Subgrupo C)
166. Observa-se, além disso, que no incidente em apreço,
como em outros, sucedidos com a mesma sensitiva, esta parece ter entrado em
relação mediúnica com Stead durante o estado de vigília, o que não significa,
porém, que o incidente se tenha desenvolvido precisamente assim, antes de tudo,
porque em nenhuma das experiências em exame houve testemunhas que pudessem
certificar-se de que a sensitiva não tivesse cochilado e, depois, porque, mesmo
que tais testemunhas existissem, não teriam grande valor teórico, visto que uma
pessoa pode muito bem passar para um estado de sonambulismo em vigília sem que
os presentes o percebam. (2ª Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à
distância. Subgrupo C)
167. O principal ensino teórico a extrair-se do caso
exposto, ou, melhor, a confirmação ulterior de um ensino teórico já extraído
dos casos precedentes e que será mais do que nunca confirmado nos que seguem,
consiste no fato notório e indubitável de, nas comunicações mediúnicas entre
vivos, tratar-se de verdadeiras e próprias conversas entre duas personalidades
espirituais subconscientes, conversas transmitidas à personalidade consciente
do médium por meio da escrita automática. (2ª Categoria: Mensagens mediúnicas
entre vivos e à distância. Subgrupo C)
168. Pelo contrário, verifica-se não poder tratar-se de
faculdades telepático-clarividentes dos médiuns, que iriam colher segredos
sepultados nos recessos das subconsciências alheias, selecionando-as no meio de
um montão inextrincável de recordações ali existentes em estado latente. (2ª
Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à distância. Subgrupo C)
169. Nada mais insustentável do que esta última versão,
pois que tudo concorre para sustentar que os médiuns não compreendem nada e
nada escolhem, mas simplesmente conversam com a personalidade subconsciente ou
espiritual dos vivos distantes, do mesmo modo que conversariam normalmente com
os próprios vivos, salvo a diferença de se mostrarem as personalidades
espirituais dos vivos, quando conversam mediunicamente, muito menos reticentes
do que as personalidades normais dos mesmos quando conversam de viva voz. E
isso pela razão de que, quando os vivos de encontram em condições transitórias
de Espíritos desencarnados, não atribuem importância a certas conveniências
sociais a que os Espíritos encarnados dão demasiada importância. (2ª Categoria:
Mensagens mediúnicas entre vivos e à distância. Subgrupo C) (Continua no próximo número.)
(1) Defluxão – o mesmo que defluxo: inflamação catarral da
membrana mucosa das fossas nasais, com corrimento de humor aquoso.
Respostas às questões
preliminares
A. Nas comunicações mediúnicas que manteve com indivíduos
encarnados, os chamados vivos, qual o fato que mais surpreendeu William
Stead?
Atendendo à sugestão de Júlia, William Stead pôs sua mão ao
dispor de amigos que residiam a diversas distâncias e notou que quase todos
eles se achavam em condições de se comunicarem, embora variasse muito a
capacidade de manifestação. Alguns escreviam logo correntemente, com as suas
próprias características de estilo, de forma, de caligrafia, desde as primeiras
palavras, e prosseguiam desembaraçadamente como se estivessem escrevendo uma
carta normal. Mas o que mais surpreendeu Stead foi a inconcebível franqueza de
alguns amigos seus, dos quais ele conhecia a sensibilidade, a moderação e a
reserva de que eram dotados e, no entanto, lhe declaravam, com toda a
sinceridade, que se achavam em aperturas econômicas ou confessavam, sem
disfarces ou reservas, outras coisas íntimas, de várias naturezas. (2ª
Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à distância. Subgrupo C)
B. O estado de vigília, nesse tipo de fenômeno, é um
empecilho à comunicação entre vivos?
Sim. Bozzano diz que os fatos mostram isso. Caso o
comunicante esteja no estado de vigília, é provável que no momento da
comunicação ele tenha cochilado ou, então, passado para um estado de sonambulismo
em vigília sem que os presentes o percebessem. (2ª Categoria: Mensagens
mediúnicas entre vivos e à distância. Subgrupo C)
C. Qual é a outra conclusão, a respeito de como ocorre o
fenômeno, fortalecida pelos fatos ocorridos com William Stead?
É a confirmação de um ensino teórico já extraído dos casos
precedentes e que será mais do que nunca confirmado nos que seguem, a saber,
nas comunicações mediúnicas entre vivos, estamos diante de verdadeiras e
próprias conversas entre duas personalidades espirituais subconscientes,
conversas transmitidas à personalidade consciente do médium por meio da escrita
automática. (2ª Categoria: Mensagens mediúnicas entre vivos e à distância.
Subgrupo C)
Observação:
Para acessar a Parte 10 deste estudo, publicada na
semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2024/03/comunicacoes-mediunicas-entre-vivos_01514962492.html
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