CÍNTHIA CORTEGOSO
cinthiacortegoso@hotmail.com
De Londrina-PR
Quem dera fosse a espera pelos
pais que retornavam de uma viagem. O filho estava, sentadinho, esperando, mas
não chegariam com novidades. A família já se reunia na casa do menino; porém, o
choro foi maior do que os abraços de reencontros felizes.
Inexplicavelmente, os pais de
Isaac amanheceram mortos no leito do casal. Não se sabe a causa do inesperado
acontecimento... os dois de uma vez. Cogitou-se uma suposta ocorrência, com
alguma comida imprópria servida na festa da noite anterior, à qual toda a
família comparecera, no entanto, somente o casal sofrera tamanha complicação
levando-o à fatalidade.
Poderia ser encontrado o motivo,
mas não traria, ao convívio comum, os pais do menino.
De repente, as urnas chegaram
para o velório; momento importante para preces e ocasião para o desapego do
corpo físico, ligação mais intensa com o plano espiritual, pois a bondade do
Pai é a eternidade dos dias para o espírito.
Primeiro foi o corpo da mãe a
ser posicionado, em seguida, o do pai. Isaac, ficou sentadinho entre um e
outro. Colocou uma mãozinha em um e depois em outro, levantou-se, olhou para
cada um com tanto amor, tanto carinho.
As pessoas presentes se
comoveram muito pela docilidade do menino, do filho do casal. Mesmo com a
frágil situação, Isaac não se desesperava, cuidava do pai e da mãe, mesmo sem
mais necessitarem do amparo físico. Sentadinho na cadeira entre os dois,
balançava os pezinhos, era franzino e nem alcançava o chão para repousá-los.
Os avós, os tios, um por vez
chegavam ao ouvido do menino, e com tanta brandura, perguntavam-lhe se precisava
de alguma coisa; até água e suco eram levados até ele, pois não se distanciava
do posto de cuidador amoroso. Somente duas vezes havia ido ao banheiro durante
o período da manhã e já dois quartos da tarde também se findavam.
Isaac tanto foi cumprimentado
com abraços e beijos na face, e as pessoas deixavam sempre um pouquinho de
lágrima em seu rosto. Talvez essas lágrimas não fossem somente pela perda do
casal, mas muito mais pela comovente atitude do pequenino órfão. A ternura de
seu olhar perante os pais, adormecidos nos caixões, fora dificilmente vista
antes em outros olhos.
Como se não bastasse toda essa
comoção, o filho ainda conversava com os pais sobre assuntos cotidianos, como
se os dois pudessem lhe responder; os três normalmente conversavam e
compartilhavam com risadas e tanta felicidade as conversas simples e
maravilhosas do dia a dia.
E esse momento tão marcante para
Isaac estava prestes a se encerrar, pois um homem com jeito calmo e amoroso
adentrara o recinto onde ocorria o velório para dizer bondosas e confortantes
palavras para os presentes, enfatizando, para o filho e família. Após a mensagem
de conforto, as urnas seriam recolhidas e encaminhadas até o túmulo da família,
que era preparado para recebê-las.
Quando foi informado o horário
para o fechamento das tampas, naturalmente, algumas pessoas mais próximas
começaram a se despedir e virou um ritual as pessoas se despedirem com um olhar
para os dois falecidos e com um beijo na face ou na cabeça do filho do casal.
Exatamente às dezessete horas de
uma tarde primaveril, haveria o enterro dos pais de Isaac.
Como é comum, antes de haver o
sepultamento, já no cemitério, é realizada mais uma oração de corpo presente e,
assim, ocorreu naquele momento; entretanto, as palavras amorosas e
reconfortantes foram proferidas por um filho, agora órfão, de apenas onze anos.
O menino se soltou, com calma,
da mão da avó materna e pediu para dizer algo. Todos, já muito emocionados pelo
pouco comum acontecimento, ainda com mais expectativa, se puseram a ouvir.
Isaac, aparentemente tão frágil, começou a falar, posicionado em um local onde
todos podiam vê-lo.
Com as mãos entrelaçadas à
altura do coração, o pequenino começou o discurso de um filho proferindo sobre
seus pais:
– Antes de tudo, agradeço a Deus
por ter sido o filho desses meus pais queridos. Quantos momentos felizes
passamos juntos, tantas coisas descobrimos, quanto os meus pais fizeram por
mim.
O jovenzinho deu uma pausa e
seus olhos brilhavam como a gota do orvalho na manhã de um novo dia, mas sem
desespero, pois seus pais haviam-lhe passado ensinamento sobre o significado de
uma existência em relação à eternidade da vida. Isaac era iluminado por uma luz
encorajadora e calma, e amigos do outro plano o sustentavam para a ocasião. Ele continuou:
– Quando tinha medo de dormir,
sozinho, à noite, mamãe conversava com papai e ele logo me buscava e em seus
braços me trazia para a sua cama e, com tanta felicidade, nós três
conversávamos e tanta risada surgia, mas isso só quando estava com muito medo.
E nas vezes que precisava me explicar alguma coisa, quando era bem criança
ainda, papai se abaixava e de joelhos ficava e me olhava na direção dos meus
olhos para, assim, com palavras bem simples e de fácil entendimento, eu
compreender e aprender a nova lição. Quando estava bem frio, nós três ficávamos
encolhidos no sofá, mas mamãe me colocava, sentadinho entre os dois para eu
ficar quentinho e protegido. Mamãe, todas as noites, fazia comigo a oração de
agradecimento e pedido pelos bons acontecimentos, saúde e proteção, também para
eu ser um menino e homem de bem, que respeitasse e compreendesse as pessoas, os
animais e a natureza inteira, pois mamãe falava que ter respeito era o início
do amor, e mesmo que ainda não amasse alguém como amo meus pais, mas com o
respeito já estaria compreendendo a sua importância e um dia, também, poderia
amá-lo.
Devagar algumas lágrimas escorreram
dos olhinhos do menino, enquanto que no rosto dos presentes, até nos mais aparentemente insensíveis, estava o banho da lágrima das emoções. Momentos
assim são pura reflexão de como está o convívio com os mais próximos e com a
vida de uma forma geral.
E o filho retomou mais uma vez
para a conclusão de seu discurso tão simples e verdadeiro:
– Só mais um pouquinho. Quero
muito agradecer a Deus e pedir que Ele leve meus pais para um lugar bem bonito
e protegido, e como papai um dia me falou: “nós nos reencontraremos, filho”, aguardo esse dia, mas com muita felicidade para viver ainda aqui, pois mamãe me
falava que o sorriso dos olhos traz alegria para todas as coisas. E também
agradeço a todos por estarem aqui e me fortalecerem com palavras, carinhos e
muitos abraços... e agora continuarei a minha vida e, também, serei o homem de
bem com que tanto mamãe se importava.
Isaac colocou uma mão em cada
caixão e o soluço veio forte e incontido. As duas urnas foram descendo à medida
apropriada e logo estavam recolhidas e o lugar, com o acabamento necessário.
No final daquela tarde, com os
raios de sol bem fraquinhos, o menino, de mão dada com a avó materna que teria
agora a importância de sua mãe, voltava para a casa sem os pais. Uma nova vida
se iniciara. Aquele aparente e frágil menino caminhava amparado por seus
parentes e por amigos espirituais tão dedicados ao bem comum.
Os atos obedecem a uma lei
universal, à lei de Deus. Inúmeras vezes não se compreende o desencadeamento
das ações e reações, no entanto tudo possui uma razão de ser. A mesma energia
receberá a sua resultante em curto tempo ou na duração de existências inteiras.
Isaac estava no curso que, por
algum motivo, lhe conveio essa ocasião e o amor de Deus, perfeito Criador, por
meio de ajudantes amorosos encarnados e desencarnados, sempre o ajudará a
buscar uma melhor maneira para o cumprimento do dever, degrau da evolução.
O livre-arbítrio é comum a todo
espírito, o que diferenciará em bem ou mal são as escolhas na caminhada da
vida.
E a avó de Isaac, a partir de
agora, o levaria para a sua casa, cuidaria dele como o filho que em outro tempo
não foi capaz de cuidar.
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