JORGE LEITE DE OLIVEIRA
jojorgeleite@gmail.com
De Brasília-DF
Acabei de ler, num trabalho
de teoria literária, que “o interdisciplinar não é uma sinecura”. Então, fiquei
pensando comigo mesmo: “Mas o que é mesmo uma sinecura?”. Um dos meus hábitos
idiossincrásicos é procurar saber o real significado de palavras pouco faladas
numa frase. Daí procurei o Houaiss,
que me explicou: “sinecura sf (1881
cf. CA¹) emprego ou cargo rendoso que exige pouco trabalho [...]”.
— E também não me pergunte,
amigo leitor, o que significa esse ¹ junto com o restante dentro dos parênteses
acima, que não lhe vou explicar, porque eu também não sei, não quero saber e,
como você, tenho raiva de quem quer saber...
Assim disse o Nário. E
respondi-lhe de bate-pronto:
— Tá bom, tá bom, tá bom...
agora já tenho uma ideia do que seja “sinecura”. Mas o que é mesmo
interdisciplinar?, já que isso exige muito trabalho, como se depreende do que o
autor quis dizer com “sinecura”.
— Vamos lá, mas agora, só
por esnobismo, vou trocá-lo pelo Aurélio:
“interdisciplinar [De inter- + disciplinar.] Adj. 2 g. Comum a duas ou mais
disciplinas ou ramo de conhecimento”.
E só.
Percebeu?
O Houaiss ainda acrescentaria: “2 que é comum a duas ou mais
disciplinas”. E outra coisa: o ponto final da definição do Aurélio fica dentro da segunda chave, mas o ponto final de minha
citação fica depois das aspas.
Então agora já sei. O autor
da frase da primeira linha desta crônica quis dizer que a identificação do que é comum entre duas ou mais disciplinas exige
muito trabalho. Agora você já sabe, não é mesmo, amiga leitora?
Parodiando o que disse
alhures, em crônica de 6 de janeiro de 1895, “Se a pedra de Sísifo não andasse
já tão gasta, era boa ocasião de dar com ela na cabeça dos leitores”, a
propósito do significado das palavras. Per
accidens, logicamente, tudo o que acabo de lhe dizer. Afinal, “lutar com as
palavras é luta mais vã”, como já dizia o poeta Drummond. Por isso, a consulta
ao dicionário é o “eterno recomeço” representado pela mitologia de Sísifo,
condenado por Zeus a rolar eternamente uma pedra do cimo de um monte alto, para
o qual ela sempre retornava, como seu castigo por assaltar os viajantes na
estrada.
— O que significa isso,
Machado? Perguntar-me-á o amigo leitor. E eu lhe respondo que o correto
conceito das palavras é extremamente importante no entendimento de uma frase.
Para tanto, é preciso escolher um dos muitos significados de cada termo
dicionarizado. Se você achou chata a leitura desta crônica, você ainda não viu
nada. Veja no Houaiss os significados
da palavra sistema, que ocupa o
espaço de mais de uma página do citado livro, correspondente a, no mínimo, três
páginas deste texto. A diferença é que, ali, a letra é, também, três vezes
menor do que esta.
Já os significados de espaço
ocupam apenas um terço de página do Houaiss
e meia página do Aurélio, ou seja,
umas três páginas como esta que você lê.
Desculpe-me por ocupar, mais
um pouquinho, seu tão precioso espaço de tempo, amigo leitor, com tais
bobagens, mas ainda gostaria de alertá-lo de que não basta consultar o
dicionário para você entender o que um escritor quer dizer, é preciso
identificar o significado dado à palavra no contexto em que ela está inserida.
Se este é conotativo, o significado é figurado; se é denotativo, ele é real,
como real é o espanto que tive quando pedi a um magro aluno de turma de Geografia, anos atrás, para dizer qual o
significado de “instalado" e de "entalado”, exemplificando, após
consulta ao dicionário. Ele citou o seguinte exemplo:
— Estou bem entalado na cadeira, mas esse assunto
ficou instalado em minha garganta...
A outro aluno, de
Contabilidade, pedi para ver no dicionário o significado real de “crédito”, no
contexto da seguinte frase: “José ficou sem crédito
na praça”. Após ler os diversos conceitos, no livro, sua resposta foi a
seguinte:
— José era muito mentiroso e
ninguém mais acreditava nele, por isso ele ficou sem crédito na praça...
Até que faz sentido, não é
mesmo, amiga leitora?
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