Revista Espírita de 1868
Allan Kardec
Parte 13 e final
Concluímos hoje o estudo metódico e sequencial da Revista Espírita do ano de 1868, periódico editado e dirigido por Allan Kardec.
O estudo baseou-se na tradução feita por Júlio Abreu Filho.
A coleção do ano de 1868 pertence a uma série iniciada em
janeiro de 1858 por Allan Kardec, que a dirigiu até 31 de março de 1869, quando
desencarnou.
Cada parte do estudo compõe-se de:
a) questões preliminares;
b) texto para leitura.
As respostas às questões propostas encontram-se no final
do texto.
Questões
preliminares
A. Ante a pergunta “É o Espiritismo uma religião?”, qual
foi a resposta de Kardec?
B. Por que, ao longo de sua obra, Kardec disse que o
Espiritismo não era religião?
C. Podemos dizer que a caridade é a alma do Espiritismo?
Texto para leitura
152. Três notas fecham a edição de novembro de 1868: I –
Notícia sobre o lançamento do livro O Espiritismo na Bíblia, de Henri
Stecki, que fez da Bíblia um estudo aprofundado das passagens que têm relação
com os princípios espíritas. II – Registro relativo ao sucesso que vinha sendo
alcançado pelo jornal Le Spiritisme à Lyon, cujo primeiro número
aparecera a 15 de fevereiro último. III – Referência à reedição da obra Des
Destinées de L’Âme, escrita pelo sr. A. D’Orient. Embora tenha sido lançada
em 1845, antes do aparecimento da doutrina espírita, a obra se apoia na
pluralidade das existências, no progresso indefinido da alma, na não-eternidade
absoluta das penas e noutros princípios que seriam, anos mais tarde,
confirmados e desenvolvidos pelo Espiritismo. (Págs. 347 a 349.)
153. É o Espiritismo uma religião? “Ora, sim, sem dúvida,
senhores”, afirma Kardec. “No sentido filosófico, o Espiritismo é uma religião,
e nós nos glorificamos por isso, porque é a doutrina que funda os elos da
fraternidade e da comunhão de pensamentos, não sobre uma simples convenção, mas
sobre bases mais sólidas: as mesmas leis da natureza.” Essas palavras integram
o discurso proferido pelo Codificador na Sociedade Espírita de Paris em 1º de
novembro de 1868, por ocasião da sessão anual comemorativa dos mortos. O
discurso é reproduzido pela Revista na abertura do número de dezembro e contém
diversos ensinamentos, adiante sintetizados: I – Comunhão de pensamentos
significa pensamento comum, unidade de intenção, de vontade, de desejo, de
aspiração. II – Ninguém pode ignorar que o pensamento seja uma força. Ele é o
atributo característico do ser espiritual; é o pensamento que distingue o
espírito da matéria; sem o pensamento o espírito não seria espírito. III – O
pensamento age sobre os fluidos ambientes, como o som age sobre o ar. Uma
assembleia é um foco onde irradiam pensamentos diversos; como existem
pensamentos harmônicos e pensamentos discordantes, se o conjunto for harmônico,
a impressão será agradável; se discordante, a impressão será penosa. IV – A comunhão de pensamentos produz, assim,
uma espécie de efeito físico, que reage sobre o moral. V – Todas as reuniões
religiosas são fundadas na comunhão de pensamentos. Há, no entanto, criaturas
que negam a utilidade das assembleias religiosas e, por conseguinte, dos
edifícios consagrados a elas. Ora, o isolamento religioso, como o isolamento
social, conduz ao egoísmo. VI – O
verdadeiro objetivo das assembleias religiosas deve ser a comunhão de
pensamentos; é que, com efeito, a palavra religião quer dizer laço. Uma
religião é um laço que religa os homens numa comunidade de sentimentos,
princípios e crenças. Esse laço é, porém, um laço essencialmente moral, que
liga os corações, e seu objetivo é estabelecer, entre as pessoas que ele une, a
fraternidade e a solidariedade, a indulgência e a benevolência mútuas. (Págs. 351 a 357.)
154. Na sequência do discurso, Kardec explica por que
havia declarado, ao longo de sua obra, que o Espiritismo não era religião. É
que, observa ele, a palavra religião é inseparável da de culto e desperta uma
ideia de forma, que o Espiritismo não tem. As reuniões espíritas podem, pois,
ser feitas religiosamente. Pode-se mesmo aí fazer preces, ditas em comum. O
laço que deve existir entre os espíritas é todo moral, todo espiritual, todo
humanitário: o da caridade para todos, ou seja, o amor do próximo, que
compreende os vivos e os mortos. “A caridade, assevera Kardec, é a alma do
Espiritismo: ela resume todos os deveres do homem para consigo mesmo e para com
os seus semelhantes.” Seu campo é, porém, muito vasto: compreende duas grandes
divisões que podemos chamar de caridade beneficente e caridade benevolente. A
primeira é naturalmente proporcional aos recursos materiais disponíveis, do
mais pobre ao mais rico. Para praticar a caridade benevolente é preciso amar ao
próximo como a si mesmo. No amor ao semelhante está a verdadeira caridade
benevolente, a caridade prática, sem a qual a caridade é uma palavra vã. Eis aí
a caridade do verdadeiro espírita, como do verdadeiro cristão, aquela sem a
qual aquele que diz: Fora da caridade não há salvação pronuncia sua própria
condenação, tanto neste quanto no outro mundo. (Págs. 357 a 360.)
155. Depois do discurso feito por Kardec, foi lida uma
comunicação espontânea ditada pelo Espírito de H. Dozon a 1º de novembro de
1865, sobre a solenidade de Todos-os-Santos, que é comemorada anualmente pela
Sociedade Espírita de Paris. Na mensagem, após afirmar que Deus não é adorado
apenas nos templos, mas por toda a parte, Dozon lembra que aquele que pode
dispor de seu tempo o emprega no alívio de seus irmãos que sofrem. No fim da
mensagem, o amigo espiritual aconselha aos espiritistas: “Redobrai de zelo;
consolai os que sofrem, porque há seres que foram de tal modo afligidos durante
a sua vida, que necessitam ser amparados e ajudados na luta. Sabeis quanto a
caridade é agradável a Deus: praticai-a, pois, sob todas as formas; praticai-a
em nome dos Espíritos cuja memória festejais nesse dia, e eles vos bendirão!”
(Págs. 360 e 361.)
156. Em seguida, feitas as preces de costume, 32
comunicações foram obtidas pelos 18 médiuns presentes na reunião. A Revista
publicou parte dessas comunicações, das quais extraímos, de forma resumida, os
trechos que se seguem: I – Não devemos tremer diante da vida nem diante da
morte, como ensinou La Rochefoucauld, mas sim por haver realizado um trabalho
estéril, por ter tido uma existência perturbada e completamente falha. Espíritos
brilhantes, engenhosos, instruídos muitas vezes, faltam ao objetivo profundo da
vida. Milhares de Espíritos gostam da lembrança e da peregrinação que seus
amigos e parentes fazem pelos cemitérios. É uma baliza esse respeito aos
mortos, mas esses mortos estão todos vivos e, em vez de urnas funerárias e
epitáfios mais ou menos verdadeiros, eles pedem uma troca de ideias, de
conselhos, um suave comércio de espírito, essa comunidade de ideias que gera a
coragem, a perseverança, a vontade, os atos de dedicação. (Guillaumin.) II – O
isolamento em matéria religiosa e social não gera senão o egoísmo. O homem foi
criado para a sociabilidade. Uni-vos, pois, nos esforços e por pensamentos;
sobretudo, amai, sede bons, suaves, humanos; pregai pelo exemplo dos vossos
atos os salutares efeitos da vossa crença. Sede espíritas de fato e não somente
de nome. O Espiritismo, compreendido e sobretudo praticado, reformará tudo,
para vantagem dos homens. (J. J. Rousseau.) III – O perfume que se exala de
todos os bons sentimentos é uma prece constante que se eleva para Deus. (Sra.
Victor Hugo.) IV – A dedicação pelo reconhecimento é um impulso do coração; o
devotamento pelo amor é um impulso da alma. (Sra. Dauban.) V – O egoísmo é a
paralisação de todos os bons sentimentos. O egoísmo é a negação da sublime
sentença do Cristo que nos manda fazer aos outros o que queremos que os outros
nos façam. (Plácido.) VI – Qual é a ambição que não impede a alma de se elevar
aos esplendores do infinito? É a que vos leva a fazer o bem. Todas as outras
vos levam ao orgulho e ao egoísmo. (Bonnefon.) (Págs. 361 a 367.)
157. Kardec publica, na sequência, um extenso trabalho
por ele intitulado: Constituição Transitória do Espiritismo, dividido em nove
seções: I – Considerações preliminares. II – Extrato do relatório de caixa do
Espiritismo feito à Sociedade de Paris a 5 de maio de 1865. III – Dos cismas.
IV – O chefe do Espiritismo. V – Comitê central. VI – Obras fundamentais da
doutrina. VII – Atribuições do Comitê. VIII – Vias e meios. IX – Conclusão.
(Págs. 367 a 391.)
158. O objetivo do Codificador do Espiritismo, com a
proposta referida, foi viabilizar uma forma de dar continuidade ao seu
trabalho, com vistas aos tempos futuros. Em síntese, o que ele propõe, no
tocante à direção do Espiritismo, é o estabelecimento de um comitê central ou
conselho superior permanente, composto de doze membros titulares e um número
igual de conselheiros, ao qual caberia a coordenação do movimento. O comitê
central ou conselho superior seria, pois, o verdadeiro chefe do Espiritismo,
chefe coletivo, que nada poderia sem o consentimento da maioria e, em certos
casos, sem o assentimento de um congresso ou assembleia geral. Os congressos
seriam constituídos por delegados das sociedades particulares, regularmente
constituídas e postas sob o patrocínio do comitê central por adesão e pela
conformidade de seus princípios. (Págs. 379 a 381.)
159. Ao comitê central estariam afetos, ainda, os
seguintes serviços: I – Uma biblioteca, onde estariam reunidas todas as obras
de interesse do Espiritismo. II – Um museu. III – Um dispensário destinado a
consultas médicas gratuitas e ao tratamento de certas afecções, sob a direção
de um médico patenteado. IV – Uma caixa de socorro e previdência. V – Uma casa
de retiro. VI – Uma sociedade de adeptos com sessões regulares. (Págs. 382 e
383.)
160. Para viabilizar os recursos financeiros necessários
ao projeto, Kardec propõe a constituição de um fundo financeiro inalienável
cujos rendimentos assegurariam a continuidade dos serviços. “Regulando suas
despesas pelo rendimento, a existência da administração não pode ser
comprometida em caso algum, pois sempre terá meios para funcionar”, asseverou o
Codificador do Espiritismo. (Págs. 386 e 387.)
161. Duas notas encerram a edição do ano de 1868. A primeira
diz respeito à revista quinzenal El Criterio Espiritista, de Madri, a
qual readquiriu o direito de usar esse título, que havia sido interditado pelo
governo espanhol, por influência direta da autoridade eclesiástica espanhola. A
Revista reproduz os documentos relativos à interdição da revista, ocorrida em 6
de agosto de 1867. Com a revolução ocorrida na Espanha, que depôs o governo
anterior, a revista podia agora circular, verificando-se a mesma coisa com a
Sociedade Espírita Espanhola, fundada em 1865, que havia suspendido suas
sessões pelos mesmos motivos. (Págs. 392 a 394.)
162. A nota derradeira, que trata da renovação da
assinatura por parte dos assinantes da Revista, anuncia para breve a publicação
de um índice geral alfabético de todos os assuntos tratados na Revista Espírita,
assim como um catálogo das obras que possam interessar aos estudiosos da
doutrina espírita. (Pág. 394.)
Respostas às
questões propostas
A. Ante a pergunta “É o
Espiritismo uma religião?”, qual foi a resposta de Kardec?
“Ora, sim, sem
dúvida, senhores”, disse Kardec. “No sentido filosófico, o Espiritismo é uma
religião, e nós nos glorificamos por isso, porque é a doutrina que funda os
elos da fraternidade e da comunhão de pensamentos, não sobre uma simples
convenção, mas sobre bases mais sólidas: as mesmas leis da natureza.” Essas palavras integram o discurso proferido pelo
Codificador na Sociedade Espírita de Paris em 1º de novembro de 1868, por
ocasião da sessão anual comemorativa dos mortos. O discurso é reproduzido pela Revista
na abertura do número de dezembro e contém diversos ensinamentos. (Revista Espírita
de 1868, págs. 351 a 357.)
B. Por que, ao longo de sua obra, Kardec disse que o
Espiritismo não era religião?
É que, explicou Kardec, a palavra religião é inseparável
da de culto e desperta uma ideia de forma, que o Espiritismo não tem. As
reuniões espíritas podem, pois, ser feitas religiosamente. Pode-se mesmo aí
fazer preces, ditas em comum. O laço que deve existir entre os espíritas é todo
moral, todo espiritual, todo humanitário: o da caridade para todos, ou seja, o
amor do próximo, que compreende os vivos e os mortos. (Obra citada, págs. 357 a
360.)
C. Podemos dizer que a caridade é a alma do Espiritismo?
Sim. Foi Kardec quem o disse: “A caridade é a alma do
Espiritismo”. Segundo ele, a caridade resume todos os deveres do homem para
consigo mesmo e para com os seus semelhantes, mas seu campo é muito vasto.
Compreende duas grandes divisões que ele chamou de caridade beneficente e
caridade benevolente. A primeira é naturalmente proporcional aos recursos
materiais disponíveis, do mais pobre ao mais rico. Para praticar a caridade
benevolente é preciso amar ao próximo como a si mesmo. No amor ao semelhante
está a verdadeira caridade benevolente, a caridade prática, sem a qual a
caridade é uma palavra vã. (Obra citada, págs. 357 a 360.)
Observação:
Para acessar a Parte 12 deste estudo,
publicada na semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2025/05/revista-espirita-de-1868-allan-kardec_01960625782.html
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