A morte e os
seus mistérios
Ernesto Bozzano
Parte 21
Continuamos o estudo do clássico A morte e os seus mistérios, de Ernesto Bozzano,
conforme tradução de Francisco Klörs Werneck. O estudo foi aqui dividido em 24 partes. Nossa expectativa
é que ele sirva para o leitor como uma forma de iniciação aos chamados
Clássicos do Espiritismo.
Cada parte do estudo compõe-se de: a) questões preliminares;
b) texto para leitura.
As respostas às questões propostas encontram-se no final do
texto abaixo.
Questões preliminares
A. Há relatos de Espíritos confirmando a experiência da
“visão panorâmica”?
B. Existe, realmente, algum valor nas comunicações
mencionadas?
C. Que sensações uma pessoa experimenta durante a crise da
morte?
Texto para
leitura
325. A 3ª categoria dos casos examinados neste livro
compõe-se de relatos feitos por Espíritos que afirmam ter passado pela
experiência da "visão panorâmica". Segundo Bozzano, tais casos não
apresentam valor científico dada a impossibilidade de verificar, diretamente,
as afirmações das personalidades mediúnicas. Contudo, semelhantes afirmações
são dignas de ser aqui mencionadas, de modo complementar, ao estudo do tema
proposto, porque em todos os episódios, a seguir narrados, dá-se esta
circunstância: as personalidades mediúnicas comunicantes fazem menção
espontânea da experiência da "visão panorâmica" pela qual passaram na
crise da morte e nunca a pedido dos experimentadores.
326. Como as sessões, em que foram obtidas essas
informações, tiveram lugar em épocas diferentes e continentes diversos e, não
raramente, na presença de pessoas que ignoravam a existência deste gênero de
fenômenos, este concurso de circunstâncias, indiretamente, reveste de certo
valor as comunicações assim feitas. Ademais, se grande número de personalidades
sonambúlicas, comunicando-se mediunicamente, em momentos diferentes, em
continentes diversos e na presença de pessoas que ignoram a existência de
determinada categoria de fenômenos, relatam a ocorrência desses fenômenos,
somos logicamente levados a admitir que eles não podem ser explicados de outra
maneira senão reconhecendo a sua origem francamente espírita.
327. Caso XIII -
O seguinte episódio é devido à mediunidade de eminente precursor do movimento
espírita: o juiz Edmonds, de New York. Pouco antes havia ele perdido um dos
seus mais caros amigos, o juiz Peckham, da Corte de Apelação da mesma cidade, o
qual morrera, tragicamente, com a esposa, num acidente de colisão entre dois
vapores. Numa experiência pessoal de escrita automática, manifestou-se o
falecido amigo, fornecendo-lhe excelentes provas de sua própria identidade e
narrando a visão de sua morte, assim como sua presente vida espiritual.
328. De sua comunicação, destaca-se o seguinte: "Se eu
tivesse podido escolher o modo de separar-me de meu invólucro corporal,
certamente que não teria preferido o que me levou a desencarnar. Todavia, isso
agora já não me interessa, depois do instante em que, bruscamente, me achei
transportado a ambiente tão belo e tão extraordinariamente variado... No
momento da morte, revi, integralmente, toda a minha existência terrena. Todas
as ações, todas as cenas, todos os incidentes da vida se desenrolaram diante de
meus olhos, tão vivamente expressos como se tivessem sido gravados na minha
mente em fórmulas luminosas. Nem um só de meus amigos foi esquecido. No
instante em que mergulhei no mar, com minha esposa nos braços, apareceram-me
meu pai e minha mãe, e foi esta que nos tirou da água com uma facilidade cuja
natureza só agora compreendo."
329. Era a primeira vez que o juiz Edmonds ouvia falar de
"visão panorâmica" e, quando a sua mão traçou essa comunicação, ele
se achava sozinho. É, pois, evidente que, com a hipótese das personalidades
subconscientes, não se consegue explicar semelhante alusão espontânea feita a
um fenômeno real, mas ignorado pelo médium. Fica, assim, confirmado o que fora
observado acima, isto é, que os fenômenos deste gênero só podem ser explicados
pela aceitação de sua origem espírita.
330. Caso XIV -
Este caso figura no livro da Sra. De Morgan intitulado From Matter to Spirit. A personalidade mediúnica do Dr. Horace
Abraham Ackley descreve, nestes termos, sua própria experiência de separação
entre o Espírito e o corpo somático: "Eu sentia que me soltava
gradualmente de meu corpo, mas, achando-me em estado de consciência pouco
lúcida, parecia sonhar. Experimentava a sensação de estar minha personalidade
em duas partes que, entretanto, pareciam associadas por um laço indissolvível.
Quando o organismo corporal deixou de funcionar, meu Espírito pôde libertar-se
completamente e então me pareceu que as partes separadas de minha personalidade
se recompunham em uma só. Simultaneamente senti-me levantado acima de meu
cadáver, à pequena distância dele, de onde via distintamente as pessoas que
rodeavam meu corpo. Não poderia dizer por qual poder consegui erguer-me e a
tornar-me livre no ar. Depois desse acontecimento, suponho ter passado um
período bem longo em estado de inconsciência (o que, aliás, acontece
frequentemente, se bem que tal não acontece em todos os casos), deduzindo-o do
fato de que, quando tornei a ver meu cadáver, achava-se ele em adiantado estado
de putrefação. Logo que voltei a mim, todos os acontecimentos de minha vida
desfilaram diante de meus olhos como num panorama; eram visões vivas, muito
reais, em dimensões naturais, como se o meu passado tivesse se tornado
presente. Foi efetivamente todo o meu passado que revi, inclusive o último
episódio de minha desencarnação. A visão desfilou diante de mim com tal rapidez
que quase não tive tempo de refletir, achando-me como que arrebatado por um
turbilhão de emoções e, a seguir, desapareceu com a mesma rapidez com que se
mostrava. As meditações sobre o passado e o futuro suscitaram em mim vivo
interesse por minha condição atual.”
331. Prossegue o relato do Dr. Ackley (Espírito): “Já
ouvira os espíritas dizerem que os Espíritos desencarnados eram acolhidos no
mundo espiritual por seus parentes ou por seus Espíritos-guias. Não percebendo
ninguém perto de mim, concluí que os espíritas estavam enganados, mas, apenas
este pensamento me atravessou a mente, vi dois Espíritos que me eram desconhecidos
e para os quais me sentia atraído por um sentimento de afinidade. Soube que
haviam sido homens muito instruídos e inteligentes, mas que, como eu, não
haviam pensado em desenvolver em si próprios os elevados princípios da
espiritualidade. Chamaram-me pelo nome, embora não o tivesse eu pronunciado, e
me acolheram com uma familiaridade tão benévola que me senti agradavelmente
reconfortado. Deixei em companhia deles o meio em que desencarnara e que me
conservara até aquele instante. Pareceu-me nebulosa a paisagem que atravessei,
mas, dentro daquela meia obscuridade, fui conduzido a um lugar onde vi reunidos
numerosos Espíritos, entre os quais muitos que eu conhecera na Terra e que já
haviam morrido há algum tempo."
332. Do ponto de vista em apreço, o Espírito comunicante
afirma ter passado pela prova da "visão panorâmica" de seu passado,
prova que, neste caso, em lugar de se desenrolar espontaneamente, em
consequência de uma superexcitação sui generis das faculdades mnemônicas
(superexcitação produzida pela crise da agonia, ao que dizem os psicólogos),
parecia antes provocada pelos "guias" espirituais com o propósito de
predispor o Espírito recém-chegado a uma espécie de "exame de
consciência".
333. Caso XV –
Este caso foi extraído do livro do Dr. Wolfe Startling intitulado Facts in modern spiritualism
(Maravilhosos fatos do neoespiritualismo). Jim Nolan, o Espírito-guia da
célebre médium Sra. Hollis - Espírito que afirmou e demonstrou ter sido soldado
na guerra de secessão norte-americana e haver morrido de tifo num hospital
militar - assim respondeu às seguintes perguntas formuladas por um dos
experimentadores:
P. - Que impressão tiveste de tua primeira entrada no mundo
espiritual?
R. - Parecia-me que despertava de um sono, com um pouco de
atordoamento a mais. Já não me sentia enfermo e isso me espantava grandemente.
Tinha vaga suspeita de que algo de estranho se passara, mas não sabia definir
de que se tratava. Meu corpo estava estendido no leito de campanha e eu o via
bem. Dizia para comigo mesmo: "Que estranho fenômeno!" Olhei ao
derredor e vi três camaradas meus, mortos nas trincheiras diante de Viksburg e
que eu mesmo enterrara. Entretanto, ali estavam na minha presença. Olhavam-me,
a sorrir. Então, um dos três me saudou, dizendo:
- Bom-dia, Jim; também és um dos nossos.
- Sou dos "nossos"? Que queres dizer?
- Mas... que te encontras aqui, conosco, no mundo dos
Espíritos. Não te apercebes disto? É um meio onde se está bem.
Estas palavras eram muito fortes para mim. Fui presa de
violenta emoção e exclamei: "Meu Deus! Que dizes? Estou morto?"
- "Não, estás mais vivo do que nunca, porém te
encontras no mundo dos Espíritos. Para ficares convencido, não tens mais do que
olhar para teu corpo."
Com efeito, meu corpo jazia inerte, diante de mim, sobre
uma tarimba. Como, pois, contestar o fato? Pouco depois chegaram dois homens
que puseram meu cadáver em cima de uma prancha e o transportaram para perto de
outro carro, em que o meteram, subiram à boleia e partiram. Acompanhei então o
carro, que parou à borda de um fosso, onde meu cadáver foi arriado e sepultado.
Fora eu o único assistente de meu próprio enterro...
P. - Quais as sensações que experimentaste na crise da
morte?
R. – A que se experimenta quando o sono se apodera da
gente, mas deixando ainda que se possa lembrar de alguma ideia que tenha tido
antes do sono. É o que se dá por ocasião da morte. Mas, um pouco antes da crise
fatal, minha mente se tornara muito ativa; lembrei-me subitamente de todos os
acontecimentos de minha vida; vi e ouvi tudo que fizera, dissera, pensara,
todas as coisas a que estivera associado. Recordei-me até dos jogos e
brincadeiras do acampamento militar; gozei-os como quando participei
deles."
334. No que diz respeito ao caso e querendo argumentar o
modo pelo qual se exprime a entidade comunicante, pode-se dizer que, para ela,
a recapitulação da morte se desenvolveu, antes, sob a forma de uma
"síntese de recordações" do que sob a forma de uma "visão panorâmica",
diferença que, naturalmente, não modifica os termos do problema a resolver e
que demonstraria apenas que a entidade comunicante, na vida terrena, não
pertencia ao que, em linguagem psicológica, é qualificado de "tipo
visual", mas de preferência ao "tipo auditivo-mental".
Respostas às
questões preliminares
A. Há relatos
de Espíritos confirmando a experiência da “visão panorâmica”?
Sim. Esses relatos é que compõem a 3ª categoria dos casos
examinados neste livro, embora, segundo Bozzano, não apresentem eles valor
científico dada a impossibilidade de verificar, diretamente, as afirmações das
personalidades mediúnicas. (A morte e os
seus mistérios. Casos de "visão panorâmica". 3ª categoria.)
B. Existe, realmente,
algum valor nas comunicações mencionadas?
Como as sessões, em que foram obtidas, tiveram lugar em
épocas diferentes e continentes diversos e, não raramente, na presença de pessoas
que ignoravam a existência deste gênero de fenômenos, este concurso de
circunstâncias, indiretamente, reveste de certo valor as comunicações assim
feitas. Ademais, se grande número de personalidades sonambúlicas,
comunicando-se mediunicamente, em momentos diferentes, em continentes diversos
e na presença de pessoas que ignoram a existência de determinada categoria de
fenômenos, relatam a ocorrência desses fenômenos, somos logicamente levados a
admitir que eles não podem ser explicados de outra maneira senão reconhecendo
sua origem francamente espírita. (Obra citada. Casos de "visão
panorâmica". 3ª categoria.)
C. Que
sensações uma pessoa experimenta durante a crise da morte?
Elas variam conforme os indivíduos. Segundo Jim Nolan,
morto na guerra de secessão norte-americana, a sensação é a mesma que se
experimenta quando o sono se apodera da gente, deixando, porém, que se possa
lembrar de alguma ideia que tenha tido antes do sono. Um pouco antes da crise
fatal, a mente de Jim Nolan tornou-se, porém, muito ativa e ele lembrou-se
subitamente de todos os acontecimentos de sua vida. Viu e ouviu tudo que
fizera, dissera, pensara, todas as coisas a que estivera associado. Recordou-se
até dos jogos e brincadeiras do acampamento militar, e gozou-os como quando participou
deles. (Obra citada. Casos de "visão panorâmica". 3ª Categoria: Caso
XV.)
Observação:
Para acessar a Parte 20 deste
estudo, publicada na semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2020/02/a-morte-e-osseus-misterios-ernesto.html
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