A morte e os
seus mistérios
Ernesto Bozzano
Parte 22
Continuamos o estudo do clássico A morte e os seus mistérios, de Ernesto Bozzano,
conforme tradução de Francisco Klörs Werneck. O estudo foi aqui dividido em 24 partes. Nossa expectativa
é que ele sirva para o leitor como uma forma de iniciação aos chamados
Clássicos do Espiritismo.
Cada parte do estudo compõe-se de: a) questões preliminares;
b) texto para leitura.
As respostas às questões propostas encontram-se no final do
texto abaixo.
Questões preliminares
A. O caso XVI apresenta, além da visão panorâmica dos
episódios passados, um fato inteiramente novo. Que fato é esse?
B. Os fatos de visão panorâmica, no tocante aos
desencarnados, verificam-se em que momento?
C. Que descrição fez do plano espiritual o escritor George
Elliot?
Texto para
leitura
335. Caso XVI -
Num opúsculo intitulado How I became a
Spiritualist (Como me tornei espiritualista), James Smith, conhecido
escritor espírita, conta como ele foi progressivamente levado a se interessar
pelas experiências mediúnicas. Certa noite, ele deixou-se convencer a assistir
a uma sessão espírita em que se manifestou seu próprio irmão, falecido anos
atrás.
336. Ele assim relatou o episódio: "O médium,
mergulhado em profundo sono, volta-se para mim e diz: - Ao seu lado está um
jovem extremamente parecido consigo. Ele se mostra a mim como se saído da água
e afirma ser seu irmão. Quando tomou posse do médium, o recém-vindo descreveu
sua morte por afogamento, acrescentando que, no momento supremo, passaram diante
de seus olhos, em traços rápidos e como que em panorama, os acontecimentos de
sua vida inteira, seguidos de outro panorama, onde se delinearam todas as
circunstâncias, não ainda vividas, do resto dessa mesma existência, tal como
deveria desenrolar-se caso ele houvesse escapado à morte e continuado a viver
até o termo natural de sua vida terrena".
337. A última afirmativa do Espírito comunicante quer dizer
que na "visão espiritual" desfilaram, em panorama, os acontecimentos
do resto de sua existência, a mesma que deveria realizar-se caso não sucedesse
o acidente fatal e ocasional de morte por asfixia. A sua natureza sugere
considerações novas e interessantes sobre o tema do livre-arbítrio, do destino
e da fatalidade, considerações que Bozzano se absteve de formular, em vista da
insuficiência do equilíbrio das bases sobre as quais se apoiam.
338. Contudo, do ponto de vista da abstração filosófica –
que permite dela nos afastarmos, à vontade, no campo das ideias – tal indício
de uma nova concepção do ser, em relação ao fatalismo, merece, segundo ele, ser
considerado em face dos horizontes inexplorados que permitem ao pensador
entrever.
339. Caso XVII -
A Srta. Lillian Whiting, conhecida autora em assuntos espíritas, relata, na Light, interessante sessão realizada por
uma de suas amigas com a Senhora Keeler, médium com quem o Dr. Hodgson realizou
longa série de experiências. A essa amiga se manifestou uma entidade
desencarnada pouco antes, a quem ela perguntou quais haviam sido suas primeiras
impressões no mundo espiritual.
340. São as seguintes as palavras da Srta. Whiting: "A
entidade se lembra de ter atravessado um período de longa inconsciência. Depois
do que despertou subitamente ao som de uma voz que conhecia, ao que se seguiu
música paradisíaca, tudo tão surpreendente de maneira a não poder ela
compreender como essa música e voz se fizessem ouvir no seu aposento. Então,
ela viu surgir uma árvore de luz que, gradualmente, se tornara resplandecente.
A seguir, apareceram-lhe rostos de numerosas pessoas queridas, gente falecida
havia muitos anos. Diante de tal espetáculo, foi tomada de surpresa e, quase
apavorada, se perguntava o que podia ter acontecido e qual o significado de
tudo isso. De repente, foi-lhe revelado que acabara de passar pela
transformação a que as vivos chamam morte.”
341. Nesse momento, a relatora reproduz as palavras exatas
da entidade, que se exprimiu da seguinte forma: "Num relâmpago, tudo o que
eu fizera durante a vida e tudo o que eu realmente havia sido me foram
mostrados em panorama perfeitamente igual ao que se espera na hora do Juízo,
porque, realmente, na visão que sucessivamente se desenrolava diante de mim,
nos êxitos e insucessos de minha vida, eu avaliava exatamente o Bem e o Mal que
estavam contidos nela."
342. Neste caso, a "visão panorâmica" não se
produziu na ocasião da morte, mas já na vida espiritual, depois do período de
inconsciência ou de sono. E o desenrolar da visão está descrita pela entidade
como a "hora do Juízo", hora em que a significação intrínseca moral e
real das ações praticadas na existência terrena se revela inexoravelmente e é
desvendada ao protagonista desencarnado.
343. Observa Bozzano que todos estes detalhes estão de
acordo com as doutrinas das escolas ocultistas no que se refere à distinção
estabelecida entre a "visão panorâmica'' que se produz na iminência da
morte e a que se produz já na existência espiritual. A primeira é uma síntese
recapitulativa; a segunda tem o caráter de "julgamento com a sua
sanção", que se desenrola automaticamente em virtude da natureza intrínseca
do Espírito e que é o prelúdio de seu destino, ou "gravitação" do
Espírito para a esfera a que está destinado; isto se produz unicamente pela
aplicação do princípio que governa o universo físico e psíquico: a lei das
afinidades.
344. Caso XVIII –
Este caso foi colhido nos Proceedings of
the S. P. R. Sabe-se que, em certas sessões em que operava como médium a
Sra. Piper, manifestou-se uma entidade que afirmou ser o conhecido escritor
inglês George Elliot. Assim, na sessão de 5 de março de 1897, Elliot descreve
ao Dr. Hodgson o seu despertar no mundo dos Espíritos: "Experimentei,
repentinamente, a mais bela a mais indescritível sensação de liberdade a que se
possa aspirar. Reconheci que os ideais de minha vida haviam sido literalmente
grosseiros em confronto com os verdadeiros ideais. Apenas separado do corpo,
que sempre fora um enigma para mim, tive a prova de ter-me sempre enganado em
minhas suposições. Pouco depois desse momento, surgiram ao meu Espírito, e num
relâmpago, as recordações de minha vida inteira. Cada palavra, cada pensamento,
que passara pelo meu cérebro, cada ato de minha existência, desfilaram diante
de mim como em maravilhoso panorama. Nada mais extraordinário do que meu
despertar no ambiente espiritual, onde os aromas balsâmicos são de natureza
indescritível e ultrapassam, em suavidade, os poderes da compreensão humana.
Jamais vivente algum poderá formar concepção remota desta verdade. É
simplesmente impossível sugerir uma pálida ideia desta existência maravilhosa e
torná-la acessível à mente dos encarnados. Para compreendê-la, seria preciso
conhecê-la. Durante minha vida, frequentemente me absorvi em profundas
meditações e deixava meu pensamento rumar para o fantástico, presumindo que
algo deveria existir para lá do sepulcro, mas eu não conseguia formular uma
ideia... Aqui, como já vos disse, tive uma visão de minha vida inteira e
recordei-me de todos os pensamentos que surgiram fugidiamente em meu
Espírito... Em seguida, fui presa pelo tormento dos remorsos que, contudo, não
duraram muito tempo..., talvez a duração de alguns de vossos dias. Decorrido
esse tempo, senti-me invadido por uma sensação de extrema felicidade como igual
eu não havia nunca experimentado durante minha existência terrena. Nada mais
perturbava a minha alma. Senti-me livre, exultante! E entoei um hino de amor,
compreendendo que, também eu, constituía uma partícula integrante do amor
universal!"
345. Novamente, neste caso, a experiência da "visão
panorâmica" produziu-se depois da crise da morte e, também nesta circunstância,
manifestou-se o "tormento dos remorsos", em seguida ao desenrolar da
visão.
346. No texto intitulado “Conclusões”, Bozzano diz que
pelos fatos apresentados seu objetivo foi demonstrar o valor teórico de que se
revestem os fenômenos da "visão panorâmica", valor que permanecera
até então mal compreendido, pois que fisiologistas e psicólogos sempre fizeram
alusão a essa categoria de fatos, concedendo-lhe, porém, significação
estritamente limitada à pesquisa dos automatismos subconscientes de natureza
psicofisiológica.
347. No entanto, os fenômenos em questão, juntamente com
seus análogos, porém muito menos sugestivos, da "hipermnésia" e da
"criptestesia", concorrem para demonstrar, de maneira cientificamente
resolutiva, a existência, na subconsciência humana, de uma "memória
sintética", perfeita e indelével, susceptível de emergir, em toda a sua
plenitude, em raras ocasiões, que, em regra geral, são determinadas pela
iminência do perigo de morte. Esta última característica deveria levar os
homens de ciência a serem mais reservados nas suas fórmulas explicativas,
quando procurarem esclarecer o problema.
348. Tudo tendia para demonstrar que as faculdades
supranormais subconscientes eram faculdades espirituais sensório-psíquicas,
existindo em estado latente na subconsciência humana. Em face disso,
dever-se-ia presumir que acontecia o mesmo com a "memória sintética",
que evidentemente aí existe em estado latente, aguardando o momento de emergir
e de se manifestar no ambiente espiritual.
349. Semelhantes induções, rigorosamente lógicas, trouxeram
à luz um outro problema. Se era assim como foi dito, se a "memória
sintética" devia ser considerada como uma reserva mnemônica perfeita,
destinada a sobreviver à morte do corpo, neste caso, ela não podia residir nos
centros corticais, bem como as faculdades supranormais subconscientes não
podiam ser – como não eram – função do órgão cerebral.
350. Isto, para as faculdades supranormais subconscientes,
era fácil de demonstrar, visto que elas eram independentes da lei de seleção
natural e emergiam em razão inversa da atividade da consciência normal. Sobre
este ponto, e para a "memória sintética", tal indução era menos
evidente, ainda que, entretanto, o fato mesmo de sua existência subconsciente,
em condições perfeitas e permanentes, devesse levar racionalmente a julgar a
que a "memória sintética" devia ser função de alguma coisa
permanente.
351. Com efeito, psicólogos e filósofos não haviam deixado
de o observar e, há pouco, o Dr. Geley havia escrito a respeito: "Para que
esta recordação seja vivificada, é preciso, com toda evidência, que ela esteja
ligada a alguma coisa de permanente. A criptomnésia, como a criptopsiquia,
demonstra a insuficiência absoluta da concepção organocêntrica".
352. Isto é rigorosamente verdadeiro e é impossível aos
contraditores refutar tal afirmativa, solidamente fundada nos fatos, afirmativa
que me lembra a experiência de "autoscopia" sonambúlica do Dr.
Sollier, já citada por Bozzano em sua monografia sobre os "Fenômenos de
bilocação", pois que ela se mostra admiravelmente de acordo com a
afirmação do Dr. Geley, assim como com os ensinos das escolas ocultistas, que
situam a sede das faculdades sensório-psíquicas no "corpo astral".
Respostas às
questões preliminares
A. O caso XVI
apresenta, além da visão panorâmica dos episódios passados, um fato
inteiramente novo. Que fato é esse?
O Espírito comunicante disse que passaram diante dos seus
olhos, em traços rápidos e como que em panorama, os acontecimentos de sua vida
inteira, seguidos de outro panorama, onde se delinearam todas as
circunstâncias, não ainda vividas, do resto dessa mesma existência, tal como
deveria desenrolar-se caso ele houvesse escapado à morte e continuado a viver
até o termo natural de sua vida terrena. (A
morte e os seus mistérios. Casos de "visão panorâmica". 3ª
categoria: Caso XVI.)
B. Os fatos de
visão panorâmica, no tocante aos desencarnados, verificam-se em que momento?
A experiência comprova que a "visão panorâmica"
pode produzir-se por ocasião da morte ou na vida espiritual, antes ou depois do
período de inconsciência ou de sono. (Obra citada. Casos de "visão
panorâmica". 3ª categoria: Caso XVII.)
C. Que
descrição fez do plano espiritual o escritor George Elliot?
Segundo ele mesmo disse, foi extraordinário seu despertar
no ambiente espiritual, onde os aromas balsâmicos são de natureza indescritível
e ultrapassam, em suavidade, os poderes da compreensão humana. “Jamais vivente
algum poderá formar concepção remota desta verdade. É simplesmente impossível
sugerir uma pálida ideia desta existência maravilhosa e torná-la acessível à
mente dos encarnados”, eis as palavras por ele ditas. (Obra citada. Casos de
"visão panorâmica". 3ª Categoria: Caso XVIII.)
Observação:
Para acessar a Parte 21 deste
estudo, publicada na semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2020/02/a-morte-e-osseus-misterios-ernesto_21.html
Como consultar as matérias deste
blog? Se você não conhece a estrutura deste blog, clique neste link: https://goo.gl/ZCUsF8, e verá como utilizá-lo.
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário