O Espiritismo perante a Ciência
Gabriel Delanne
Parte 15
Continuamos o estudo do clássico O Espiritismo perante a Ciência, de
Gabriel Delanne, conforme tradução da obra francesa Le Spiritisme devant la Science.
Nosso objetivo é que este estudo possa
servir para o leitor como uma forma de iniciação aos chamados Clássicos do
Espiritismo.
Cada parte do estudo compõe-se de:
a) questões preliminares;
b) texto para leitura.
As respostas às questões propostas
encontram-se no final do texto abaixo.
Questões preliminares
A. Na Alemanha os fatos espíritas
tiveram acolhida igual à recebida na França?
B. Para fazer a mesa girar é preciso
que as pessoas estejam com os dedos em contato e fixem o mesmo ponto do móvel?
C. No fenômeno das mesas girantes a
mesa é um objeto indispensável, ou o fato pode produzir-se com outros objetos?
Texto para leitura
382. Na França, diferentemente da
Inglaterra, quer-se aparentar tudo saber e tudo conhecer sem jamais ter-se
estudado. Vejamos uma prova: Um deputado, o Sr. Naquet, anunciou, há alguns
anos, que iria fazer uma conferência sobre o Espiritismo e seus adeptos.
Esperava-se do eloquente orador uma refutação em regra, apoiada em bons
argumentos. Não houve nada disso; limitou-se ele a reeditar os lugares comuns,
já fora da moda, e levou a audácia a ponto de dizer que nenhum homem de certa
notoriedade se havia ocupado do assunto. Levantou-se, então, uma senhora e lhe
fez chegar às mãos a lista dos sábios estrangeiros que haviam publicado obras
sobre o Espiritismo. Naquet confessou ingenuamente sua ignorância.
383. Podemos ainda citar na
Inglaterra, entre os adeptos do novo espiritualismo, alguns homens eminentes:
Augusto de Morgan, presidente da Sociedade Matemática de Londres; Oxon,
professor da Faculdade de Oxford; P. Barkas, membro do Instituto Geológico de
Newcastle, e o professor Tyndall, autor de notáveis estudos físicos. Todos se
tornaram espiritistas, depois de verificarem de visu as manifestações dos Espíritos.
384. Depois da enumeração de tantos
nomes ilustres, podemos sorrir da ingênua pretensão dos que, sem estudos preliminares,
querem repelir o Espiritismo, tendo-o como vulgar superstição, ou melhor, como
“uma sandice de mundo nascente”, na opinião graciosa de Dupont White,
reproduzida por Jules Soury.
385. Se há sandice, estamos em boa
companhia, porque a estudiosa Alemanha nos oferece, também, respeitável
contingente. Vemos, à frente, o ilustre astrônomo Zöllner que, em suas memórias
científicas, narra as experiências que fez com Ulrici, professor de filosofia
do maior valor; Weber, célebre fisiologista, Fechner, professor da Universidade
de Leipzig, com Slade, o médium americano. Ressalta desses estudos e das
experiências conscienciosas instituídas por esses sábios, não só que as
manifestações espíritas são reais, como são dignas, ainda, no mais alto grau,
de atrair a atenção dos cientistas.
386. Na França, pelas razões
supracitadas, não contamos em nossas fileiras tantas notabilidades oficiais,
mas os nomes de Flammarion, Victor Hugo, Sardou, Girardin, de Vacquerie, de
Louis Jourdan, de Maurice Lachâtre e de outros têm algum valor e formam belo
contingente, no qual Dupont White e Jules Soury não poderão encontrar, jamais, lugar.
[i]
387. Enunciaram-se, a propósito das
mesas girantes e do Espiritismo, os mais contraditórios juízos. Entre os mais
severos, encontra-se Bersot, que já vimos tão bem informado sobre o magnetismo.
Ouçamo-lo: “Enfim, o Espiritismo, é preciso dizê-lo claramente, explica-se por
causas muito naturais: ilusão, trapaçaria, credulidade. Como se não fosse
bastante a fraqueza da razão, opuseram-lhe o coração humano, e aqui nos
dividimos entre a indignação contra os que zombam desses sagrados sentimentos e
a simpatia pelos que assim se deixam enganar.”
388. Para dar formal desmentido às
imputações caluniosas, vamos examinar cuidadosamente os fatos, não os que temos
observado, mas os narrados pelos sábios de que falamos. Citaremos muitas vezes
Wallace e Crookes, homens cuja boa-fé, honestidade e valor intelectual
respondem vitoriosamente às acusações de credulidade, trapaçaria ou ilusão,
que, com tanta generosidade, nos prodigalizam os êmulos de Jules Soury.
389. Segundo certas lendas, é preciso,
quando se quer fazer girar a mesa, que as pessoas estejam com os dedos em
contacto e fixem, com ininterrupta atenção, o mesmo ponto do móvel. Isso é
inteiramente inútil. Basta colocar as mãos, levemente, sobre a mesa, e esperar
que se manifestem os movimentos. Ao fim de certo tempo, ouvem-se estalidos,
indicando que o fenômeno vai produzir-se. Em dado momento, a mesa se ergue num
dos pés e dá uma ou muitas pancadas; pode então ser interrogada pelo processo
ordinário.
390. Os deslocamentos do móvel são,
por vezes, violentos. Conta Eugène Nus, no livro encantador, intitulado Choses de l'Autre Monde, como conseguiu,
em companhia de amigos, fazer com que a mesa girasse: “Trouxemos para o meio do
quarto uma pesada e maciça mesa de jantar; assentamo-nos em torno, aplicamos as
mãos, esperamos seguindo as formalidades e, depois de alguns minutos, ela
oscila sob nossos dedos. – Quem é o gracejador? Todos protestam inocência, mas
cada um desconfia do vizinho, quando, de repente, a mesa se levanta em dois
pés. Desta vez não há dúvida possível. Ela é bastante pesada para que o
esforço, mesmo aparente, possa incliná-la assim. Além disso, como para zombar
de nós, permanece imóvel, em equilíbrio, nas duas pernas de trás, formando com
o assoalho um ângulo quase reto, e resiste sob os braços que a querem fazer
voltar à posição natural, o que conseguem, enfim, depois de enérgico esforço.”
“Nós nos olhávamos espantados” – acrescenta o autor; devemos fazer notar que
esse espanto muito natural foi partilhado por Babinet, ao ver uma mesa
elevar-se no ar, sem que alguém a tocasse.
391. Lemos, com efeito, na Revue Spiritualiste de 1868: “Um fato
notável e de grande importância para as ideias que representamos acaba de
produzir-se em Paris. O ilustre sábio Babinet, apresentado a Montet, foi
testemunha da ascensão de uma mesa, isolada de todo contato. O acadêmico ficou
por tal forma surpreendido, que não pôde deixar de exclamar: – É assombroso!
Sabemos isto de várias testemunhas de vista, entre as quais o honrado General
Barão de Brévern, que nos autorizou a dar desse fato e dessa palavra a garantia
do seu nome. Ele está pronto a renovar seu testemunho a quem o quiser e diante
de quem quer que seja.”
392. As mesas manifestam sinais de
inteligência, ora batendo com um pé certo número de vezes, ora fazendo ouvir na
madeira pequenos estalos quando se pronuncia a letra que o Espírito quer
designar. Pode-se assim estabelecer uma conversa.
393. Não se presuma que a mesa é um
móvel indispensável e que o Espírito se venha alojar na madeira, como se tem
dito. Qualquer objeto pode servir a esse gênero de fenômeno, e se escolheu a
mesa por ser mais cômoda que qualquer outro instrumento, quando são muitos a
experimentar.
394. Nesse estudo, seguiremos William
Crookes, que catalogou os fenômenos, passando dos mais simples aos mais
complexos. Salvo as raras exceções, que ele indica, os fatos se produziram em
sua casa, à luz, em presença do médium e de alguns amigos:
1 - Movimento de corpos pesados com contato, mas sem
esforço mecânico. “É um dos fenômenos mais simples que
observei. Ele varia desde os abalos num quarto e no seu mobiliário até a
ascensão de um corpo pesado, quando a mão está em cima. Pode-se objetar a isso
que quando se toca um objeto em movimento, é possível puxá-lo, impeli-lo, ou
levantá-lo: Provei pela experiência que, em numerosos casos, isso não podia
suceder; mas, como elementos de prova, ligo pouca importância a essa classe de
fenômenos e só os menciono como preliminares a outros movimentos do mesmo
gênero, porém, produzidos sem contato.”
2 - Fenômenos de
percussão e outros sons da mesma natureza. “O nome popular de pancadas dá uma ideia muito falsa desse
gênero de fenômenos. Por diferentes vezes, em nossas experiências, ouvi sons
delicados, que se diriam produzidos pela ponta de um alfinete; uma cascata de
sons intensos como os de uma máquina de indução, em pleno movimento; detonações
no ar, ligeiros ruídos metálicos, agudos; crepitações como as que se ouvem
quando uma máquina de atrito está em ação; sons que se assemelham a raspagens,
gorjeios como de pássaro... Esses ruídos, que observei com quase todos os
médiuns, têm cada um suas particularidades especiais. Com Home são mais
variados; mas, quanto à intensidade e à regularidade não encontrei ninguém que
se pudesse comparar a Kate Fox. Durante muitos meses, tive o prazer, em
inúmeras ocasiões, de verificar os variados fenômenos que ocorriam em presença
dessa senhora, e foram esses ruídos que estudei particularmente. Com outros
médiuns, é geralmente necessário, para a regularidade da sessão, que todos se
sentem antes que os ruídos se façam ouvir; mas em relação à Srta. Fox, basta
colocar-lhe a mão, não importa em que, para que se escutem sons vigorosos, como
um choque tríplice e algumas vezes com força suficiente para serem percebidos
através de vários aposentos. Ouvi-os em uma árvore viçosa, em uma vidraça, num
fio de ferro estendido, numa membrana esticada, num tamboril, na coberta de um
cabriolé e no assoalho de um teatro. Ainda mais, o contato imediato não é
sempre necessário; percebi os ruídos saindo do soalho, das paredes, quando a
médium tinha pés e mãos ligados, quando em pé numa cadeira, quando ela se
encontrava num balanço suspenso do teto, quando estava encerrada numa gaiola de
ferro, e quando em síncope, num canapé. Ouvi-os numa harmônica, senti-os em
meus ombros e em minhas mãos. Ouvi-os numa folha de papel segura entre os dedos
e suspensa pela extremidade de um fio que passava pelo canto dessa folha. Tinha
conhecimento das teorias expostas, sobretudo na América, para explicar esses
sons. Experimentei-os por todas as formas que pude imaginar, até que não houve
como fugir à convicção de que eram reais e que não se produziam pela fraude ou
por meios mecânicos.”
395. Desde que esses fenômenos foram
verificados, sábios notáveis, como Faraday, Babinet, Chevreul procuraram
explicá-los por hipóteses mais ou menos racionais; não lhes era fácil, porque a
ciência, que repeliu com tanto desdém o fluido magnético, não podia aqui lhe
arranjar um papel.
396. A fim de sair do embaraço,
Faraday fez muitas experiências para demonstrar que a aderência dos dedos à
superfície da mesa era condição do seu movimento, porque, dizia ele, uma vez
estabelecida esta aderência, as trepidações nervosas e musculares dos dedos
acabam por se tornar bastante potentes para imprimir um movimento à mesa.
397. É isto verdade? – responde
Crookes que não, e prova-o. Imaginou ligar a extremidade de uma comprida tábua
a uma balança muito sensível, enquanto a outra extremidade repousava em
alvenaria. Destarte, a balança indicava certo peso, de que se tomou nota. O
médium pôs as mãos na parte da tábua sobre a alvenaria, por forma que qualquer
pressão faria levantar a tábua, o que logo seria visto pela diminuição de peso,
que a balança acusaria. Em vez disso, a tábua abaixou com uma força de seis
libras e meia. Home, o médium, para provar que não exercia pressão, colocou sob
os dedos uma frágil caixa de fósforos, e o mesmo fato se reproduziu. Nesta
última circunstância, qualquer aderência dos dedos seria destruída e, ainda que
se desse, perturbaria, em vez de favorecer o fenômeno.
398. Faz ainda notar Crookes que não
publicou suas observações, senão depois de haver visto os fatos se produzirem
uma meia dúzia de vezes, de forma a bem verificá-los. Para tirar à teoria da
aderência qualquer probabilidade, o sábio químico construiu um segundo
aparelho, tendo idêntico princípio, mas no qual o contato se produzia por meio
d'água, de modo que houvesse impossibilidade absoluta de transmitir-se à
prancha qualquer movimento mecânico. Notou, aliás, que a balança acusava,
muitas vezes, aumento de peso, quando Home conservava as mãos muitas polegadas
acima do aparelho. A hipótese de Faraday é, pois, absolutamente falsa.
399. Babinet encontrou uma outra
hipótese, ou melhor, formulou a mesma que Faraday, mas em outros termos.
Segundo ele, os deslocamentos da mesa eram produzidos por movimentos nascentes
e inconscientes, isto é, que, involuntariamente, as pessoas reunidas em torno
da mesa lhe comunicariam, de maneira automática, certos movimentos. Estabeleceu
ele esta teoria antes de ter observado todos os casos que se podem apresentar,
pois que a elevação de um móvel sem contato é inexplicável pelo seu método.
Ademais, a experiência de Crookes, citada acima, reduz a nada essas
pseudoexplicações.
[i] Depois da primeira edição deste livro foi
criado em Paris o Instituto Metapsíquico Internacional, para o estudo dos
fenômenos espíritas, e a partir disso numerosos sábios afirmaram a
autenticidade dos fatos.
Respostas às questões preliminares
A. Na Alemanha os fatos espíritas tiveram acolhida igual à
recebida na França?
Não. Cientistas de renome radicados na
Alemanha se interessaram pelo assunto e puderam comprovar a realidade das
manifestações, a exemplo do ilustre astrônomo Zöllner que, em suas memórias
científicas, narra as experiências que fez com Ulrici, professor de filosofia
do maior valor; de Weber, célebre fisiologista; de Fechner, professor da
Universidade de Leipzig, que trabalhou com Slade, o médium americano. Ressalta
dos estudos e das experiências conscienciosas, instituídas por esses sábios,
não só que as manifestações espíritas são reais, como são dignas, ainda, no
mais alto grau, de atrair a atenção dos cientistas. (O Espiritismo perante a Ciência, Terceira Parte, Cap. I - Provas da
imortalidade da alma pela experiência.)
B. Para fazer a mesa girar é preciso que as pessoas estejam
com os dedos em contato e fixem o mesmo ponto do móvel?
Não. Isso é inteiramente inútil. Na
produção do fenômeno, basta colocar as mãos, levemente, sobre a mesa, e esperar
que se manifestem os movimentos. Ao fim de certo tempo, ouvem-se estalidos,
indicando que o fenômeno vai produzir-se. Em dado momento, a mesa se ergue num
dos pés e dá uma ou muitas pancadas; pode então ser interrogada pelo processo
ordinário. (Obra citada, Terceira Parte, Cap. II - As teorias dos incrédulos e
o testemunho dos fatos.)
C. No fenômeno das mesas girantes a mesa é um objeto
indispensável, ou o fato pode produzir-se com outros objetos?
A mesa não é um móvel indispensável
nesse gênero de fenômeno. Qualquer objeto pode servir a ele, e se escolheu a
mesa somente por ser mais cômoda que qualquer outro instrumento quando são
muitos a experimentar. (Obra citada, Terceira Parte, Cap. II - As teorias dos
incrédulos e o testemunho dos fatos.)
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