Lar: escola bendita da vida eterna
JORGE LEITE DE OLIVEIRA
jojorgeleite@gmail.com
De Brasília-DF
Eu corria no parque da cidade de
Brasília, quando percebi ao meu lado um vulto luminoso: era Emmanuel.
Cumprimentei-o, ele respondeu-me, e logo começamos a conversar, enquanto os
quilômetros da pista se escoavam...
— Dileto amigo espiritual, que me tens
a dizer sobre esta frase do Cristo: “O que foi gerado da carne é carne, o que
foi gerado do espírito é espírito” (João, 3:6)?
— Digo-te que
Atingido o plano espiritual, depois da
morte, sentimentos indefiníveis nos senhoreiam o coração. Nos recessos do
espírito, rebentam mágoas e júbilos, poemas de ventura e gritos de aflição,
cânticos de louvor pontilhados de fel e brados de esperanças que se calam, de
súbito, no gelo do sofrimento...
Rimos e choramos, livres e presos,
triunfantes e derrotados, felizes e desditosos... Bênçãos de alegria, que nos
clareiam pequeninas vitórias alcançadas, desaparecem, de pronto, no fundo
tenebroso das quedas que nos marcaram a vida. Suspiramos pela ascensão sublime,
sedentos de comunhão com as entidades heroicas que nos induzem aos galardões
fulgentes dos cimos, todavia trazemos o desencanto das aves cativas e
mutiladas. Ao invés de asas, carregamos grilhões, na penosa condição de almas
doentes...
Na concha da saudade, ouvimos as
melodias que irrompem das vanguardas de luz, entretecidas na glória dos
bem-aventurados, no entanto austeras admoestações nos chegam da Terra pelo
sem-fio da consciência. Nas faixas do mundo, somos requisitados pelas
obrigações não cumpridas. Erros e deserções clamam, dentro de nós, pedindo
reparos justos...
Longe das esferas superiores que ainda
não merecemos e distanciados das regiões positivamente inferiores em que nossas
modestas aquisições evolutivas encontraram início, concede-nos, então, a
Providência Divina, o refúgio do lar, entre as sombras da Terra e as
rutilâncias do Céu, por um instituto de tratamento, em que se nos efetive a
necessária restauração.
É assim que, reencarnados em nova
armadura física, reencontramos perseguidores e adversários, credores e
cúmplices do pretérito na forma de parentes e companheiros para o resgate de
velhas contas. Nesse cadinho esfervilhante de responsabilidades e inquietações,
afetos renovados nos chamam ao reconforto, enquanto que aversões redivivas nos
pedem esquecimentos...
À vista disso, no mundo, por mais
atormentado nos seja o ninho familiar, abracemos nele a escola bendita do
reajuste, onde temporariamente exercemos o ofício da redenção. Conquanto
crucificados em suplícios anônimos, atados a postes de sacrifícios ou
semiasfixiados no pranto desconhecido das grandes humilhações, saibamos
sustentar-lhe a estrutura moral, entendendo e servindo, mesmo à custa de lágrimas,
porque é no lar que, esteja ele dependurado na crista de arranha-céus, ou na
choça tosca de zinco, que as leis da vida nos oferecem as ferramentas do amor e
da dor para a construção e reconstrução do próprio destino entregando-nos, de
berço em berço, ao carinho de Deus que verte inefável, pelo colo das mães
(XAVIER, F. C. O Livro da Esperança,
cap. 8).
Após essa verdadeira aula sobre o elo
entre a vida física e a espiritual, indaguei de Emmanuel se suas palavras
significavam que não existe acaso nas ligações familiares em nosso plano
físico. Em resposta, disse-me ele:
— Meu caro Jó, “Os laços de família não
sofrem destruição alguma com a reencarnação, como o pensam certas pessoas. Ao
contrário, tornam-se mais fortalecidos e apertados”. O princípio da existência
única na Terra, sim, é que destruiria esses laços, como disse Allan Kardec (O Evangelho segundo o Espiritismo, cap.
4, it. 18).
De repente, percebi que chegáramos ao
fim da pista e da conversa, pois Emmanuel entrou por uma porta invisível,
acenou-me adeus e desapareceu.
Nota do autor: À exceção das citações, todos os textos de
minhas crônicas são fictícios, ou seja, de minha elaboração pessoal ou por mim
parafraseados. Nada há neles que se possa dizer ter sido psicografado, exceto o
que for mediúnico e, nesse caso, referenciado.
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