Revista Espírita de 1869
Allan Kardec
Parte 4
Damos sequência ao estudo metódico e sequencial da Revista Espírita do ano de 1869, periódico editado e dirigido por Allan Kardec. O estudo é baseado na tradução feita por Júlio Abreu Filho publicada pela EDICEL.
A coleção do ano de 1869 pertence a uma série iniciada em
janeiro de 1858 por Allan Kardec, que a dirigiu até 31 de março de 1869, quando
desencarnou.
Cada parte do estudo, que é apresentado às
quartas-feiras, compõe-se de:
a) questões preliminares;
b) texto para leitura.
As respostas às questões propostas encontram-se no final
do texto abaixo.
Questões
preliminares
A. Os órgãos cerebrais devem o seu desenvolvimento à
atividade do Espírito?
B. A carne é fraca?
C. Que é que determina o temperamento de uma pessoa?
Texto para leitura
32. Na casa de um dos membros da Sociedade de Paris, onde
se realizavam sessões espíritas, já fazia algum tempo que batiam à porta.
Quando esta era aberta, não se via ninguém. Excluídas todas as possibilidades
que pudessem explicar o fato, o dono da casa pediu ao visitante invisível que
dissesse o que desejava. O Espírito comunicou-se, então, no dia 22 e no dia 29
de dezembro de 1868, convicto de que ainda pertencia ao mundo dos encarnados.
Kardec lembra que esse Espírito estava na mesma situação que o anterior e
ignorava a própria desencarnação. (Págs. 49 a 52)
33. A Revista reproduz um artigo de Ernest Le Nordez,
publicado pelo Petit Moniteur de 12-12-1868, em que o autor relata os
últimos momentos da existência do grande músico Pergolèse, que nasceu perto de
Nápoles, na pequena cidade de Casoria, em 1704, e faleceu aos 33 anos, momentos
depois de compor o canto que o imortalizou: o Stabat Mater, que o mundo
cristão inteiro repete e admira. De acordo com o articulista, Pergolèse compôs
essa peça em estado de êxtase dentro de uma igreja. (Págs. 52 a 55)
34. Na seção de livros, Kardec apresenta uma resenha da
obra História dos Calvinistas das Cévennes, escrita por Eugène
Bonnemère, que relata como foi a guerra empreendida sob o reinado de Luís XIV
contra os calvinistas, um dos mais tristes episódios da História da França. Na
obra há referências aos inumeráveis casos de sonambulismo, êxtase, dupla vista,
previsões e fenômenos semelhantes que se produziram durante todo o curso dessa
infeliz cruzada e que sustentaram a coragem dos calvinistas. (Págs. 55 a 62)
35. Os estranhos fenômenos referidos pelo sr. Bonnemère
não buscavam, para se produzir, nem a sombra nem o mistério, e manifestavam-se
ante os intendentes, os generais e os bispos, como ante os ignorantes e as
pessoas mais simples. Em setembro de 1704, segundo Villars e Chamillard, as
mulheres de uma cidade inteira pareciam possuídas do “diabo”. É que elas
tremiam e profetizavam publicamente nas ruas, fato tido então como sobrenatural.
(Pág. 57 e 58)
36. Eis, de forma resumida, alguns trechos extraídos da
obra em apreço: I – O fluido é um ímã que atrai os mortos bem-amados para os
que ficam: desprende-se abundantemente dos inspirados e vai despertar a atenção
dos seres partidos antes e que lhes são simpáticos. II – No século 18 esses intermediários eram
chamados extáticos; hoje são médiuns. III – Conforme o Espiritismo, um ser
invisível se põe em comunicação com outro, apto a receber os pensamentos dos
que viveram e a escrevê-los, quer por um impulso mecânico inconsciente
imprimido à mão, quer por transmissão direta à inteligência dos médiuns. IV –
Crendo que o Espírito do Senhor estaria com eles e falaria pela boca das
crianças e das mulheres, os protestantes perseguidos passaram a ver as mulheres
e as crianças a profetizar. V – Um homem chamado Du Serre mantinha em casa,
numa vidraria oculta na montanha de Peyrat, uma verdadeira escola de profecia.
VI - Reunindo em casa rapazes e moças cuja natureza impressionável e nervosa havia
observado, submetia-os previamente a jejuns austeros, agia sobre sua
imaginação, estendia as mãos sobre eles, soprava sobre suas frontes e os fazia
cair como inanimados à sua frente, tendo os olhos fechados e os membros tensos
pela catalepsia. VII – Os jovens tornavam-se insensíveis à dor e não viam nem
ouviam o que se passava ao seu redor, mas pareciam escutar vozes interiores,
porque nesse estado falavam ou escreviam. VIII – Em 1701 houve nova explosão de
profetas, que se contavam aos milhares, das montanhas de Lozère até as margens
do Mediterrâneo. Os católicos haviam tomado os filhos dos calvinistas e Deus se
serviu dos filhos para protestar contra essa iniquidade. IX – O governo real
usou contra eles a violência: prendia em massa os profetas-meninos, açoitava
impiedosamente os menores, e queimava as plantas dos pés dos maiores. X –
Considerados “atingidos pelo fanatismo”, uma ordenação assinada por Bâville em
setembro de 1701 tornou os pais responsáveis por esse fanatismo e os condenou a
penas arbitrárias. XI – Vãos esforços! Prendiam, torturavam os corpos, mas sua
alma continuava livre e os profetas se multiplicaram. XII – Bâville julgava os
cativos, prendia alguns e enviava o resto para as galés; e, como nada disso
parecia desencorajar os reformados, continuou a procurar as reuniões do deserto
e a estrangular impiedosamente os que se rendiam, sem que estes pensassem em
opor resistência mais séria aos seus carrascos. (Págs. 58 a 62)
37. Um estudo intitulado “A carne é fraca” abre o número
de março de 1869. Nele, afirma Kardec que já estava perfeitamente reconhecido
que os órgãos cerebrais correspondentes às diversas aptidões devem o seu
desenvolvimento à atividade do Espírito. Esse desenvolvimento é, assim, um
efeito e não uma causa. Um homem não é músico porque tenha a bossa da música,
mas tem a bossa da música porque seu Espírito é músico. (Pág. 63)
38. Eis outros pontos extraídos do estudo citado: I – O
Espírito é o artífice do próprio corpo; a perfeição do corpo nos grupos étnicos
adiantados seria o resultado do trabalho do Espírito, que aperfeiçoou o seu
utensílio à medida que aumentam suas faculdades. II – Um Espírito irascível
deve levar a um temperamento bilioso, do que se conclui que um homem não é
colérico porque seja bilioso, mas que é bilioso porque ele, como Espírito, é
colérico. III – A ação do Espírito sobre o físico é de tal modo evidente, que
por vezes se veem graves desordens orgânicas produzidas por efeito de violentas
comoções morais. IV – O temperamento é, dessa forma, pelo menos em parte,
determinado pela natureza do Espírito, que é causa e não efeito. V – Há casos,
porém, em que o físico influi indiscutivelmente sobre o moral: é quando um
estado mórbido ou anormal é causado por uma ação externa, independente do
Espírito, como a temperatura, o clima, os vícios hereditários, um mal-estar
passageiro etc. O moral do Espírito pode, então, nesses casos, ser afetado em
suas manifestações pelo estado patológico, sem que sua natureza intrínseca seja
modificada. VI – Atribuir, pois, a fraqueza do indivíduo à carne é uma fuga,
cujo objetivo é escapar à responsabilidade. A carne não é fraca, senão porque o
Espírito é fraco. VII – A responsabilidade moral dos atos da vida cabe ao
indivíduo, mas diz a razão que as consequências dela se encontram na razão do
desenvolvimento intelectual do Espírito. Quanto mais esclarecido, menos
escusável, visto que, com a inteligência e o senso moral, nascem as noções do
bem e do mal, do justo e do injusto. VIII – Esta lei encontra sua aplicação na
Medicina e dá a razão do seu insucesso em certos casos. Desde que o
temperamento é um efeito, e não causa, os meios tentados para modificá-lo podem
ser paralisados pelas disposições morais do Espírito, que opõe uma resistência
inconsciente e neutraliza a ação terapêutica. IX – É, pois, sobre a causa
primeira que se deve agir, e o médico pode, em certos limites, fazer-se
moralizador de seus doentes. O essencial no caso é aplicar o remédio moral com
tato, prudência e a propósito. X – Como é difícil, em certa idade, conseguir a
transformação do caráter de uma pessoa, incumbem à educação, sobretudo à
primeira educação, os cuidados dessa natureza. XI – Quando a educação, desde o
berço, for dirigida nesse sentido; quando se aplicar em abafar, em seus germes,
as imperfeições morais, como faz com as imperfeições físicas, o médico não mais
encontrará no temperamento das pessoas um obstáculo contra o qual sua ciência
tem sido muitas vezes impotente. (Págs. 63 a 67)
39. A Revista transcreve carta datada de fevereiro de
1869 dirigida pelo confrade Manuel Gonzalez Soriano, da Espanha, a Kardec, na
qual o missivista dá conta dos trabalhos de propagação da doutrina espírita que
ele e seus companheiros vinham fazendo em diversas cidades espanholas, a
exemplo de Leon, Sevilha, Salamanca etc. Comentando o assunto, Kardec diz que o
devotamento à causa espírita não consiste em tomar o bastão de viagem e sair a
pregar pelo mundo afora. Não; em qualquer lugar onde estejamos podemos ser
úteis. “O verdadeiro devotamento – assevera o Codificador – consiste em tirar o
melhor partido de sua posição, pondo a serviço da causa, o mais utilmente
possível e com discernimento, as forças físicas e morais que a Providência
concedeu a cada um.” (Págs. 67 a 69)
40. Anne Blackwell, correspondente da Revista, radicada
em Londres, diz que o jornal inglês The Builder, órgão dos arquitetos, e
a Revista Antropológica, de Londres, focalizaram em diversas
oportunidades questões atinentes ao Espiritismo. A escola espírita inglesa não
era, então, homogênea e coerente como a escola espírita francesa, mas – diz a
correspondente – dela muito se aproximava. Se as obras da doutrina fossem
traduzidas para o inglês, isso contribuiria para reunir numerosos partidários e
fixar as ideias ainda incertas. (Págs. 69 e 70)
41. Duas notas sobre o pensamento e a obra de Charles
Fourier mostram que esse respeitável pensador francês, além de ter tornado
pública sua crença na reencarnação, previu já em 1826 o advento da
fenomenologia espírita. Segundo Fourier, um mau rico “poderá voltar para
mendigar à porta do castelo do qual foi proprietário”. (Págs. 70 a 72)
Respostas às
questões propostas
A. Os órgãos cerebrais devem o seu desenvolvimento à
atividade do Espírito?
Sim. Segundo Kardec, estava perfeitamente reconhecido que
os órgãos cerebrais correspondentes às diversas aptidões devem o seu
desenvolvimento à atividade do Espírito. Esse desenvolvimento é, assim, um efeito
e não uma causa. Um homem não é músico porque tenha a bossa da música, mas tem
a bossa da música porque seu Espírito é músico. (Revista Espírita de 1869,
pág. 63.)
B. A carne é fraca?
Não. Atribuir a fraqueza do indivíduo à carne é uma fuga,
cujo objetivo é escapar à responsabilidade. A carne não é fraca, senão porque o
Espírito é fraco. A responsabilidade moral dos atos da vida cabe ao indivíduo,
mas diz a razão que as consequências dela se encontram na razão do
desenvolvimento intelectual do Espírito. Quanto mais esclarecido, menos
escusável, visto que, com a inteligência e o senso moral, nascem as noções do
bem e do mal, do justo e do injusto. (Obra citada, pp. 63 a 67.)
C. Que é que determina o temperamento de uma pessoa?
O temperamento é, pelo menos em parte, determinado pela
natureza do Espírito, que é causa e não efeito. Um Espírito irascível deve
levar a um temperamento bilioso, do que se conclui que um homem não é colérico
porque seja bilioso, mas é bilioso porque, como Espírito, é colérico. Há casos,
porém, em que o físico influi indiscutivelmente sobre o moral: é quando um
estado mórbido ou anormal é causado por uma ação externa, independente do
Espírito, como a temperatura, o clima, os vícios hereditários, um mal-estar
passageiro etc. O moral do Espírito pode, então, nesses casos, ser afetado em
suas manifestações pelo estado patológico, sem que sua natureza intrínseca seja
modificada. (Obra citada, pp. 63 a 67.)
Observação:
Para acessar a parte 3 deste estudo,
publicada na semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2025/06/revista-espirita-de-1869-allan-kardec_0888640634.html
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