sábado, 28 de junho de 2014

As vítimas de Vigarino


JORGE LEITE DE OLIVEIRA
jojorgeleite@gmail.com
De Brasília-DF

A esperteza de certos talentos parece ser sempre sinistra. Há quem diga que o mal não existe, que o mau é um ignorante, que o mal do mau é sentir um doentio prazer em destruir e destruir-se, em consumir e consumir-se. É o que, na relação sexual, se chama de sadomasoquismo.
“Vaidade das vaidades, tudo é vaidade!”, diria o Eclesiastes.
Há pessoas muitíssimo inteligentes, se é que a capacidade criativa doentia pode ser assim denominada, que engendram mefistofelicamente situações com vistas a manipular as mentes menos ativas, para não dizermos ingênuas, mas que, por sua vez, são ambiciosas.
É aí que entram os estelionatários.
De aparência humilde, simplória mesmo, voz macia, modos extremamente educados, bem-vestidos, eles se infiltram, sorrateiramente, em nossas vidas, para nos fazer de trouxas na aplicação de seus golpes de mestres.
Vigarino era um deles, até ser preso e colher o que plantou.
Quando foi recolhido ao xadrez, dizem que tocou no telefone de sua empresa de fachada a música “O poderoso chefão”. Ironia das ironias, tudo é ironia! diria ele, ante a cara de riso dos policiais federais que desbaratavam seu império fajuto naquele fatídico dia.
Muita gente pensa que somente pessoas estúpidas caem nos chamados contos do vigário. Vigarino, porém, afirma que pessoas burras não têm 100 mil reais sobrando para lhe doar; só as espertas...
Não se iluda, dizia ele, sou alguém extremamente ladino ao telefone. Se desejar aplicar-lhe um golpe, nada evitará que eu lhe subtraia muita grana. Um dos meus chamarizes é a seguinte frase: “Você vai ganhar uma fortuna, se aceitar ser meu sócio”.
O mesmo posso fazer pela internet. Desde criança, sou conhecido por minha extrema capacidade de persuasão. Bonito, simpático, alegre, comunicativo e, sobretudo, altamente cínico, não tinha o menor escrúpulo em prejudicar alguém, fosse quem fosse, até minha própria mãe, para me dar bem em alguma trama maquiavélica.
Se descoberto, fazia-me de vítima de um engano, ou mesmo dava as costas para o lesado e afastava-me como se o problema não me dissesse respeito. Meu egoísmo, aliado ao poder de persuasão, era ilimitado.
Muitas empresas desonestas adoram trabalhar com pessoas como eu.
Se trabalhasse para o teatro, seria um personagem perfeito.
Empresário de empresa telefônica fraudulenta, treinei inúmeros funcionários de outras centrais telefônicas especializadas em golpes aos usuários incautos ou metidos a espertos. Exemplo: anúncios de TV com a contratação de grandes artistas que, sem saber que estavam sendo usados para golpes em clientes, aceitavam participar de nossas propagandas mentirosas.
Os clientes, ante a visão de um ídolo anunciando um produto “milagroso”, acreditavam cegamente no que era afirmado e compravam o produto.  Para eles, bastava a palavra do artista idolatrado ou da atriz famosa, a seu ver acima de qualquer suspeita.
Nossa arma é a emoção. Quanto mais tocarmos os corações dos consumidores, mais sucesso terá nosso produto.
Não usamos a lógica, apelamos para a sensibilidade da futura vítima, pois se usássemos a lógica, logo ouviríamos dela que não dariam seu suado dinheiro em troco de promessas de estranhos.
Outra característica de nossas vítimas é a ganância. Nesse caso, basta a promessa de que o ganancioso vai ganhar muito dinheiro. Assim, a vítima pode estar em qualquer faixa etária.
Os idosos, como qualquer pessoa endinheirada, são nossas vítimas preferidas. Por temerem depender apenas de aposentadoria, por recearem precisar de auxílio dos filhos, que não querem incomodar... O temor da necessidade é a arma que utilizamos para lhes arrancar dinheiro.
Para finalizar, cito alguns procedimentos fraudulentos com os quais me dei bem em minha venturosa vida de estelionatário, antes de ser preso e ver meu castelo desmoronar: investimentos em inexistentes companhias de gás, oportunidades de grandes negócios mentirosos e venda de moedas de ouro, que, ao serem retiradas, já não valiam mais do que 20% do valor inicial...
Esses são apenas alguns truques que continuarão a ser utilizados por milhares de estelionatários como Vigarino e nos quais alguns deles você certamente já caiu ou cairá, meu esperto leitor, minha linda leitora.
Somente o trabalho honesto e a vida sóbria são fontes seguras da paz de consciência, morada de Deus, amigos leitores; não se esqueçam disso. Materialista não é só quem não crê em Deus; é quem faz das riquezas mundanas e prazeres da carne a finalidade básica de suas vidas e, muitas vezes, mandam os escrúpulos às favas como aquele famoso ministro da educação brasileira o fez.
Esses materialistas travestidos de cristãos são os mais visados por estelionatários como Vigarino.
Voltemos ao Eclesiastes: “E olhei eu para todas as obras que fizeram as minhas mãos, como também para o trabalho que eu, trabalhando, tinha feito, e eis que tudo era vaidade e aflição de espírito, e que proveito nenhum havia debaixo do sol".



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