Poema da amargura e da esperança
Hermes Fontes
Falar-vos de martírios e tormentos
É perpetrar amargas redundâncias,
Redizer minhas mágoas, minhas ânsias,
Renovar minhas síncopes de dor...
Não sorvo mais os tóxicos violentos
Do desespero e da melancolia,
Após a derrocada
Das construções de um sonho superior.
Tudo outrora, Senhor,
Na minha pobre vida abandonada,
Era o tédio cruel que me impedia
De vislumbrar a claridade intensa
Da luz do sol puríssimo da crença.
Tudo em volta de mim era a cegueira,
Que torturou a minha vida inteira,
Que me seguiu o espírito ambicioso!
A carne é pobre e é cheia de fraqueza,
Simbolizando o ciclo tenebroso
Das sínteses de dor da Natureza.
E a carne subjugou-me inteiramente,
Fez-me fraco e descrente,
E transformou a minha mocidade
Num montéo de ambições, de fama e glória,
Adormeceu-me aos cantos da vaidade
E me afastou da estrada meritória
Da crença e da bondade...
Misericordiosíssimo Senhor!
De tortura em tortura amargurado,
O meu frágil espírito inferior
Viu-se presa de trevas, no passado,
E a desgraça suprema o amortalhou.
Tudo sofri, de dor e de miséria,
Mas a tua bondade me levou
A esquecer a influência deletéria
Da carne passageira...
Rompeste a minha venda de cegueira
E divisei o excelso panorama
Do Universo infinito, que Te aclama
Como a fonte do amor ilimitado!
Relevaste, meu Deus, o meu pecado
E pude ouvir as harmonias puras
Que equilibram os mundos nas alturas!...
Cheio de amaridúlcida ansiedade,
A esperança o espírito me invade
Aguardando das lágrimas futuras
A minha redenção...
Que a confiança, pois, em Ti me anime,
Que no porvir a dor bela e sublime
Jorre em minhalma a luz da perfeição.
Hermes
Fontes nasceu em 1888 na Vila de Boquim, em Sergipe, e suicidou-se no Rio de
Janeiro em 26 de dezembro de 1930. Poeta de grande relevo emocional, deixou
firmada sua personalidade literária, tendo publicado Apoteoses, Gênese, Lâmpada
Velada e Fonte da Mata, seu último livro. O poema acima integra o livro Parnaso de Além-Túmulo, obra
psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.
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