Natal simbólico
Harmonias cariciosas atravessavam a paisagem, quando o lúcido
mensageiro continuou:
— Cada Espírito é um mundo onde o Cristo deve nascer…
Fora loucura esperar a reforma do mundo, sem o
homem reformado. Jamais conheceremos povos cristãos, sem edificarmos a alma
cristã…
Eis por que o Natal do Senhor se reveste de
profunda importância para cada um de nós em particular.
Temos conosco oceanos de bênçãos divinas,
maravilhosos continentes de possibilidades, florestas de sentimentos por
educar, desertos de ignorância por corrigir, inumeráveis tribos de pensamentos
que nos povoam a infinita extensão do mundo interior. De quando em quando,
tempestades renovadoras varrem-nos o íntimo, furacões implacáveis atingem
nossos ídolos mentirosos.
Quantas vezes, o interesse egoístico foi o nosso
perverso inspirador?
Examinando a movimentação de nossas ideias
próprias, verificamos que todo princípio nobre serviu de precursor ao
conhecimento inicial do Cristo.
Verificou-se a vinda de Jesus numa época de
recenseamento.
Alcançamos a transformação essencial justamente
em fase de contas espirituais com a nossa própria consciência, seja pela dor ou
pela madureza de raciocínio.
Não havia lugar para o Senhor.
Nunca possuímos espaço mental para a inspiração
divina, absorvidos de ansiedades do coração ou limitados pela ignorância.
A única estalagem ao Hóspede Sublime foi a
Manjedoura.
Não oferecemos ao pensamento evangélico senão
algumas palhas misérrimas de nossa boa vontade, no lugar mais escuro de nossa
mente.
Surge o Infante Celestial dentro da noite.
Quase sempre, não sentimos a Bondade do Senhor
senão no ápice das sombras de nossas inquietações e falências.
A estrela prodigiosa rompe as trevas no grande
silêncio.
Quando o gérmen do Cristo desponta em nossas
almas, a estrela da divina esperança desafia nossas trevas interiores,
obscurecendo o passado, clareando o presente e indicando o porvir.
Animais em bando são as primeiras visitas ao
Enviado Celeste.
Na soledade de nossa transformação moral, em
face da alvorada nova, os sentimentos animalizados de nosso ser são os
primeiros a defrontar o ideal do Mestre.
Chegam pastores que se envolvem na intensa luz
dos anjos que velam o berço divino.
Nossos pensamentos mais simples e mais puros
aproximam-se da ideia nova, contagiando-se da claridade sublime, oriunda dos
gênios superiores que nos presidem aos destinos e que se acercam de nós,
afugentando a incompreensão e o temor.
Cantam milícias celestiais.
No instante de nossa renovação em Cristo, velhos
companheiros nossos, já redimidos, exultam de contentamento na esfera superior,
dando glória a Deus e bendizendo os Espíritos de boa vontade.
Divulgam os pastores a notícia maravilhosa.
Nossos pensamentos, felicitados pelo impulso criador de Jesus, comunicam-se
entre si, organizando-se para a vida nova.
Surge a visita inesperada dos magos.
Sentindo-nos a modificação, o mundo observa-nos
de modo especial.
Os servos fiéis, como Simeão, expressam grande
júbilo, mas revelam apreensões justas, declarando que o Menino surgira para a
queda e elevação de muitos em Israel.
Acalentamos o pensamento renovador, no recesso
d’alma, para a destruição de nossos ídolos de barro e desenvolvimento dos
germens de espiritualidade superior.
Ferido na vaidade e na ambição, Herodes
determina a morte do Pequenino Emissário.
A ignorância que nos governa, desde muitos
milênios, trabalha contra a ideia redentora, movimentando todas as
possibilidades ao seu alcance.
Conserva-se Jesus na casa simples de Nazaré.
Nunca poderemos fornecer testemunho à
Humanidade, antes de fazê-lo junto aos nossos, elevando o espírito do grupo a
que Deus nos conduziu.
Trabalha o Pequeno Embaixador numa carpintaria.
Em toda realização superior, não poderemos
desdenhar o esforço próprio.
Mais tarde, o Celeste Menino surpreende os
velhos doutores.
O pensamento cristão entra em choque, desde
cedo, com todas as nossas antigas convenções relativas à riqueza e à pobreza,
ao prazer e ao sofrimento, à obediência e à mordomia, à filosofia e à
instrução, à fé e à ciência.
Trava-se, então, dentro de nosso mundo
individual, a grande batalha.
A essa altura, o mensageiro fez longa pausa.
Flores de luz choviam de mais alto, como
alegrias do Natal, banhando-nos a fronte. Os demais companheiros e eu
aguardávamos, ansiosos, a continuação da mensagem sublime; entretanto, o
missionário generoso sorriu paternalmente e rematou:
— Aqui termino minhas humildes lembranças do
Natal simbólico. Segundo observais, o Evangelho de Nosso Senhor não é livro
para os museus, mas roteiro palpitante da vida.
Do livro Pontos e contos, obra psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.
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