Lembranças
que despertam o coração
CÍNTHIA CORTEGOSO
cinthiacortegoso@gmail.com
De Londrina-PR
Tudo o que se vive, de uma forma ou
de outra, fica em nosso ser, torna-se ramificação. Muitas vezes, situações, que
nem imaginamos lembrar, avivam no sentimento com a intensidade do momento real.
E num fim de tarde caminhando na areia da praia, pude sentir o abraço de minha
avó e ver o seu sorriso calmo e em paz. Lembrei-me tão perfeitamente de sua
primeira vez na praia. Ela já tinha mais de sessenta anos e ainda não havia
sentido o toque da água salgada nos pés nem ouvido o som do mar.
Naquela época, eu era ainda muito
jovem, mas fiquei surpresa com o seu encanto e valor diante do mar. Na verdade,
o meu encanto foi fagulha comparado à intensidade com que ela sentiu tudo
aquilo. Cadeira de praia olhando tudo; chapéu na cabeça protegendo do sol, além
do presente protetor; brincadeira de criança na beirinha do mar, “ondinhas que
acariciam os pés”, minha avó assim dizia; paciência para encontrar as variadas
conchinhas de cores, tamanhos, formatos; sem faltar o milho verde cozido que
como ela adorou.
E foi quando avistei o carrinho de
milho verde cozido no fim de tarde que esse turbilhão voltou com a mesma real
impressão. Penso que naquele primeiro momento, minha avó demonstrou grande
sabedoria como a nobreza da simplicidade em ser feliz com os mais simples acontecimentos;
a humildade em ser tão pequenino perante a imensurável força da natureza, dos
oceanos; a igualdade entre as pessoas no curso da vida; a valorização por toda
a criação do Pai, aliás, incomparável criação; a sabedoria de que mesmo em meio
às pessoas e todo um andamento, somos seres individuais dotados de uma
consciência eterna.
Segundo Pablo Neruda, “tudo passa e
tudo fica”, e as boas lembranças que afloram de um adormecido fato alegram o
coração com tanta capacidade que vivenciamos tudo de novo, com a diferença de
que com os anos espera-se o amadurecimento. No entanto, as lembranças que nem
tanto nos aprazem também, conosco, estão. E do que já vivemos haverá sempre a
existência, porém, com a possibilidade de as difíceis lembranças transformarem-se
em sábios exemplos. E “tudo passa e tudo fica”.
O que muito importará é o olhar
aplicado a cada ação, difícil ou não, mas que sempre trará seu ensinamento, e
basta querer aprender para assim realizar. Mais sábio ainda é que a ação do
aprendizado não, necessariamente, precisa ser deveras vivida, porém, tanto se
pode assimilar com a observação e sensibilidade diante de infindáveis contínuos
acontecimentos diários. Com isso, vem a percepção de que há, sim, muitos
corações felizes vivendo, há muita sabedoria, há muita emoção, há a
simplicidade que aprecia a verdadeira vida.
E até hoje a lembrança alegre de
minha avó, agradecida e tão feliz, frente ao mar pela primeira e única vez,
traz o sorriso aos meus olhos e a felicidade ao meu coração, pois quando disso
me recordo compreendo a importância de viver o momento e valorizá-lo
muitíssimo, já que cada passagem é extraordinária, nunca mais se repete e por
isso não se pode melhorá-la ou revivê-la a não ser pela tênue lembrança.
O que não foi fácil e o que foi feliz
estarão em nosso coração para quando houver a necessidade de acessá-los. Tão
jubiloso será o coração que cada vez mais recordar-se e puder sorrir com os
olhos. Haverá o livre-arbítrio para as almejadas conquistas.
E os carrinhos de milho verde cozido
deixarão sempre meus olhos rasos d’água.
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