Os
fortes devem amparar, não esmagar os fracos
ASTOLFO O. DE OLIVEIRA FILHO
aoofilho@gmail.com
Nós
e Célia Cazeta – com quem estamos casado há mais de 57
anos – somos de famílias bastante numerosas. Ao todo, temos 17
irmãos, dez do nosso lado, sete do lado dela, e por conseguinte uma multidão de
sobrinhos e outro número já bem grande dos filhos destes.
Como sabemos, em uma
família numerosa nem todos conseguem o mesmo sucesso no âmbito profissional.
São diversas as razões. Há aqueles que conseguem oportunidades que faltam a
outros, condições mais favoráveis para estudar, facilidade na questão do
emprego, saúde em ordem e por aí vai. Deste modo há nas famílias em geral
alguns que conseguem uma situação econômica mais favorecida, enquanto outros
lutam com dificuldades para custeio das despesas correntes com escola, saúde e
até alimentação.
Cientes disso, sempre que podemos,
temos procurado fazer algo no sentido de minimizar as dificuldades de um e
outro familiar, geralmente com apoio de familiares generosos, o que não falta
nas famílias em que Célia Cazeta e nós fomos criados. Não se trata,
evidentemente, de nada especial, nada mais do que o cumprimento de um dever,
visto que entendemos que aqueles que podem ajudar devem fazê-lo sempre que se
apresentar a necessidade.
É uma faceta de uma máxima
conhecida, segundo a qual os fortes devem amparar os fracos, não esmagá-los.
Aquele que se encontra em condições de observar esse princípio, que transparece
com toda a clareza das páginas do Velho e do Novo Testamento, não pode
omitir-se, porque, assim agindo, estará perdendo uma excelente oportunidade de
fazer algo em favor do semelhante e atender a uma das principais recomendações
que Jesus nos legou: - Fazer aos outros o que quereríamos que os outros nos
fizessem, isto é, fazer o bem e não o mal. E isso independentemente de
ser o outro membro ou não de nossa família consanguínea, porque todos – é bom
enfatizar: todos – somos irmãos.
Além da perda da oportunidade de
ajudar, anos depois, com toda a certeza, o remorso decorrente de nossas
omissões tornar-se-á inevitável, especialmente quando tivermos de regressar à
pátria espiritual, onde cada um de nós terá de prestar contas do que fizemos
com os talentos que Deus nos emprestou.
Quando chegamos ao berço, nada
trazemos em termos materiais, nem mesmo o corpo físico que nossos pais cuidaram
de nos oferecer ao acolher-nos nesta nova etapa evolutiva. E quando voltamos,
também nada levamos, nem o corpo nem as vestes, nem o carro nem a casa, nem os
investimentos nem as propriedades, fato que levou o notável pensador Pascal
(Espírito) a escrever:
“O homem só possui em plena
propriedade aquilo que lhe é dado levar deste mundo. Do que encontra ao chegar
e deixa ao partir goza ele enquanto aqui permanece. Forçado, porém, que é a
abandonar tudo isso, não tem das suas riquezas a propriedade real, mas, simplesmente,
o usufruto. Que é então o que ele possui? Nada do que é de uso do corpo;
tudo o que é de uso da alma: a inteligência, os conhecimentos, as qualidades
morais. Isso o que ele traz e leva consigo, o que ninguém lhe pode
arrebatar, o que lhe será de muito mais utilidade no outro mundo do que neste.
Depende dele ser mais rico ao partir do que ao chegar, visto como, do que tiver
adquirido em bem, resultará a sua posição futura.” (Pascal. Mensagem recebida em Genebra em 1860, publicada no
cap. XVI, item 9, d´O Evangelho segundo o Espiritismo.) (1)
Em
face de tão claro ensinamento, apegar-se aos bens e aos recursos financeiros de
que dispomos, para calarmos ante as necessidades do próximo, é um equívoco que
devemos lembrar sempre aos nossos irmãos, filhos, amigos e sobrinhos.
De outro lado, fazer algo em favor
de alguém, por mínimo que seja, nos trará bênçãos incontáveis que nenhum
dinheiro do mundo é capaz de pagar. Não é que devamos ajudar para sermos
ajudados. É que assim é a vida, e disso temos inúmeros exemplos, especialmente
na literatura espírita.
Um desses exemplos nos é narrado
pelo Espírito de Humberto de Campos numa de suas obras. Falamos do caso
Barsabás, o rico e poderoso tirano.
Quando Barsabás demandou o reino da morte, buscou em
vão reintegrar-se no grande palácio que lhe servira de residência. Mas ninguém,
nem os familiares nem os amigos, lhe lembravam o nome, a menos que fosse para
reclamar o ouro e a prata que ele doara a mordomos distintos.
Depois
de muito sofrer no plano espiritual e vaguear por muito tempo no nevoeiro,
entre vozes acusadoras, certo dia aprendeu a orar, e, como se a rogativa lhe
servisse de bússola, embora caminhasse às escuras, eis que, de súbito, se lhe
extinguiu a cegueira e ele viu, diante de seus passos, um santuário sublime,
faiscante de luzes. Milhões de estrelas e pétalas fulgurantes povoavam-no em
todas as direções. Barsabás, sem perceber, alcançara a Casa das Preces de
Louvor, situada nas faixas inferiores do firmamento.
Não
obstante deslumbrado, chorou, impulsivo, ante o ministro espiritual que velava
no pórtico.
Após
ouvi-lo, generoso, o funcionário angélico falou sereno:
–
Barsabás, cada fragmento luminoso que contemplas é uma prece de gratidão que
subiu da Terra...
–
Ai de mim – soluçou o desventurado – eu jamais fiz o bem...
–
Em verdade – prosseguiu o informante –, trazes contigo, em grandes sinais, o
pranto e o sangue dos doentes e das viúvas, dos velhinhos e órfãos indefesos
que despojaste, nos teus dias de invigilância e de crueldade; entretanto, tens aqui,
em teu crédito, uma oração de louvor...
E
apontou-lhe acanhada estrela, que brilhava à feição de pequenino disco solar.
–
Há trinta e dois anos – disse, ainda, o instrutor –, deste um pão a uma criança
e essa criança te agradeceu, em prece ao Senhor da Vida.
Chorando
de alegria e consultando velhas lembranças, Barsabás perguntou:
–
Jonakim, o enjeitado?
–
Sim, ele mesmo – confirmou o missionário divino.
–
Segue a claridade do pão que deste, um dia, por amor, e livrar-te-ás, em
definitivo, do sofrimento nas trevas.
Barsabás
acompanhou o tênue raio do tênue fulgor que se desprendia daquela gota estelar,
mas, em vez de elevar-se às alturas, encontrou-se numa carpintaria humilde da
própria Terra.
Ali
um homem calejado refletia, manobrando a enxó em pesado lenho... Era Jonakim,
aos quarenta anos de idade. Como se estivessem os dois identificados no doce
fio de luz, Barsabás abraçou-se a ele, qual viajante abatido, de volta ao calor
do lar.
Decorrido
um ano, Jonakim, o carpinteiro, ostentava, sorridente, nos braços, mais um
filhinho, cujos louros cabelos emolduravam belos olhos azuis. Com a bênção de
um pão dado a um menino triste, por espírito de amor puro, conquistara
Barsabás, nas Leis Eternas, o prêmio de renascer para redimir-se. (2)
(2) Do conto História de um pão, autoria de Irmão X, pseudônimo usado pelo Espírito de Humberto de Campos, publicado no livro O Espírito da Verdade, psicografado pelos médiuns Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira.
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