O
perdão dos homens e o perdão de Deus
ASTOLFO
O. DE OLIVEIRA FILHO
aoofilho@gmail.com
De
Londrina-PR
Muito frequentemente interpretamos o
perdão como sendo simples ato de virtude e generosidade, em auxílio do ofensor,
que passaria a contar com absoluta magnanimidade da vítima.
Preciso
é perceber, porém, que, quando conseguimos desculpar o erro ou a provocação de
alguém contra nós, exoneramos o mal de qualquer compromisso para conosco, ao
mesmo tempo que nos desvencilhamos de todos os laços suscetíveis de apresar-nos
a ele.
Mágoa
retida é doença para o Espírito, a quem corrói as forças físicas e envenena a
alma. É necessário, para a própria paz, ante quaisquer ofensas, perdoar sempre.
Eis por que Jesus disse a Pedro que não se deveria perdoar apenas sete vezes,
mas setenta vezes sete vezes.
Há,
porém, duas maneiras bem diferentes de perdoar. Uma, grande, nobre,
verdadeiramente generosa, sem pensamento oculto, que evita, com delicadeza,
ferir o amor-próprio e a suscetibilidade do adversário, ainda quando este
último nenhuma justificativa possa ter.
A
outra é aquela em que o ofendido, ou aquele que tal se julga, impõe ao outro
condições humilhantes e lhe faz sentir o peso de um perdão que, ao invés de acalmar,
irrita. Se estende a mão ao ofensor, não o faz com benevolência, mas com
ostentação, de modo a mostrar aos outros: - Vejam como sou generoso! Em
tais circunstâncias, é impossível uma reconciliação sincera de parte a parte,
visto que não há nesse modo de perdoar qualquer generosidade, mas tão somente
uma forma de satisfazer ao orgulho.
No
convívio familiar somos, constantemente, chamados a perdoar, porque estamos,
muitas vezes, diante de antigos desafetos de outras existências que se
apresentam hoje sob a forma de cônjuge, filhos ou familiares próximos.
Precisamos, por isso, muito mais de perdão dentro de casa do que na arena
social, e muito mais de apoio recíproco no ambiente em que somos chamados a
servir do que nas avenidas do mundo.
Em
auxílio a nós mesmos, temos necessidade de cultivar compreensão e apoio
construtivo, no amparo sistemático a familiares e vizinhos, chefes e
subalternos, clientes e associados, respeito constante à vida particular dos
amigos íntimos, tolerância para com os entes amados, com paciência e
esquecimento diante de quaisquer ofensas que nos assaltem o coração.
Agindo
assim, teremos condições de entender o perdão que Deus confere às suas
criaturas, cientes de que o Criador perdoa concedendo ao devedor prazo
ilimitado e facultando-lhe meios e possibilidades de resgatar o débito. Ora,
que mais pode querer um devedor honesto e probo?
O
perdão não é, portanto, uma graça concedida por Deus. Há necessidade do
arrependimento com a consequente rogativa de perdão. O arrependimento é a
confissão íntima da violação das leis morais, revelando-se não só pela
insatisfação com o ato praticado, mas pelo empenho de repará-lo e não mais
incidir no mesmo cometimento. O arrependimento pode dar-se por toda a parte e
em qualquer tempo, mas, embora seja o primeiro passo para a regeneração, por si
só não basta. É preciso acrescentar a ele a expiação e a reparação.
O
Espiritismo ensina que o efeito do arrependimento é o de desejar o arrependido
uma nova encarnação para se purificar e na qual possa expiar suas faltas. A
concessão renovadora para o infrator, traduzindo o perdão divino, se efetiva
com a aceitação da programação cármica pelo perdoado.
A
expiação se cumpre durante a existência corporal, mediante as provas que o
Espírito enfrenta, e, na vida espiritual, pelos sofrimentos morais por que
passa, inerentes ao seu estado de inferioridade.
Após
a expiação dos erros passados, vem, finalmente, a reparação, que consiste em
fazer o bem àqueles a quem se fez o mal. Quem não repara seus erros numa
existência, por fraqueza ou má vontade, achar-se-á numa existência ulterior em
contacto com as mesmas pessoas a quem houver prejudicado, e em condições voluntariamente
escolhidas, de modo a demonstrar-lhes reconhecimento e fazer-lhes tanto bem
quanto mal lhes tenha feito.
Praticando o bem em compensação ao mal
praticado, isto é, tornando-se humilde se foi orgulhoso, amável se foi austero,
caridoso se foi egoísta, benigno se foi perverso, laborioso se foi ocioso, útil
se foi inútil, frugal se foi intemperante – trocando, em suma, por bons os maus
exemplos perpetrados, o Espírito arrependido colhe desse esforço o seu próprio
melhoramento e caminha a passos largos para a perfeição, meta final de todos
nós, criaturas de Deus.
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