Comunicações
mediúnicas entre vivos
Ernesto Bozzano
Parte 3
Damos prosseguimento ao estudo do clássico Comunicações mediúnicas entre vivos, de autoria de Ernesto Bozzano, traduzido
para o idioma português por J. Herculano Pires e publicado pela Edicel.
Esperamos que este estudo sirva para o leitor como uma
forma de iniciação aos chamados Clássicos do Espiritismo.
Cada parte do estudo compõe-se de:
a) questões preliminares;
b) texto para leitura.
As respostas às questões propostas encontram-se no final do
texto indicado para leitura.
Este estudo será publicado sempre às sextas-feiras.
Questões preliminares
A. Um sensitivo, projetando suas faculdades perceptivas a distância,
pode influenciar as pessoas visualizadas, transmitindo-lhes os próprios
pensamentos ou sugerindo-lhes a prática de uma determinada ação?
B. O que demonstram fatos como o narrado pelo Sr. Barret, citado na
questão precedente?
C. Admitindo a realidade do fato acima narrado, que conclusões dele podemos
extrair?
Texto para leitura
Caso 3
36. Este caso foi transcrito da Light (1898,
pág. 375) e, segundo Bozzano, trata-se de um caso muito instrutivo de “vontade
sugestionante” e de “lucidez” desenvolvida em uma distinta escritora
norte-americana. O narrador é o Sr. Harrison D. Barret, diretor de Banner
of Light e presidente da National Spiritualist Association dos
Estados Unidos da América do Norte. É longo o relatório e, conquanto o
incidente que realmente interessa esteja em curto parágrafo, ele decidiu
relatar um longo trecho, dado o valor teórico que os fatos apresentam. Escreve
o Sr. Barret:
Trata-se de uma jovem senhora a quem o
relator teve a honra de ser recentemente apresentado. Nela se desenvolvem
espontaneamente faculdades de clarividência, sem que conhecesse coisa alguma do
que a propósito ensina o Ocultismo. Em grau menor existem as mesmas faculdades
em dois outros membros da família, porém como os sentimentos destes últimos são
contrários a tal sorte de manifestações, eles as reprimem sistematicamente.
É costume da senhora projetar as suas
faculdades perceptivas em direção à irmã e ao irmão que residem nos “Midlands”
e assim procedendo ela os percebe nas situações em que se acham na ocasião,
situações essas que depois lhe são confirmadas em cartas.
Uma vez viu seu cunhado subindo numa escada
a pregar na parede uma série de pregos nos quais dependurava outros tantos
quadros. O fato a surpreendeu porque ela sabia que o seu cunhado não possuía os
quadros que estava vendo, mas quando lhe escreveu veio a saber, pela resposta,
que realmente ele estava colocando na parede os mesmos quadros que ela vira,
quadros que obtivera em virtude de um legado.
Por meio da sugestão mental conseguiu que um
membro da família interrompesse uma carta que estava escrevendo, a pusesse de
lado e escrevesse outra carta que ela ditou mentalmente. E ele escreveu até o
fim a segunda carta, meteu-a no envelope, pôs o endereço e selou, depois voltou
a escrever a carta que havia interrompido. Tudo isso ocorreu sem a troca de uma
única palavra e só três horas depois é que revelou tudo ao seu parente, o qual
ficou um pouco contrariado e pediu que lhe fosse devolvida a carta que ela lhe
havia ditado por sugestão, mas era tarde porque já fora posta no correio.
Quando projeta as suas faculdades
perceptivas a distância ela pode influenciar as pessoas visualizadas,
transmitindo-lhes os próprios pensamentos ou sugerindo-lhes a prática de uma
determinada ação. Assim, por exemplo, ela lhe sugere que a venha visitar numa
hora preestabelecida, o que nunca se deixa de realizar. Quando transmite ordens
mentais, percebe os pensamentos das pessoas com as quais está em afinidade,
como se conversasse de viva voz com elas, mas não fica certa do êxito da
experiência enquanto não se verifica a ação sugerida. A projeção das suas
próprias faculdades perceptivas em direção ao paciente determina um “circuito”
de retorno que reage sobre ela e, dessa forma, é informada do êxito da
experiência.
Quando deseja comunicar-se com pessoa de
longe, começa por suprimir qualquer relação com o ambiente exterior, fechando
os olhos e sobrepondo-lhes as mãos. Depois concentra intensamente o pensamento
sobre a pessoa que deseja ver, evitando rigorosamente deixar-se colher pela
mínima distração. Se pensar no ambiente em que se acha a pessoa que deseje ver
ou em coisas que a mesma lhe sugere, falhará a experiência. Algumas vezes
atinge o alvo imediatamente, outras vezes tem que sustentar a prova por uns
vinte minutos. Enquanto não vê a pessoa visualizada, abstém-se de transmitir a
mensagem e, quando o fato se realiza, sente-se na presença da
pessoa. Algumas vezes tem tentado tocá-la e a vê reagir imediatamente. Em geral
as pessoas sobre as quais projeta o pensamento tomam conhecimento de sua
presença ou pelo menos pensam nela. Ela não distingue o ambiente em
que se acha a citada pessoa a menos que se proponha vê-lo como também não
percebe a paisagem que tem de atravessar para chegar à pessoa visualizada. Com
respeito a esta última circunstância o relator obteve dela a promessa de tentar
visualizar os detalhes das paisagens interpostas de caminhos percorridos,
pessoas encontradas, etc.
O esforço que ela faz nessas circunstâncias
a esgota sensivelmente e algumas vezes sente dor de cabeça. Vivendo só, procura
a companhia dos parentes, recorrendo às suas faculdades de vidente, as quais
desenvolveu tanto que agora funcionam espontaneamente, sem intenção alguma de
sua parte. Ocorreu-lhe isso algumas vezes enquanto guiava a sua caleça,[i] o que se torna um inconveniente
muito sério, porque durante esse estado fica inconsciente do ambiente que a
cerca, de modo que por duas vezes o cavalo se desviou, indo esbarrar na cerca
da estrada, onde ela caiu, despertando-se bruscamente para a vida normal, de
forma bem pouco agradável. Ela é de opinião que em tais condições de
clarividência realiza-se a projeção a distância de seu próprio “duplo”, e isto
porque vê o seu próprio corpo deitado no divã.
Além disso distingue repetidas vezes os
“duplos” de outras pessoas vivas, algumas das quais vinham visitá-la em seu
quarto, como também distingue e comunica-se mentalmente com pessoas mortas,
separando facilmente os fantasmas de vivos e de mortos pelo grau diverso de
densidade com que lhe aparecem: os fantasmas dos vivos são muito mais densos do
que os dos mortos. Ela conserva lembrança de suas experiências, conquanto se
realizem evidentemente durante uma “segunda condição” de sensitiva. (1ª
Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento: caso 3.)
37. Este é o mais interessante caso
referido pelo diretor da revista Banner of Light, que o comenta
brevemente, nas seguintes palavras:
Este caso demonstra, de modo absoluto, que o
“controle mediúnico” consiste na transmissão telepática do pensamento e não em
uma encarnação temporária do espírito comunicante no organismo do médium. O
mesmo se diga dos fenômenos de “obsessão” e “possessão”, que, baseados no caso
exposto, deveriam ser considerados como determinados pelo fato de o paciente
ser dominado por uma ideia. Quer dizer que a mente do paciente, achando-se
temporariamente em condições de ideação negativa, torna-se fácil presa de uma
ideia sugestionante de origem extrínseca, ideia essa que pode dominá-lo e
obsidiá-lo, degenerando numa representação monoideística. Este caso demonstra
também que a chamada “presença de um espírito” não implica, de modo algum, a
ideia de que ele se ache efetivamente presente. Antes, a uniformidade das leis
naturais tenderia a fazer presumir que as manifestações espíritas sejam
consequência de uma projeção de força ou de pensamento da entidade comunicante,
conforme se verifica no caso exposto. (1ª Categoria: Mensagens
experimentais no mesmo aposento: caso 3.)
38. Estas são as considerações racionais e
instrutivas que o relator faz do interessante caso referido, cujo valor técnico
é notabilíssimo, não porque encerre modalidades novas de manifestação, mas pelo
desenvolvimento completo que nele assumem alguns episódios. (1ª
Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento: caso 3.)
39. Começando pelo incidente que diretamente
nos interessa, não se pode negar que o fato de conseguir-se, pela transmissão
do pensamento, que uma pessoa interrompa uma carta que estava escrevendo, a fim
de começar outra que lhe é ditada por uma vontade extrínseca, sem que a pessoa
sugestionada tenha conhecimento de se haver tornado instrumento passivo em mão
de outrem – não se pode negar, repita-se, que um completo incidente de tal
natureza seja um tanto raro nos anais dos fenômenos magnéticos e
hipnóticos. (1ª Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento:
caso 3.)
40. Recordamos um episódio semelhante ao
narrado, o qual se encontra no livro do Prof. Flournoy, Esprits et
Mediums, pág. 90. Neste, a Sra. Prell sonha que está fazendo uma visita à
sua amiga, a Sra. Zora, dotada de mediunidade escrevente, e que lhe faz certo
discurso. Em tal momento, a Sra. Zora, que acabava de levantar-se e estava
absorvida no trabalho, é tomada por um impulso de escrever automaticamente e,
assim procedendo, manifesta-se-lhe a sua amiga Sra. Prell, que lhe dita longo
discurso, idêntico no conteúdo, senão na forma, ao discurso do sonho. (1ª
Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento.)
41. Do ponto de vista do paralelismo entre
os fenômenos anímicos e espíritas, tais episódios são altamente sugestivos
porque valem para tornar mais inteligíveis as modalidades em que se realizam as
comunicações com os mortos, pois que, se a vontade de um vivo pode ditar
mentalmente uma carta, palavra por palavra, servindo-se do cérebro e mãos de
outrem, ou pode transmitir a distância o conteúdo de um longo discurso, nada
impede que se acolham, como legítimas e verdadeiras, as explicações dadas em
tal sentido pelas personalidades dos mortos, que afirmam transmitir as suas
mensagens agindo telepaticamente pela sua vontade sobre o cérebro dos médiuns. (1ª
Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento.)
42. Bozzano destaca ainda as seguintes
passagens:
“Quando transmite ordens mentais, ela
percebe os pensamentos das pessoas com as quais está em relação, como se estas
conversassem com ela, de viva voz.”
“Geralmente as pessoas sobre as quais
projeta o seu pensamento têm consciência de sua presença, ou pelo menos pensam
nela.”
“Ela é de opinião que em tais
condições de clarividência realiza-se a projeção, a distância, do seu próprio
‘duplo’, e isto porque ela vê o seu próprio corpo deitado, inerte, no
divã.” (1ª Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento.)
43. As passagens citadas nos levam a
presumir que, na sensitiva em questão, as faculdades de transmissão telepática
do pensamento se alternam muitas vezes com os fenômenos de “bilocação” ou
projeção a distância do seu corpo fluídico. Em tal caso, porém, não devem ser
tomadas ao pé da letra as impressões da vidente, isto é, que as pessoas por ela
visualizadas conversem com ela, de viva voz. (1ª Categoria: Mensagens
experimentais no mesmo aposento.)
44. Tais pessoas, indubitavelmente, não se
portariam desse modo, pois que não existem exemplos de tal natureza em toda a
casuística do gênero, conquanto seja verdade que as pessoas que recebem um
impulso telepático, muitas vezes se tornam conscientes de uma presença ou pensam na
pessoa que, naquele momento, se acha em relação psíquica com elas. (1ª
Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento.)
45. Deve-se presumir, portanto, que as
conversações de que se trata ocorrem entre as personalidades integrais
subconscientes dos protagonistas e, como isso não faz diferença para os
videntes, os quais desenvolvem os seus diálogos com as pessoas visualizadas, é
natural que neles se produza a ilusão de uma conversa de viva voz, ilusão ou
alucinação tão viva e infalível que constitui a regra em tais experiências. O
próprio William Stainton Moses a ela se sujeitava. Este, certo dia, resolveu
pedir explicação a tal respeito ao seu guia “Imperator” e isto por ocasião de
um incidente desse gênero, em que ele estava convencido de ter conversado de
viva voz com pessoas distantes, que vira num cortejo fúnebre. (1ª
Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento.)
46. Moses perguntou: “Em tais circunstâncias
(do desdobramento fluídico) poderia tornar-me visível aos presentes?” O guia
“Imperator” respondeu:
“Não estarias visível a olhos humanos, se
bem que a presença de teu espírito pudesse impressionar a mente de alguns dos
presentes que pensassem em ti, como dizeis vós outros. Muitas
vezes isto se verifica por efeito da vontade dos espíritos que atraem o
pensamento das pessoas com as quais se acham em relação. Referindo-me ao teu
caso, observo que, como no cortejo não havia pessoas com as quais estivesses
vinculado espiritualmente pela lei de afinidade, não terias podido tornar-te
visível, mesmo que nós o houvéssemos desejado. Afirmas ter dirigido a palavra a
alguém no cortejo, recebendo resposta, mas em verdade exercitaste as
faculdades espirituais de transmissão e leitura do pensamento, faculdades
de que se servem os espíritos para conversar entre si. Estavas em condições
transitórias de desencarnado e por isso exercitaste as faculdades espirituais
que em raras circunstâncias são exercitadas também pelos vivos em forma de
clarividência. Em conclusão, não conversaste realmente com pessoa
alguma, porém não deixa por isso de ser verdade o que afirmas.” (William
Stainton Moses, Spirit Teachings, 2ª série, pág. 85). (1ª
Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento.) (Continua
na próxima edição.)
[i] Caleça – Carruagem
de quatro rodas e dois assentos, puxada por uma parelha de cavalos. (Dicionário
Aurélio Século XXI)
Respostas às
questões preliminares
A experiência diz
que sim, como mostra o depoimento dado pelo Sr. Harrison D. Barret, diretor de Banner
of Light e presidente da National Spiritualist Association dos
Estados Unidos da América do Norte,
segundo o qual uma sensitiva conseguiu, por meio da sugestão mental, que um
membro da família interrompesse uma carta que estava escrevendo, a pusesse de
lado e escrevesse outra carta que ela ditou mentalmente. Bozzano, que
transcreveu o caso, comentou-o em seguida. (Comunicações mediúnicas entre
vivos - 1ª Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento: caso 3.)
B. O que demonstram fatos como o narrado pelo Sr. Barret,
citado na questão precedente?
Esse fato demonstra, de modo absoluto, que o “controle
mediúnico” consiste na transmissão telepática do pensamento e não em uma
encarnação temporária do espírito comunicante no organismo do médium. O mesmo
se diga dos fenômenos de “obsessão” e “possessão”, que, baseados no caso
exposto, deveriam ser considerados como determinados pelo fato de o paciente
ser dominado por uma ideia. E demonstra também que a chamada “presença de um
espírito” não implica, de modo algum, a ideia de que ele se ache efetivamente
presente. (1ª Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento: caso 3.)
C. Admitindo a realidade do fato acima narrado, que
conclusões dele podemos extrair?
As observações são de Ernesto Bozzano: Se a vontade de um
vivo pode ditar mentalmente uma carta, palavra por palavra, servindo-se do
cérebro e mãos de outrem, ou pode transmitir a distância o conteúdo de um longo
discurso, nada impede que se acolham, como legítimas e verdadeiras, as
explicações dadas em tal sentido pelas personalidades dos mortos, que afirmam
transmitir as suas mensagens agindo telepaticamente pela sua vontade sobre o
cérebro dos médiuns. (1ª Categoria: Mensagens experimentais no mesmo aposento.)
Observação:
Para acessar a 2ª Parte deste estudo, publicada na semana passada,
clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2024/01/comunicacoes-mediunicas-entre-vivos_0874258711.html
Como consultar as matérias deste
blog? Se você não o conhece, clique em Espiritismo
Século XXI e verá como utilizá-lo e seus vários recursos. |
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