sábado, 13 de janeiro de 2024

 



O Sonho do Agricultor

 

JORGE LEITE DE OLIVEIRA

jojorgeleite@gmail.com

 

Meu amigo Agricultor costuma devanear acordado, por isso já foi também chamado de Voador. Na última madrugada, adormeceu quando o relógio marcava 1h. Antes de dormir, refletiu sobre obra que reputa da máxima importância nos dias atuais. Como lavra também as letras, o Agricultor propusera a uma notável editora seu trabalho de alguns anos na língua portuguesa atual, como ocorre com as bíblias contemporâneas. Entretanto, em virtude de tal obra provocar suscetibilidades, antes de dormir, refletiu que talvez sua proposta fosse mal compreendida.  

Nessa noite, o Agricultor teve o sonho mais lindo de toda a sua vida. Viu-se no segundo andar de um shopping e dirigindo-se a um balcão para solicitar um documento importante. Havia, porém, uma razoável fila com outros postulantes a documento semelhante, e nosso amigo dirigia-se para o final da fila, quando ouviu a moça do atendimento chamá-lo: — Sr. Agricultor, Sr. Agricultor!

Ainda sem entender bem o motivo de ser convidado a fura-fila, meu amigo foi conferir se o chamado era ele mesmo. Aproximou-se da moça do balcão de atendimento, sem que ninguém reclamasse de seu gesto, e viu um papel na mão dela com um bilhete de juiz com a ordem de entregar, prioritariamente, a nosso amigo algumas cópias do documento. Quando recebeu as cópias, ainda foi informado de que o documento original lhe seria entregue no prazo de dez dias.

O Agricultor, tratado como amigo do juiz, observou, ao se afastar, que as folhas recebidas cortavam um pedaço da informação, mas considerou isso desprezível em relação ao conteúdo, que já conhecia. Ao se afastar, foi recebido pelo magistrado, que estava mais adiante, com um abraço e a despedida de até breve.

Enquanto caminhava para descer ao andar abaixo, nosso amigo viu todo o piso de cima aplaudi-lo. Com naturalidade, ele também bateu palmas, até alcançar, pela escada, o andar inferior. Para sua surpresa, também todas as pessoas que ali estavam aplaudiam-no freneticamente, ao que ele também correspondeu.

Despertou, por momentos, antes de adormecer novamente e entrar noutros sonhos, e pensou: — Este sonho eu não posso esquecer. E, de fato, ao acordar no raiar do dia, após ter sonhado novamente, o sonho anterior manteve-se vivo em sua memória.

Antes de levantar-se da cama, outra lembrança aflorou-lhe à mente. E se eu propusesse ao meu amigo diretor submeter meu livro aos demais diretores, além de seu conselho consultivo, mas não como obra pessoal, e sim como um trabalho da equipe da casa? Como não gosta de perder tempo, entrou em contato com o diretor e reiterou-lhe sua proposta para que, no tempo certo, fosse tomada uma decisão sobre o importante livro, cuja autoria, se aprovada constará como: Equipe da Casa X.

Como somos muito amigos, encontrei o Agricultor em conhecida livraria e dele ouvi esta linda história que agora lhe repasso, alma querida. Quem sabe os dez dias sonhados para o recebimento do documento original não significam dez meses, ou dez anos que terá de aguardar até que a obra proposta à editora, citada no início desta crônica, seja editada? De uma coisa, ele disse-me que tem certeza: um dia a obra ainda será publicada. Então não mais para satisfazer à sua vaidade, mas a um trabalho em equipe, que simbolicamente pode significar os pedaços cortados nas cópias recebidas durante seu sonho.

Paz e luz!

         

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