No campo, em velha casa
inglesa, periodicamente começou a aparecer uma jovem materializada. No último
domingo de cada mês, era vista por todos, com indisfarçável assombro. E porque
na região escasseasse o conhecimento espírita, os inquilinos lá não paravam.
O pequeno solar vivia constantemente fechado.
Acontece, no entanto, que uma família de Londres se transferiu para o pequeno
burgo e passou a ocupá-la.
– “O lugar é assombrado” – diziam todos os
vizinhos.
O velho chefe da casa, porém, marinheiro
recentemente aposentado, possuía vasto cabedal de conhecimentos mediúnicos e
não se deu por achado.
Com efeito, no dia indicado, a entidade surgia
em determinado aposento, demorando-se largo tempo diante de antiga penteadeira.
Os dois rapazelhos, filhos do casal, assustaram-se, a princípio, mas o
progenitor, após preparar-se por um mês de oração e leitura edificante,
deliberou falar com o fantasma.
Quando a jovem se corporificou, plena de
beleza, o ex-marujo entrou reverente no quarto e saudou-a, em nome do Cristo. A
moça retribuiu, confortada, e ele perguntou por que motivo se dispunha, assim
tão bela, a visitar sítio tão solitário e sem qualquer atração.
A menina-mulher explicou, em linguagem
fidalga, que ali vivera no século XVI e que lhe aprazia recordar, quando
possível, a existência feliz que desfrutara junto dos pais, acrescentando que a
aristocrática penteadeira fora presente do noivo que perecera no mar. Sentia
imenso consolo ao contemplá-la, porque ainda não lhe fora permitido reunir-se,
para sempre, ao escolhido do coração.
Respeitoso, o dono da casa procurou
esclarecê-la, comunicando-lhe, sem rebuços, que ela não mais pertencia ao mundo
dos chamados vivos, travando-se entre os dois curioso entendimento.
– Como vê, minha irmã, você não mais se
encontra encarnada na Terra.
– Sei perfeitamente tudo isso – falou a
jovem, sorrindo. – Tenho minhas atividades e sonhos no Plano Espiritual e estou
consciente de minha responsabilidade.
– Deve então afastar-se daqui.
– Oh! oh! por quê?
E batendo na cana do braço esquerdo, disse o
interlocutor, mais franco:
– Porque nós aqui somos homens.
A moça exibiu imensa agonia moral no
semblante, e indagou:
– Quer dizer, então, que o senhor é alguém
que se veste de carne, carregando vísceras cheias de sangue, com cheiro de
animais abatidos e de vegetais mortos? O senhor expele gases que fazem lembrar
o sepulcro? Quando tosse derrama líquidos grossos a que chamam saliva e
catarro? Quando trabalha expele através dos poros uma água salgada de nome suor
que recorda o ambiente dos peixes apodrecidos no mar?
O ex-marujo, surpreendido, pôde apenas
confirmar:
– Sim, sim...
A bela entidade materializada fitou-o com
evidente horror e gritou:
– Que medo! Socorro, ó Deus dos Céus!
Livrai-me do fantasma terrestre!...
E dizem que nunca mais voltou.
Do livro Almas em Desfile, obra
psicografada pelos médiuns Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira.
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