sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

 



O Espiritismo perante a Ciência

 

Gabriel Delanne

 

Parte 43

 

Continuamos o estudo do clássico O Espiritismo perante a Ciência, de Gabriel Delanne, conforme tradução da obra francesa Le Spiritisme devant la Science.

Nosso objetivo é que este estudo possa servir para o leitor como uma forma de iniciação aos chamados Clássicos do Espiritismo.

Cada parte do estudo compõe-se de:

a) questões preliminares;

b) texto para leitura.

As respostas às questões propostas encontram-se no final do texto abaixo. 

 

Questões preliminares

 

A. É verdade que nos fenômenos de transporte o médium fica fatigado?

B. Como o Espírito explicou a passagem do objeto transportado pela parede do recinto?

C. Durante o transporte qual é o estado do médium?

 

Texto para leitura

 

951. Eis como Vincent relatou, em notas datadas de 28 de setembro de 1880, como se deu o primeiro transporte, obtido em sua casa, com portas e janelas fechadas:

“Já há alguns dias magnetizo o médium todas as noites. Essa recomendação me foi feita pelo Espírito que quer produzir o transporte, a fim de bem dispor o sensitivo, que não é bastante forte para efeitos físicos, de modo a que seja possível obter espontaneamente com seus fluidos um tal fenômeno. Magnetizo-o, pois, ainda esta noite. Logo que adormeceu, chegou o Espírito. Eu o interrogo como se falasse a um espírito encarnado. Ele me entende e seu pensamento formula uma resposta que impressiona o cérebro do médium adormecido. Este me transmite, então, de viva voz, como se ela fosse emitida por seu pensamento, a frase que acaba de ouvir; faço, depois, outra pergunta, e a conversa continua até que o Espírito, percebendo o médium fatigado, me aconselha que o acorde.

– É provável – disse ele – que eu possa fazer amanhã meu transporte.

– E que nos trareis? – pergunto.

– Tenho dois objetos em vista. Estão ambos na Inglaterra, em Londres. Um é uma imagem que dei à minha irmã, no século passado. Há palavras inglesas, por trás. O outro é uma lembrança que o médium deu, outrora, a pessoa amiga. Trarei – acrescentou o Espírito – um ou outro, talvez ambos.

– Ireis, então, buscá-los na Inglaterra?

– Irei. Podes agora acordá-lo. Até amanhã.

– Acordo o médium. A sessão durou um quarto de hora.

No dia seguinte, 29 de setembro, magnetizo o médium às 9 horas da noite. O Espírito chega e me diz que vai produzir o fenômeno. Seguindo-lhe os conselhos, fiz o médium deitar-se no chão. O Espírito manda que apague a luz, o que faço. Colocado perto do médium, ouvir-lhe-ia os menores movimentos. Ele não se mexe.

Espero. Ao fim de dois ou três minutos, o médium me diz, sempre adormecido:

– Ele me apresenta alguma coisa, mas não posso tomá-la.

– Que lhe apresenta ele?

– Ah, põe-na a meu lado.

Dirijo-me, então, ao Espírito:

– Estais ainda aí?

Ele responde com voz fraca:

– Estou; voltarei, amanhã, e dar-te-ei pormenores. Acorda-o.

Acendo a lâmpada e encontro, ao lado do médium, uma imagem um tanto semelhante a essas gravuras que as jovens trazem em seus livros sagrados; num lado, há um desenho representando uma rosa colorida e, por trás, as seguintes palavras em inglês: For my dear Rika, October, 1783.”

952. Segundo Vincent, em uma abertura, feita na imagem, acima da rosa, passavam três pequenas fitas brancas, um pouco desbotadas. Numa, ele leu, bordadas, estas palavras: Eu sou o pão da vida. Na outra: God is love. E na terceira: Cristo é minha vida. As fitas tinham algumas dobras, mas a imagem estava intacta, e seria absolutamente impossível, rodeada como é, de um rendado muito frágil, que esse rendado não se amarrotasse e partisse, se o médium tivesse trazido consigo esses objetos para os colocar a seu lado. “Repito, aliás, que ele não fez um único movimento durante a experiência. Acha-se como aniquilado nas almofadas em que o deitei e tenho muito trabalho em acordá-lo”, afirmou Vincent, acrescentando que o médium ficou muito fatigado, durante a noite e no dia seguinte. Era como uma espécie de esgotamento; não havia dor, mas lassidão geral.

953. Prossegue o relato de Vincent:

“No outro dia, às 9 e meia da noite, magnetizo o médium; o Espírito chega.

– O médium ficou muito fatigado – diz ele – por esse transporte; assim, não convém prolongar-lhe o sono. Desejaria que lhe tivesse observado o coração e as pulsações. Terias notado que elas eram menos fortes que de costume, que ele não estava mais em seu estado ordinário.

– Podeis dizer-me como procedestes?

– Não tão bem quanto queria. Foi por uma espécie de absorção do fluido vital. Nós nos impregnamos dos fluidos do médium.

– Queria também perguntar como pudestes fazer com que esses objetos atravessassem a parede, desde que o quarto da experiência não tem chaminé, e as portas e as janelas estavam fechadas?

– Fui buscar os objetos de dia, com os fluidos tomados do médium. Desmaterializei-os nos lugares em que eles se achavam, porque estavam em duas casas diferentes; depois, quando eles se tornaram fluídicos, por essa primeira operação, transportei-os para aqui, fazendo-os atravessar a parede, como eu mesmo a atravesso. Tomei-os, em seguida, materiais, com outros fluidos tomados do médium, que acabavas de adormecer. A imagem fora dada por mim, antigamente, a minha irmã, chamada Frederika ou Rika, por abreviação, na época em que habitávamos Londres, depois de ter deixado a Alemanha. Quanto às três pequenas fitas, foi o médium quem as deu, há quinze ou dezesseis anos, a uma pessoa amiga, morta depois em Londres. Agora, acorda o médium.

Acordo-o; são dez horas e um quarto. Tal é a história desse primeiro transporte. Durante muitos dias interroguei o mesmo Espírito para saber alguns detalhes sobre a maneira pela qual se operava o fenômeno. Ele dizia sempre que não me podia explicar melhor do que o houvera feito.”

954. Segundo Vincent, no dia 11 de novembro de 1880, outro Espírito deu esta resposta pela escrita medianímica: “Pediste ao nosso amigo uma explicação do fenômeno dos transportes. O mais erudito Espírito não poderia resolver certos problemas, que explicaria por meio de aparelhos especiais, se vivesse na Terra. A matéria cósmica tem sempre o maior papel nas operações dos Espíritos. Analisar como se desagrega um corpo sólido com o auxílio dessa matéria, não é fácil, pois que o Espírito nem sempre sabe exatamente como opera. É preciso contar também com a vontade do Espírito que quer fazer alguma coisa. Em suma, os termos nos escapam. Sê indulgente e crê nos vossos amigos.”

955. Na descrição desse transporte, notamos que o estado do médium é vizinho da catalepsia e que houve perda de fluido vital. As explicações dos Espíritos não parecem trazer grande luz ao assunto, mas, com os conhecimentos que já possuímos, elas nos podem fazer compreender a maneira pela qual o fenômeno se realiza.

956. Notemos que o Espírito reconhece que ele age pela vontade, o que tínhamos estabelecido nos outros gêneros de manifestação. A vontade é o único agente de que dispõe para manipular os fluidos; é uma força que o Espírito dirige como quer.

957. Ele não percebe como os fenômenos se operam; verifica-os, mas não os pode analisar, assim como há alguns séculos acontecia com a nutrição, a respiração, que os homens ignoravam como se produziam. Ainda hoje, a geração é uma operação misteriosa, apesar das numerosas pesquisas feitas sobre o assunto.

958. Tentemos, entretanto, investigar a maneira de se dar um transporte. Vimos que os corpos podem ocupar estados diferentes, desde o sólido à matéria radiante; podemos, pois, compreender que o Espírito, por sua vontade e com os fluidos do médium, produzirá uma operação semelhante à da água, quando passa a vapor por meio do aquecimento. O fluido vital faz, na desmaterialização, o papel de calórico; como compreender, porém, que o corpo desmaterializado conserve a sua forma e as relações das moléculas entre si?

959. Se tivéssemos apenas que lidar com os corpos brutos, poder-se-ia supor que o Espírito forma, por sua vontade, uma espécie de invólucro fluídico e que ele encerra o corpo desmaterializado nesse tecido fluídico, mas não se conceberia como, voltando esse corpo ao estado de matéria, podem as moléculas recolocar-se em sua ordem normal.

960. Vejamos uma hipótese que nos parece a mais racional. Demonstramos que o homem tem um invólucro semimaterial e que os animais possuem um semelhante; há duplos fluídicos em todas as criaturas que têm vida, porque todas se desenvolvem segundo um tipo determinado, e é necessário que uma força fluídica o conserve em meio às contínuas mutações da matéria. Assier estabeleceu esse fato para os animais e para as plantas, tanto pela lei de analogia, como pelas experiências diretas que se encontram relatadas no capítulo III do seu livro sobre a humanidade póstuma. Ele leva seu sistema mais longe ainda, e crê que o duplo fluídico se aplica, mesmo aos corpos brutos.

961. Se considerarmos que os metais cristalizam em tipos determinados, reconhecer-se-á que eles são também dirigidos por uma força fluídica e que podem possuir um duplo fluídico. Admitido esse fato, tudo se torna perfeitamente claro. O Espírito que quer fazer um transporte tem apenas que volatilizar, de alguma sorte, a matéria do objeto sobre o qual opera, depois transporta esse duplo para o lugar que escolheu e lá ele toma ao fluido universal os elementos necessários à reconstrução do objeto material por meio do fluido vital.

962. Com as plantas a operação é a mesma. O duplo fluídico reproduz, molécula por molécula, todas as partes da planta, pois que, sendo-lhe o esboço, basta incorporar as moléculas do fluido universal, tornadas materiais pelo Espírito, e a planta aparece com todos os seus pormenores, sua frescura, seu colorido, aos olhos dos assistentes. Enfim, é sempre a mesma operação que se executa, quando um Espírito se quer tornar visível e tangível, como nas experiências de Crookes.

963. Não sabemos até que ponto nossa hipótese se aproxima da realidade, mas os fenômenos se produzem, é preciso explicá-los e a nossa teoria, até agora, é a que nos parece mais de acordo com o ensino espírita e os descobrimentos modernos. (1)

 

(1) Os fenômenos de transporte foram estudados por Ernesto Bozzano, que publicou a respeito o livro Fenômenos de Transporte, estudado sequencialmente nas edições 175 a 183 da revista O Consolador. Eis o link que remete à primeira parte do estudo da citada obra: http://www.oconsolador.com.br/ano4/175/classicosdoespiritismo.html

 

Respostas às questões preliminares

 

A. É verdade que nos fenômenos de transporte o médium fica fatigado?

Sim. O relato feito por Vincent revela esse fato. Segundo ele, após a realização do transporte, o médium ficou muito fatigado durante a noite e no dia seguinte. Era como uma espécie de esgotamento; não havia dor, mas lassidão geral. (O Espiritismo perante a ciência, Quinta Parte, Cap. III – Médiuns videntes e médiuns auditivos.)

B. Como o Espírito explicou a passagem do objeto transportado pela parede do recinto?

O Espírito disse que foi buscar os objetos com os fluidos tomados do médium. Ele os desmaterializou nos lugares em que se achavam, porque estavam em duas casas diferentes; depois, quando se tornaram fluídicos, transportou-os, fazendo-os atravessar a parede, como ele próprio a atravessava. (Obra citada, Quinta Parte, Cap. III – Médiuns videntes e médiuns auditivos.)

C. Durante o transporte qual é o estado do médium?

Segundo Delanne, o estado do médium, durante o fenômeno, é vizinho ao da catalepsia, produzido certamente pela perda de fluido vital. (Obra citada, Quinta Parte, Cap. III – Médiuns videntes e médiuns auditivos.)

                                                                                         

 

Observação:

Para acessar a parte 42 deste estudo, publicada na semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2021/01/o-espiritismo-perante-ciencia-gabriel.html

 

 

 

 

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