No Invisível
Léon Denis
Parte 11
Damos prosseguimento ao estudo metódico e sequencial do clássico No Invisível, de Léon Denis, cujo título no original francês é Dans l'Invisible.
Nossa expectativa é que este estudo sirva para o leitor
como uma forma de iniciação aos chamados Clássicos do Espiritismo.
Cada parte do estudo compõe-se de:
a) questões preliminares;
b) texto para leitura.
As respostas às questões propostas encontram-se no final do
texto indicado para leitura.
Este estudo é publicado sempre às sextas-feiras.
Questões preliminares
A. O estudo dos fenômenos
espíritas é realmente importante?
B. É necessário submeter as
produções mediúnicas a rigoroso exame?
C. Qual é, segundo Léon Denis, um
importante elemento de êxito nas sessões mediúnicas?
Texto para
leitura
298. IX - Condições de experimentação - O estudo dos
fenômenos é de importância capital, pois que nele é que se baseia inteiramente
o Espiritismo. Muitas vezes, porém, a ausência de método, a falta de
continuidade e direção nas experiências tornam estéreis a boa-vontade dos
médiuns e as legítimas aspirações dos investigadores. Em consequência mesmo do
estado de espírito em que fazem as pesquisas, acumulam dificuldades e, se ao
fim de algumas sessões não obtêm mais que fatos insignificantes, banalidades ou
mistificações, desanimam e abandonam a investigação.
299. Se, ao contrário, se produzem resultados
satisfatórios, determinam eles muitas vezes, com irrefletido entusiasmo, uma
tendência prejudicial para a credulidade, uma disposição para atribuir aos Espíritos
desencarnados todos os fenômenos obtidos. Em casos tais não se fazem esperar as
decepções necessárias, porque fazem nascer a dúvida e, com ela, restabelecem o
equilíbrio mental, o senso crítico, indispensável em todo estudo experimental
e, mais que qualquer outro, nesse domínio das investigações psíquicas, em que a
sugestão, o inconsciente e a fraude se podem a cada passo misturar com as
manifestações do mundo invisível.
300. Noutros lugares fazem-se críticas levianas, são
acusados os grupos de má direção, os médiuns de incapacidade e os assistentes
de ignorância ou misticismo. Queixam-se de não obter senão comunicações
destituídas de interesse científico e consistindo de repisadas exortações
morais.
301. Essas críticas nem sempre são infundadas; mas é
preciso não esquecer, como geralmente se faz, que nenhum bem se adquire sem
trabalho e que se não deve procurar colher os frutos antes da maturação. Em
tudo se requer moderação e paciência. As faculdades mediúnicas, como todas as
coisas, estão submetidas à lei de progressão e desenvolvimento. Em lugar de
estéreis críticas, mais vale, pelo concurso de mentes de boa-vontade reunidas,
facilitar a tarefa do médium, formando em torno dele uma atmosfera de simpatia
que lhe seja ao mesmo tempo sustentáculo, estímulo e proteção.
302. É indispensável submeter as produções mediúnicas a
rigoroso exame e conduzir as investigações com espírito analítico sempre
vigilante. A falta de benevolência, a crítica exagerada, a malsinação
sistemática podem, entretanto, desanimar o médium, compeli-lo a abandonar tudo,
ou pelo menos afastá-lo das reuniões numerosas, para se incorporar aos grupos
familiares, aos círculos restritos, onde encontrará sem dúvida mais favorável
ambiente, mas em que os seus trabalhos só aproveitarão a reduzido número de
escolhidos.
303. Há, portanto, antes de tudo um duplo inconveniente a
remover. Se demasiado cepticismo é prejudicial, a credulidade excessiva
constitui perigo não menor. É preciso evitar um e outra com igual cuidado e
conservar-se num prudente meio-termo.
304. Entre os homens de ciência é que se encontram os mais
inveterados preconceitos e prevenções a respeito dos fatos espíritas. Querem
eles impor a essas investigações as regras da ciência ortodoxa e positiva, que
consideram os únicos fundamentos da certeza; e se não são adotadas e seguidas
essas regras, rejeitam todos os resultados obtidos.
305. Entretanto, a experiência nos demonstra que cada
ciência tem suas regras próprias. Não se pode estudar com proveito uma nova
ordem de fenômenos, socorrendo-se de leis e condições que regem fatos de uma
ordem inteiramente diversa. Só mediante pesquisas pessoais, ou graças à
experiência nesse domínio adquirida pelos investigadores conscienciosos, e não
em virtude de teorias a priori, é que se podem determinar as leis que governam
os fenômenos ocultos.
306. São das mais sutis e complicadas essas leis. Seu
estudo exige espírito refletido e imparcial. Mas como exigir imparcialidade
àqueles cujos interesses, nomeada e amor-próprio estão intimamente ligados a
teorias ou a crenças que o Espiritismo pode aniquilar? “Para achar a verdade –
disse notável pensador – é preciso procurá-la com o coração simples.”
307. É, sem dúvida, por isso que certos sábios, imbuídos de
teorias preconcebidas, escravizados pelo hábito aos rigores de um método
rotineiro, colhem menos resultados nessas investigações do que homens
simplesmente inteligentes, mas dotados de senso prático e de espírito
independente. Esses se limitam a observar os fatos em si mesmos e lhes deduzir as
consequências lógicas, ao passo que o homem de ciência se aferrará
principalmente ao método, ainda quando improdutivo.
308. O que nesse domínio importa, antes de tudo, são os
resultados, e o único método que os favorecer, mesmo que pareça defeituoso a
alguns, deve ser por nós considerado bom. Não é necessário ser matemático,
astrônomo, médico de talento, para empreender, com probabilidade de êxito,
investigações em matéria de Espiritismo: basta conhecer as condições a
preencher e submeter-se a elas. Nenhuma outra ciência nos pode indicar essas
condições. Só a experimentação assídua e as revelações dos Espíritos no-las permitem
estabelecer com precisão.
309. Os sábios tomam muito pouco em consideração as
afinidades psíquicas e a orientação dos pensamentos, que, entretanto,
constituem um importante fator do problema espírita. Encaram o médium como um
aparelho de laboratório, como máquina que deve produzir efeitos à vontade, e
procedem a seu respeito com excessiva desatenção. As inteligências invisíveis
que o dirigem são por eles equiparadas a forças mecânicas. Nelas recusam-se, em
geral, a ver seres livres e conscientes, cuja vontade entra numa considerável
proporção, nas manifestações – seres que têm suas ideias, seus desígnios, seu
objetivo, desconhecidos para nós, e que nem sempre julgam conveniente intervir:
uns, porque o desembaraço e os intuitos excessivamente materiais dos
experimentadores os afastam; outros, porque, demasiado inferiores, não se
preocupam com a necessidade de demonstrar aos homens as realidades da
sobrevivência.
310. Força é, todavia, reconhecer que as exigências e os
processos dos sábios podem, num certo limite, ser justificados, em vista de
fraudes com que têm sido muitas vezes desfigurados ou simulados os fenômenos.
Não somente hábeis prestidigitadores têm praticado esse gênero de exercícios,
mas verdadeiros médiuns têm sido, não raro, surpreendidos em flagrante delito
de simulação. Daí a bem legítima prevenção de certos investigadores e a
obrigação, que se lhes impõe, de eliminar, nas experiências, tudo o que
apresenta caráter suspeito, todo elemento de dúvida, todo motivo de ilusão.
311. É indubitável que, no fenômeno de transporte, por
exemplo, será preciso uma grande acumulação de provas, irrecusável evidência,
para acreditar-se na desmaterialização e sucessiva reconstituição de objetos,
passando através das paredes, de preferência a admitir que tenham sido trazidos
por algum dos assistentes. A desconfiança, entretanto, não deve ser levada ao
extremo de impor ao fenômeno condições que o tornem impossível.
312. A ignorância das causas em ação e das condições em que
elas se manifestam explica os frequentes insucessos daqueles mesmos que,
supondo dar lições aos outros, só conseguem demonstrar insuficiência das regras
de sua própria ciência, quando as querem aplicar a esta ordem de pesquisas.
Além disso, o espírito de suspeita e malevolência em que envolvem o médium
atrai as entidades inferiores, que se comprazem em perturbar e impelem o
sensitivo à prática de atos fraudulentos.
313. Quando esses elementos fazem irrupção num grupo, o
melhor alvitre a adotar é suspender a sessão. É sobretudo nesse caso que a
presença e os conselhos de um Espírito-guia são de grande utilidade; e os que,
deles privados, se entregam a experiências, ficam expostos a graves decepções.
314. O médium é um instrumento delicado, repositório de
forças que se não renovam indefinidamente e que é preciso utilizar com
moderação. Os Espíritos esclarecidos, os experimentadores sensatos, aos quais
merece cuidado a saúde dos sensitivos, sabem deter-se aos primeiros sintomas de
esgotamento; os Espíritos levianos e embusteiros, que afluem às reuniões mal
dirigidas, em que não reina a harmonia nem a elevação de pensamentos, têm menos
escrúpulos. Senhores dos intuitos dos investigadores inexpertos, não trepidarão
em exceder o limite das forças do médium, para produzirem fenômenos sem
interesse, e mesmo para mistificarem os assistentes.
315. Quase sempre, forças, causas, influências diversas
intervêm nas experiências; daí uma certa confusão, uma mescla de verdadeiro e
falso, de coisas evidentes e duvidosas que nem sempre é fácil distinguir. Os próprios
sábios reconhecem que, na maior parte dos casos, pode a sugestão intervir numa
considerável proporção; do que resulta que, para obter fenômenos espíritas
verdadeiramente autênticos e espontâneos, deve-se evitar com cuidado tudo o que
pode influenciar o médium e perturbar a ação dos Espíritos.
316. Ora, é do que parece menos se preocuparem certos
homens de ciência. Julgam lícito
embaraçar o sensitivo com perguntas inoportunas, pueris, insidiosas. Perturbam
as sessões, entretendo-se em conversas particulares e colóquios. Quando são
indispensáveis a calma, o silêncio, a atenção, uns mudam de lugar, entram e
saem, interrompem as manifestações em curso, apesar das injunções dos
Espíritos; outros, como certo doutor de nosso conhecimento, fumam e tomam cerveja
durante as experiências. Em tais condições tão pouco sérias, tão pouco
honestas, como é possível, legitimamente formular conclusões?
317. Algumas vezes a experiência segue uma direção normal,
satisfatória; o fenômeno se desenvolve com feição prometedora. E subitamente
age uma nova causa; uma vontade intervém; uma corrente de ideias contrárias
entra em jogo; a ação mediúnica se perturba e transvia; já não produz senão
efeitos em desacordo com as esperanças do começo. Fatos reais parece ladearem
coisas ilusórias; às sessões imponentes sucedem manifestações vulgares.
318. Como destrinçar essa complicação que nos deixa
perplexo? Como evitar a sua reprodução? E aí que a necessidade da disciplina
nas sessões se faz vivamente sentir e, mais ainda, a assistência de um Espírito
elevado, cuja vontade enérgica exerça império sobre todas as correntes
adversas.
319. Quando a harmonia das condições se estabelece e a
força do Alto é suficiente, já se não produzem essas contradições, essas
incoerências que provêm, quer das forças inconscientes, quer de Espíritos
atrasados, quer mesmo do estado mental dos assistentes. O fenômeno se
desenvolve, então, em sua majestosa grandeza e o fato probatório se apresenta.
320. Mas para isso, para obter essa assistência do Alto, fazem-se
precisas a união, a elevação dos pensamentos e dos corações; são necessários o
recolhimento e a prece. As entidades superiores não se põem de boamente ao
serviço dos experimentadores que não são animados do sincero desejo de
instruir-se, de um amor profundo ao bem e à verdade.
321. Aqueles que fazem do Espiritismo um passatempo, uma
frívola diversão, não têm que contar senão com incoerências e mistificações.
Pode haver mesmo nisso, às vezes, um perigo. Certas pessoas se comprazem em
conversas mediúnicas com os Espíritos inferiores, com almas viciosas e
degradadas, e isso sem intenção benéfica, sem intuito de regeneração, movidas
por sentimento de curiosidade, pelo desejo de divertir-se. Ao passo que não
teriam suportado a convivência desses seres, na vida terrestre, não receiam
atraí-los, depois de desencarnados, e com eles entreter palestras de mau gosto,
sem reparar que desse modo se abandonam a perigosas influências magnéticas.
322. Se entrardes em relação com almas perversas, fazei-o
com o fim de sua redenção, de sua reabilitação moral, sob o amparo de um guia
respeitável; doutro modo vos exporeis à nociva promiscuidade, a obsessões
temíveis. Não abordeis essas regiões do Além senão com o propósito firme e
elevado, que vos seja como a arma assestada contra o mal. A mediunidade, esse
poder maravilhoso, foi concedida ao homem para um nobre uso. Aviltando-a,
aviltareis a vós mesmos, e de um puríssimo eflúvio celeste fareis um sopro
envenenado.
323. O antigo iniciado, como os orientais em nossos dias,
só se entregava às evocações depois de se haver purificado pela abstinência,
pela prece e pela meditação. A comunicação com o invisível era um ato
religioso, que ele executava com sentimento de respeito e de veneração pelos
mortos.
324. Nada há mais diametralmente oposto que o modo de
proceder de certos experimentadores atuais. Apresentam-se nos lugares de
reunião depois de copioso jantar, impregnados do cheiro do fumo, com o desejo
intenso de obter manifestações ruidosas ou indicações favoráveis aos seus
interesses materiais. E admiram-se, em tais condições, de só se apresentarem
Espíritos fraudulentos e mentirosos que os enganam e se divertem em lhes causar
inúmeras decepções!
325. Mau grado à repugnância dos modernos sábios pelos
meios com cuja aplicação se realiza a elevada comunhão das almas, será forçoso
a eles recorrer, a não ser que se queira fazer do Espiritismo uma nova fonte de
abusos e de males.
326. O estado de espírito dos assistentes, sua ação
fluídica e mental, é por conseguinte, nas sessões, um importante elemento de
êxito ou de insucesso. Quanto mais sensível é o médium, tanto mais receptivo é
à influência magnética dos experimentadores. Em uma assembleia composta, na
maioria, de incrédulos, cujos pensamentos hostis convergem para o sensitivo, o
fenômeno dificilmente se produz. A primeira das condições é abster-se de toda
ideia preconcebida, a fim de deixar ao Espírito a necessária liberdade de ação.
Tenho, por minha parte, em certos casos, podido verificar que uma vontade
enérgica e persistente pode paralisar o sensitivo, se é fraco, e constituir
obstáculo às manifestações.
327. Os pensamentos divergentes se chocam e formam uma
espécie de caos fluídico, que a vontade dos invisíveis nem sempre consegue
dominar. É o que torna tão problemáticos os resultados nas assembleias
numerosas, de composição heterogênea, nas sessões teatrais, por exemplo, como o
tem demonstrado a experiência.
328. As pessoas ávidas de propaganda pública, que, sem
cogitar das necessárias precauções, se aventuram nesse terreno, expõem-se a bem
graves reveses. Aí correm os médiuns grande risco: não somente se acham à mercê
dos Espíritos atrasados que se comprazem na permanência entre as turbas, mas
ainda ficam à disposição de todo mal-intencionado que, aparentando de sábio,
deles exigirá experiências contrárias às verdadeiras leis do Espiritismo. E
quando tiver usado e abusado de suas forças sem resultado prático, persuadirá
os espectadores de que, nessa ordem de ideias, não há mais que fraude ou erro. (Continua
no próximo número.)
Respostas às
questões preliminares
A. O estudo dos fenômenos espíritas é realmente importante?
Sim. O
estudo dos fenômenos é de importância capital, pois que nele é que se baseia
inteiramente o Espiritismo. Muitas vezes, a ausência de método e a falta de
continuidade e direção nas experiências tornam estéreis a boa-vontade dos
médiuns e as legítimas aspirações dos investigadores. Em consequência mesmo do
estado de espírito em que fazem as pesquisas, acumulam dificuldades e, se ao
fim de algumas sessões não obtêm mais que fatos insignificantes, banalidades ou
mistificações, desanimam e abandonam a investigação. É aí então que mais se
compreende a importância do estudo. (No Invisível - O Espiritismo
experimental: IX - Condições de experimentação.)
B. É necessário submeter as produções mediúnicas a rigoroso exame?
Evidentemente.
Não apenas é necessário, mas indispensável submeter as produções mediúnicas a
rigoroso exame e conduzir as investigações com espírito analítico sempre
vigilante. (Obra citada - O Espiritismo experimental: IX - Condições de
experimentação.)
C. Qual é, segundo Léon Denis, um importante elemento de êxito nas
sessões mediúnicas?
O
estado de espírito dos assistentes e sua ação fluídica e mental constituem
importante elemento de êxito ou de insucesso nas sessões mediúnicas. Quanto
mais sensível é o médium, tanto mais receptivo é à influência magnética dos
experimentadores. Em uma assembleia composta, na maioria, de incrédulos, cujos
pensamentos hostis convergem para o sensitivo, o fenômeno dificilmente se
produz. Os pensamentos divergentes se chocam e formam uma espécie de caos fluídico,
que a vontade dos invisíveis nem sempre consegue dominar. É o que torna tão
problemáticos os resultados nas assembleias numerosas, de composição
heterogênea, nas sessões teatrais, por exemplo, como o tem demonstrado a
experiência. (Obra citada - O Espiritismo experimental: IX - Condições de
experimentação.)
Observação:
Para acessar a Parte 10 deste estudo, publicada na
semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2023/02/blog-post_17.html
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